terça-feira, 26 de setembro de 2023

As bananas da Madeira são indigestas para o PS

  

Vários acontecimentos ocorreram nos últimos dias e que revelam, per si, que habitamos um lugar que pouco melhor será que uma república das bananas (com minúsculas) atendendo à forma de governo, de quem o exerce e ao serviço de quem é exercido. Elencando de frente para trás: eleições na Madeira e resultados; situação da economia e propostas da associação dos grandes patrões (CIP) para aumentar as taxas de lucro; as bocas de Marcelo, que comenta tudo e mais um par de botas, sobre a mamas da jovem que se podiam constipar; a censura à arte que escandaliza as púdicas consciências da burguesia portuense ainda ressabiada com a figura de Camilo, e já lá vão mais de 150 anos; e o livro da múmia Cavaco. Ficaremos por aqui, por enquanto.

Os resultados das eleições para a Assembleia Regional da Madeira e toda a campanha eleitoral mostram que a manipulação da opinião pública, através da compra do voto, e o caciquismo ainda vão funcionando na região que possui a maior taxa de pobreza de todo o território nacional. Funcionários públicos, comerciantes dependentes do turismo e dos apoios directos do governo regional, gente pobre vivendo do rendimento mínimo de inserção e, no cimo da pirâmide, uma burguesia rentista enriquecendo à custa do estado explicam a vitória do partido que se mantém à frente do poder regional. Uma imagem mais exagerada do que se passa no Continente.

No entanto, os indícios de degradação desse poder, e do regime em geral, são mais que notórios: PSD ganha mas não obtém maioria absoluta, para a assegurar faz união de facto, ainda não será casamento a valer, com um dos partidos considerados rameira do regime porque “nem é de direita nem de esquerda”, nas próprias palavras; e o PS, no governo de Lisboa, é o partido que mais perde deputados e votos. Mais uma vez o partido que ganha as eleições é o da abstenção com 46,66%, ultrapassando o número de há 4 anos que foi de 44,49%.Fica-se com a ideia de que as elites já não confiam nos dois principais partidos do regime e que serão descartados na ocasião mais oportuna. Esta situação irá, necessariamente e a breve trecho, repercutir-se a nível do país.

As patacoadas de Marcelo dizem bem da pessoa, mas ainda mais da figura do dito “supremo magistrado da nação”, estando bem um para o outro, um populismo provinciano, mas perigoso, descendo ao nível do trolha, sem ofensa para o trabalhador e utilizando a imagem do humorista, que olha do cimo do andaime para o borracho que vai a passar na rua. O homenzinho não se enxerga, acha que tudo lhe é permitido e não tem noção da importância do cargo que ocupa. Para se ser respeitado tem que se dar ao respeito, o que não é o caso, a popularidade não desculpa tudo. A figura alia a sua falta de nível e de carácter ao reacionarismo intrínseco de andar a apoiar nazistas, cuja verdadeira natureza ficou mais uma vez patente na homenagem feita ao ex-soldado da brigada alemã Waffen-SS, que ficou tristemente célebre pela matança de mais de 100 mil polacos, judeus, comunistas e ucranianos no final da Segunda Guerra Mundial.

Os actos de censura, como o que se verificou com a polémica de sai ou não sai a estátua de Camilo Castelo Branco do espaço público, revela, por si só, que a elite, neste particular, a do Porto, mas que não será muito diferente da elite nacional, é uma classe preconceituosa, ignorante e ressabiada com uma figura, umas das maiores, das letras e cultura nacionais, embora tenha passado mais de 150 anos. Geralmente a instalação do fascismo, que, no nosso caso, será a “musculação” do regime democrático saído do 25 de Abril, começa pelo campo da cultura, do saber e do acesso ao conhecimento e informação, na preparação de alguma e certa opinião pública para as mudanças ou “reformas estruturais”, como alguns políticos e comentadores gostam de referir, que se seguirão já no campo da política. A criminalização do comentário e o pedido de condenação por parte do Ministério Público de Mamadou Ba insere-se nessa tendência.

As movimentações da política são sempre o reflexo, muitas vezes à posterior mas nem sempre, do que acontece na área da economia. E, ao contrário das fanfarronadas de Costa, a economia, se não vai muito mal à superfície, ou seja, no tempo mais imediato, irá de certeza soçobrar a médio e longo prazo. As elevadas taxas de juro, que a chefe Lagarde do BCE, a entidade que verdadeiramente comanda os destinos da União Europeia, e da qual o Banco de Portugal é a sucursal com mais poder, na prática, do que o governo do PS/Costa, já avisou que são para manter até final de 2025, se não por mais tempo. E mais, exige “adoção atempada” de novas regras orçamentais já a partir deste ano, o que significa menos salários, mais precariedade, menos dinheiro para a Saúde e Educação, privatização a prazo da Segurança Social, recapitalização das grandes empresas privadas... e por aí fora.

Os lucros dos principais bancos europeu são para subir custe o que custar à maioria dos povos europeus, incluindo as classes médias. A alta do preço da habitação, as rendas incomportáveis das casas em Portugal, assim como a subida galopante dos preços dos alimentos, com a falsa desculpa da pandemia e da guerra, enquadra-se nessa política de salvação do capitalismo. Não é o mundo que vai acabar devido às “alterações climáticas”, é o mundo do capitalismo que se encontra à beira da implosão, daí as guerras. O discurso da “emergência climática” e da “transição energética” tem como objectivo criar a intimidação e o pânico, no esquema mental de que não há alternativa, para a reconversão do capitalismo mas à custa de mais impostos e sacrifícios dos trabalhadores, com o fito final de aumentar a riqueza dos 0,1% da humanidade, isto é, dos mais muito  ricos.

A pequena-burguesia, diga-se em abono da verdade, é muito sensível a este discurso, devido à sua posição intermédia na sociedade: deseja subir socialmente, mas a realidade da proletarização é mais forte e assusta-a quanto ao seu destino. De certo modo, também ela decide sobre o resultados das eleições no quadro do regime de democracia burguesa, daí que Costa já esteja a lançar pequenas medidas eleitoralistas, por exemplo, redução de algum IRS, subida do salário mínimo nacional e das pensões em 6% e complemento solidário para os idosos, que terão desconto imediato em medicamentos, porque parece que foram estes que levaram à, não esperada, maioria absoluta do PS, ou apoio às famílias proprietárias endividadas aos bancos. A mesma atitude terá o governo quanto ao que será aprovado em sede da dita “concertação social”, com os patrões (os grandes, saliente-se) a puxarem demasiado a corda a seu favor e que quase de certeza não verão satisfeitas todas as reivindicações que gostariam.

As propostas da CIP de “dar mais dinheiro” aos trabalhadores, incluindo o 15º mês sem descontos de impostos e de TSU, com a redução desta por algum tempo, mas que será depois ad eternum, e a descida do IRC, são, na essência, o roubo e o esbulho violento do trabalhador e do erário público, a destruição da Segurança Social, embrulhados na demagogia boçal e barata; características típicas e estruturais da nossa burguesia inútil, por viver essencialmente do rentismo e do assalto ao estado – o slogan “menos estado” refere-se para os outros, nunca para ela. O programa “Mais Habitação”, ao contrário do propaganda, irá ser um fracasso pela razão linear de que a política, tal como Bruxelas exige, é para não beliscar os interesses dos grupos económicos privados. Em relação aos de cá como aos exteriores, note-se!, por exemplo, a TAP irá ser privatizada a 100% e entregue à alemã Lufthansa.

Como já aqui temos referido, o sonho molhado dos nossos "empresários de sucesso", nomeadamente dos oligarcas emergentes pós-25 de Abril, é não pagar impostos, ter os putativos “colaboradores” à borla e ainda beneficiarem de toda a sorte de subsídios e apoios do estado. Esta mania, na verdadeira acepção do termo porque não há controlo do impulso, é antiga, é histórica, lembremo-nos das tenças dadas pelo rei aos seus cortesãos, do roubo e perseguição dos cristãos novos, da distribuição dos bens da igreja pela nova burguesia no tempo da monarquia liberal, e que continua no tempo actual com os fundos europeus, os ifadaps são o excelente exemplo quando a pequena e média agriculturas eram destruídas para darem lugar à agricultura industrial e intensiva, com base em mão-de-obra imigrante e miseravelmente remunerada, os lay-offs e o actual PRR.

A dita “reforma estrutural” exigida pelo patronato, e em seguimento da linha defendida por Bruxelas, é extorquir a maior fatia possível da mais-valia produzida pela classe operária e trabalhadores em geral, e é a única saída do capital para enfrentar a crise do seu sistema económico. As medidas aprovadas recentemente pelo governo grego de direita  são bem explícitas e irão ser seguidas pelos restantes governos dos países da União Europeu, caso os trabalhadores o permitam, diga-se de passagem: seis dias de trabalho por semana; a possibilidade dos trabalhadores a tempo inteiro arranjarem um segundo trabalho em part-time, trabalhando assim até 13 horas por dia; é neste sentido que devemos entender a semana de quatros dias que é apresentada entres nós como a maravilha da felicidade dos trabalhadores. E, falando em produtividade, ficamos a saber, o que não era nenhuma novidade, diga-se também em abono da verdade, que os trabalhadores portugueses são os que mais horas (37,5 horas) trabalham na União Europeia, mas são os que menos ganham, o que significa que a produtividade até é grande atendendo a este factor. Claro que os empreendedores nacionais acham sempre pouco.

Com a múmia a sair da catalepsia e a escrever um livro sobre a “arte de bem governar” (o da “arte de bem roubar” já foi escrito no século XVII), a fim de juntar as hostes mais trogloditas da política nacional, a verdade é que tudo indica que os partidos principais do regime estão a dar as últimas e qualquer dia, processo que será apressado se houver um agravamento rápido da crise capitalista, serão descartados e substituídos por outros que, embora defendam os mesmos interesses e políticas, se apresentam com novas caras e discursos mais elaborados e demagógicos, falsamente anti-sistema e salvadores da nação, ou seja, do capital.

A eleição de um oligarca para a chefia do Syriza (o BE grego), ligado ao banco norte-americano Goldman Sachs, mostra à evidência que o grande capital financeiro não hesita em usar estes partidos de falsa extrema-esquerda para levar à prática os seus planos de saque e esbulho dos trabalhadores e dos povos; assim sendo para que servirão partidos como o PS? O PS, se não tiver cuidado e seguir à risca o plano da CIP ou de Bruxelas, não só perderá as próximas eleições legislativas como corre o sério risco de desaparecera breve prazo. O que também nos ensina que é mais do que tempo para se erguer entre o mundo do trabalho um partido revolucionário, que ouse conquistar os céus e não busque apenas as migalhas deixadas cair pelo capital. Outro mundo é possível, porque necessário.

 

quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Giorgio Agamben: A Decadência da Civilização Ocidental


O LEGADO DO NOSSO TEMPO


A meditação sobre a história e a tradição que Hannah Arendt publicou em 1954 tem o título certamente não acidental, entre o passado e o futuro. Para a filósofa judia-alemã refugiada em Nova Iorque durante quinze anos, tratava-se de questionar o vazio entre o passado e o futuro que havia surgido na cultura ocidental, ou seja, a ruptura agora irrevogável na continuidade de cada tradição. É por isso que o prefácio do livro abre com o aforismo de René Char, Notre héritage n'est précédé d'aucun testament. Em causa estava, isto é, o problema histórico crucial da recepção de um legado que já não é possível transmitir de forma alguma.

Cerca de vinte anos antes, Ernst Bloch, exilado em Zurique, havia publicado sob o título O Legado do Nosso Tempo uma reflexão sobre o legado que tentou recuperar vasculhando os porões e depósitos da já decadente cultura burguesa (“a época está apodrecendo e ao mesmo tempo em trabalho” é o sinal que abre o prefácio do livro). É possível que o problema de um legado inacessível ou praticável apenas por caminhos toscos e aberturas meio escondidas que os dois autores, cada um a seu modo, suscitam, não seja de todo obsoleto e nos preocupe, aliás, de perto - tão intimamente que às vezes parecemos esquecer disso. Também nós vivemos um vazio e uma ruptura entre passado e futuro, também nós, numa cultura em agonia, devemos procurar, se não uma dor de parto, pelo menos algo como uma parcela de bem que sobreviveu ao colapso.

Uma investigação preliminar sobre este conceito primorosamente jurídico – a herança – que, como acontece frequentemente na nossa cultura, se expande para além dos seus limites disciplinares até ao ponto de envolver o próprio destino do Ocidente, não será, portanto, inútil. Como mostram claramente os estudos de um grande historiador jurídico – Yan Thomas –, a função da herança é garantir a continuatio dominii, ou seja, a continuidade da propriedade dos bens que passam dos mortos para os vivos. Todos os dispositivos que a lei concebe para suprir o vazio que corre o risco de surgir com a morte do proprietário não têm outra finalidade senão garantir a sucessão ininterrupta da propriedade.

Hereditariedade talvez não seja o termo adequado para pensar no problema que tanto Arendt como Bloch tinham em mente. Dado que na tradição espiritual de um povo algo como a propriedade simplesmente não faz sentido, neste contexto uma herança como continuatio dominii não existe nem pode nos interessar de forma alguma. Acessar o passado, conversar com os mortos só é possível rompendo a continuidade da propriedade e é no intervalo entre o passado e o futuro que cada indivíduo deve necessariamente se situar. Não somos herdeiros de nada e não temos herdeiros em parte alguma e só neste acordo poderemos retomar a conversa com o passado e com os mortos. O bem é, de facto, por definição adespótico e inapropriável e a tentativa obstinada de apropriar-se da tradição define o poder que rejeitamos em todas as esferas, na política como na poesia, na filosofia como na religião, nas escolas como nos templos e no direito. tribunais.

https://www.quodlibet.it/giorgio-agamben-l-u2019eredit-4-el-nostro-tempo

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 AS ALMAS MORTAS


Nabokov, em seu livro sobre Gogol, tentou definir o que é poshlost, a miséria barata e flagrante em que vivem as personagens daquele imenso escritor de cujo casaco, disse Dostoiévski, “todos nós emergimos”. Do ‘pohslost', emblema, policial e, ao mesmo tempo, encarnação é Chichikov, o inefável comprador das almas mortas, isto é, daqueles servos falecidos, pelos quais o senhor continuou a pagar o testamento, proporcionando-lhes assim uma espécie de falsa sobrevivência. Não creio que esteja a propor nada de extravagante ao sugerir que Čičikov é para nós o símbolo daqueles que hoje governam – ou acreditam que governam – a vida dos homens. Tal como Chichikov, eles manipulam e traficam, de facto, almas agora mortas, cuja única aparência de vida é que eles próprios pagam o testamento e compram os bens de consumo que lhes são ordenados a comprar. Se estas almas estão verdadeiramente mortas ou se só assim aparecem aos que as governam, não faz muita diferença, pois é essencial que se comportem - e fazem-no tão bem - como se estivessem mortas. "Sim, é claro que eles estão mortos" diz Chichikov sobre suas almas "mas por outro lado o que ganhamos com os vivos hoje? Que tipo de homens são eles?", e ao interlocutor que objeta que pelo menos estes estão vivos, enquanto as suas almas são apenas uma ficção, responde indignado: "Uma ficção? Mas realmente! Se você os tivesse visto... eu realmente gostaria de saber onde você encontraria tal ficção."

É bom refletir sobre o que é tal estado- pošlost', em que tudo é organizado em todos os detalhes na presunção de tratar apenas de almas mortas, que devem ser pontualmente registradas, contadas, carimbadas e orientadas na direção desejada. Se alguma alma escapar da contagem e estiver invencivelmente viva, quando não for necessário eliminá-la, serão tomadas medidas para isolá-la ou empurrá-la de volta para as margens. Na verdade, um tal estado – pošlost' só precisa de almas mortas e ai daqueles que persistem em estar vivos, em não obedecer aos decretos da televisão e às prescrições do telemóvel que foi providencialmente inserido no seu caixão.

No entanto, mesmo Čičikov é incapaz de escapar impune até ao fim, aqueles que apenas compraram almas mortas acabam por ficar de mãos vazias e só conseguem escapar ao castigo escapando. Um dia, embora não saibamos quando, as almas que se deixaram tratar como se estivessem mortas acordarão abruptamente e não é certo que desta vez Chichikov consiga salvar a sua pele.

https://www.quodlibet.it/giorgio-agamben-le-anime-morte 

sábado, 16 de setembro de 2023

A distribuição dos sacrifícios à portuguesa

 

Crónica escrita em 2012 sobre o senhor Silva e o seu governo PSD/PP

Não era novidade nenhuma que, em Portugal, são os cidadãos mais pobres que arcam com os sacrifícios advindos das políticas de austeridade impostas por este e pelo anterior governo: “os pobres que paguem a crise!” é a consigna da classe dominante nacional. Não é preciso nenhum estudo da Comissão Europeia para sabermos que as nossas elites, em todos os momentos da história, fugiram a pagar o preço da factura da salvação do país e que a hipocrisia de presidentes da república nunca convenceu.

O senhor Silva pelas repetidas “preocupações” com a “equidade” da distribuição dos sacrifícios (um dos principais financiadores da sua campanha eleitoral acaba de deslocar a sede social das suas empresas para a Holanda para não pagar impostos ao estado português) e pelos “esquecimentos” de enviar para o Tribunal Constitucional as propostas das medidas mais celeradas apresentadas pelo governo, como aconteceu agora com o Orçamento de Estado 2012 que impõe cortes nos subsídios de férias e de natal para funcionários públicos e pensionistas, são razões mais que suficientes para apresentar a sua demissão. Vendo bem a demissão de Cavaco cada vez mais se confunde com a demissão deste governo fascista.

As medidas de austeridade tomadas pelo Governo português, segundo o relatório da Comissão Europeia, para além de estarem distribuídas de forma desigual entre ricos e pobres, fizeram subir o risco de pobreza, particularmente entre idosos e jovens. Assim. Portugal "é o único país com uma distribuição claramente regressiva", ou seja, em que os pobres estão a pagar mais do que os ricos quando se aplica a austeridade. Por exemplo: nos escalões mais pobres, o orçamento de uma família com crianças sofreu um corte de 9%, ao passo que uma família rica nas mesmas condições perdeu 3% do rendimento disponível. Portugal é o único país em que "a percentagem do corte é maior nos dois escalões mais pobres da sociedade do que nos restantes". A Grécia, que tem tido repetidos pacotes de austeridade, apresenta uma maior equidade nos sacrifícios implementados.

No entanto, a selecção portuguesa de futebol será aquela que mais vai gastar em alojamento diário das suas estrelas, no próximo europeu de futebol: 33174 euros por noite. A título de curiosidade, no extremo oposto, a selecção da Espanha, campeã mundial, vai gastar o mais baixo preço por diária: 4700 euros. Alheios às imposições da Troika, os dirigentes federativos portugueses decidiram atingir desde já o topo em gastos numa clara manifestação de desprezo pelo povo que é espremido até mais não puder… tudo a bem da Nação.

A situação do povo português é dramática, segundo dados oficiais, 20% da população está “em risco de pobreza”, ou melhor dizendo, é mesmo pobre. Mas raramente se diz que se não fossem as transferências sociais, que este governo está apostado em diminuir drasticamente senão acabar com elas de vez, desde rendimento social de inserção ao subsídio de desemprego (que são dinheiros descontados directamente pelos trabalhadores), a pobreza estender-se-ia a cerca de 45% da população portuguesa.

No entanto, os grandes grupos económicos nacionais vão deslocando as sedes sociais para paraísos fiscais ou para países onde a tributação fiscal é mais favorável, como aconteceu recentemente com o grupo de distribuição a retalho Jerónimo Martins, a fim de pagarem menos impostos, ou seja, diminuir a sua quota-parte para o sacrifício colectivo. Por outro lado, os encargos líquidos com as famigeradas PPP (Parcerias Público-Privadas) vão aumentando desmesuradamente, e não deixarão de ultrapassar rapidamente os 50 mil milhões de euros plurianuais ainda muito antes do fim do prazo estabelecido ( os encargos líquidos com as PPP rodoviárias ascenderam a mais do dobro do inicialmente previsto no OE/2010, em vez de 382,7 milhões de euros, foram 896,6 milhões de euros – um desvio de 134%!) , o que representa um verdadeiro e escandaloso saque dos dinheiros públicos, melhor dizendo: uma transferência colossal dos rendimentos públicos para a propriedade privada de bancos e grande grupos económicos pela via da lei e da corrupção, que cada vez mais se confundem entre nós, e sem o mínimo risco.

As crises do capitalismo são sempre resolvidas á custa de uma maior exploração dos trabalhadores, não tem sido de outra forma ao longo da história do capitalismo e da sociedade dividida em classes, porque os lucros dos patrões têm forçosamente de se manter ou aumentar até na feroz competição entre capitais. Será agora uma boa altura de acabar com esta crise, colocando ponto final à existência do próprio capitalismo. Esta tarefa está nas nossas mãos.

04 de Janeiro 2012

sexta-feira, 8 de setembro de 2023

As querelas e amuos de Costa e Marcelo

 

No "DN"

 Marcelo entendeu prolongar a reunião do seu Conselho de Estado para além das férias invocando a razão de que Costa, por força de se encontrar fora do país em visita à selecção feminina de futebol que disputava o campeonato mundial na Nova Zelândia, não poderia assistir a toda a reunião e assim poder intervir. A reunião pôde então ter o seu terminus com todos os intervenientes importantes presentes (parece que ainda faltaram dois e retomou os trabalhos já um pouco tarde). Mas, afinal, Costa entrou mudo e saiu calado. Marcelo, segundo as suas próprias palavras, sabia que o primeiro-ministro não iria falar, coube-lhe fazer a intervenção mais relevante com o enumerar das “dificuldades do país”; diagnóstico e tratamento não terá feito.

A segunda parte da reunião do Conselho de Estado de Marcelo, órgão considerado por muito boa gente como inútil, constituído pela brigada do reumático dos senadores do regime, marcou nitidamente a rentrée política do país, mais do que as iniciativas partidárias, e está a ser tema para paragonas de primeira página de jornais, abertura de noticiários e de masturbações de comentadeiros e paineleiros pagos a metro a fim de se saber se Costa está ou não “amuado” com Marcelo, se existe alguma “querela” entre ambos, e quem terá sido o garganta funda presente que botou cá para fora o que supostamente terá acontecido na reunião, há quem aponte o dedo ao calhandreiro Mendes ou ao lobista Xavier (ou não terá sido o próprio Marcelo?). Em resumo, a questão magna é saber quando é que Marcelo dissolve a Assembleia da República e despacha o Costa e o PS.

O fantasma da estagflação e os trabalhadores mais pobres

Mas uma outra realidade se encontra escondida pela cortina mediática e barulhenta das peripécias ligadas à reunião do dito conselho de estado, que, pelos vistos, nem é conselho e nem de estado, que é realidade da grave crise económica, ou dita “economia nacional”, que não está assim tão bem, apenas a sua situação foi mitigada pelo turismo que, mesmo com a tão apregoada Jornada Mundial da Juventude, não impediu que entrasse em recessão em pleno Verão. Segundo os economistas consultados pela Lusa, a economia portuguesa poderá registar um crescimento fraco ou até mesmo uma recessão na segunda metade deste ano, com as exportações totais diminuíram, em cadeia, 2,3% em termos reais. Se o PIB, independentemente do que isso é e como é calculado, subiu, os salários e os rendimentos gerais dos trabalhadores desceram; se o turismo foi melhor este ano deveu-se aos estrangeiros, uma realidade bastante volátil; se as exportações baixaram e se as receitas dos impostos aumentaram, quer a dívida pública quer a privada subiram, totalizando cerca de 808 mil milhões de euros (pública mais mil milhões de euros em Julho, estando nos 281,1 mil milhões de euros).

Mais grave ainda é que as condições de vida de grande parte do povo português se degradam continuamente, de nada valendo as medidas consideradas milagrosas do IVA Zero do cabaz de alimentos ou apoios às famílias mais endividadas à banca. O salário de metade dos portugueses não chega para pagar as despesas, ficando para trás despesas importantes como referentes a uma boa alimentação e saúde, o que significa que ter um ganho pão em Portugal não é sinónimo de não ser pobre. Os salários são miseráveis porque, também, o trabalho precário, ao contrário do prometido por Costa, não diminuiu, pelo contrário, aumentou, ocupando Portugal a posição 3 no ranking da precariedade na União Europeia. No entanto, os propalados fundos de investimento já ganharam 1,2 mil milhões de euros até o mês de julho, ou seja, os especuladores e outros capitalistas rentistas enriqueceram um pouco mais à custa do produto do trabalho do povo português; e mais «Sete mil e 400 milhões de euros foram transferidos no ano passado de contas em bancos portugueses para os chamados paraísos fiscais.» É o fartar vilanagem!

Ainda por cima é a própria classe média, que se criou através dos empregos melhor remunerados na Função Pública, médicos, professores, enfermeiros, técnicos superiores e médios em geral, que está a ser empobrecida rapidamente e a enfrentar o desemprego, que não é tão grave que seria de esperar porque a válvula de escape da emigração de quadros mais qualificados vai ainda funcionando. A par da destruição do SNS e da Escola Pública, os médicos, enfermeiros e professores, assim como outros técnicos, encontram-se agora na primeira linha na luta contra a proletarização, com greves constantes, mas por dispersas e limitadas dificilmente serão vitoriosas, estando, por má-fé governamental, a serem responsabilizados pela degradação de sectores que já foram condenados por Bruxelas. Abater o público para abrir mercado ao privado, os hospitais privados nunca facturaram tanto como agora, por exemplo, o grupo CUF Saúde/Grupo Mello teve lucro de 25,4 milhões de euros no primeiro semestre de 2023, mais 9,9 milhões de euros em relação ao mesmo período do ano passado.

O Banco Central Europeu é quem mais ordena

Sem ninguém estar à espera, o governador do banco de Portugal, ex-ministro das Finanças PS, Centeno, resolveu por bem, ou por iniciativa própria ou a mando do BCE, botar faladura em público apontando o caminho que o governo deve seguir quanto à resolução dos graves problemas económicos do país. Alertou para o facto de o BCE estar a "fazer demais" quanto à subida dos juros, deixando a esperança de que brevemente irão descer, o que todos sabemos que não é verdade, assumiu assim o papel de polícia bom; para depois, já na pele do polícia mau, aconselhar o governo a manter as “contas certas”, com a redução do investimento público quer na economia quer no sector da saúde, educação, segurança social e trabalhadores do estado, ou seja, nas áreas onde os privados deverão intervir para o lucro imediato e fácil.

Centeno teve um discurso declaradamente político, extravasando as suas funções de regulador e de funcionário que jamais foi objecto do escrutínio do voto do eleitorado. Parece que o governo não terá gostado, o certo que passado 4 dias, mais precisamente hoje, é notícia que um grupo de economistas do Banco de Portugal se manifestou contra, não reconhecendo o documento apresentado por Centeno como documento oficial do banco central, que, não deixa de ser conveniente relembrar, recebe apenas ordens do Banco Central Europeu (órgão do grande capital financeiro), já que com a adesão ao euro (marco alemão com outra denominação) Portugal deixou de ter soberania monetária.

As medidas para fazer face à crise endémica do capitalismo e do agravamento que está a ter neste momento são sempre mais do mesmo: A OCDE diz que a descida de inflação é improvável sem o aumento do desemprego, melhor dizendo, só com o agravamento da miséria de quem trabalha é que a crise poderá ser debelada. A CIP, organização benemérita do empresariado português mais troglodita, quer de novo o lay-off simplificado para as empresas que irão ser afectadas pela paragem da Autoeuropa, parecendo que ficou satisfeita com a política de recapitalização das empresas nacionais falidas a pretexto da pandemia – para alguma coisa a pandemia terá servido! Novos radares foram instalados, “para salvar vidas!” diz o governo, mas todos sabemos que será mais para a caça à multa, isto é, mais um imposto que irá dar muitos milhões no final do ano, derrubando a pretensa descida de impostos prometida pelo PS. E as empresas nacionais, segundo relato da imprensa, preparam nova subida de preços, o quer dizer que a inflação será para manter de boa saúde, porque representa a subida dos lucros para os tais empresários empreendedores.

Costa “O Salvador da Pátria”

Conselho de Estado em linguagem gestual - henricartoon

Perante a situação, que vai indo de mal a pior, Costa, arvorado em salvador da pátria, anuncia com pompa e circunstância e para marcar a rentrée política como “fazedor” e não “comentador”, um conjunto de medidas salvíficas para os portugueses: IVA zero até ao final do ano; IRS Jovem, com taxa zero no primeiro ano; e devolução de propinas depois do ingresso dos jovens no mercado de trabalho; aplicação do pacote legislativo de mais habitação, não sabemos bem para quem, que irá ser confirmado na Assembleia da República. Medidas que foram de imediato apelidadas pelos partidos da oposição de falsas, por terem sido copiadas, de “insuficientes” pelo BE, e por aí fora. Parece que Costa entrou em aberta campanha eleitoral já, possivelmente, pensando nas próximas eleições para o Parlamento Europeu, passando assim a perna aos partidos da oposição, principalmente, ao dito “principal” que se desespera em ter um discurso coerente e digno de confiança. Costa ficará na História mais como o salvador do capital em Portugal e os factos prova-lo-ão!

Costa também sabe que os tempos que se avizinham serão particularmente difíceis, para o governo e para quem trabalha, que o desemprego irá disparar. Agora é a Autoeuropa que vai dispensar, por agora, mais de 200 trabalhadores com paragem por mais de dois meses, não se sabe se não será por mais tempo nem qual vai o ser impacto em outras empresas nacionais para para ela trabalham. Outras empresas estão a encerrar portas, Evaristo Sampaio fechou e lançou no desemprego mais de 30 trabalhadores, a indústria tradicional nacional está a dar as últimas, a Groundforce foi declarada insolvente e a coisa não ficará por aqui. Perante um possível ou até mais que certo descontentamento social generalizado, Costa vai, por um lado, tentando serenar os ânimos com a ministra da dita “Solidariedade” a dizer que as dificuldades sentidas pelos trabalhadores são devido à guerra na Ucrânia; pelo outro, vai mudando as chefias das polícias pedindo-lhes mais colaboração e coordenação. Se a cenoura não funcionar, restará o cacete sobre quem trabalha e seja renitente às medidas de mais pobreza.

Os tempos que se avizinham são sombrios e o mundo do trabalho deve abandonar as ilusões e preparar-se para a luta.

domingo, 3 de setembro de 2023

Corrupção, racismo e violência policial

  

Henricartoon

Escrita antes da pandemia, em janeiro 2020, sobre a democracia cleptocrática nacional sob a égide socialista

Ocorreram ultimamente, neste mês de Janeiro e para começar bem o ano, vários acontecimentos que não deixam de estar interligados, denotando que mais não são que os diversos reflexos de uma mesma realidade. Foi o Ministério Público, que se arvora em polícia do regime e estado dentro de estado isento de qualquer escrutínio democrático, que entendeu pagar a um agente reformado da PJ para investigar os meandros, entre os quais eventuais favores políticos, na operação designada sadiamente por “Tutti Frutti”.

Portugal foi, mais uma vez, condenado pelo TEDH (Tribunal Europeu dos Direitos Humanos) pelo mau funcionamento da justiça. Foi o polícia zeloso e cumpridor, a solicitação de funcionário de empresa privada de transportes públicos, que espanca, em plena via pública e perante outros cidadãos, uma mulher negra e pobre que terá retorquido ao motorista por falta de passe da filha menor.

Foi Ana Gomes, considerada a “rebelde” do PS, já apresentada como candidata de esquerda às próximas eleições presidenciais por ter andado a denunciar a cleptocrata Isabel dos Santos, considerada a mulher negra e africana empresária de sucesso com todas as portas abertas cá nesta província germanófila da União Europeia. Foi e será o fazer de conta que ninguém sabia da origem do dinheiro lavado proveniente de Angola, desde jornalistas a políticos, desde empresários nacionais igualmente de sucesso a banqueiros, desde o regulador que nada regula governador do Banco de Portugal ao PR Marcelo que considera todo o investimento bem vindo independentemente de onde venha e quem o traga desde que no “respeito pela legalidade e pela constitucionalidade” nacionais.

São todos aspectos de uma mesma realidade: a democracia parlamentar burguesa como o melhor regime de gestão dos negócios capitalistas.

A justiça de classe

Pela atitude do Ministério Público fica-se com a impressão de que ou se pretende esconder os tráficos de influência e os nepotismos que são caraterísticas iniludíveis e até naturais de dirigentes e militantes mais destacados dos partidos do arco do poder; ou, então, o MP não confia na PJ, polícia muitas vezes apontada pela sua eficiência mas não suficientemente conhecida pela corrupção que parece ser endémica, podendo qualquer cidadão lembrar-se qual era a alternativa que o PS, nas pessoas de Mário Soares e António Arnaut, apresentou na altura em vez de se criar um SNS, precisamente combater a corrupção na PJ, chaga que já vinha do anterior regime. Ao que parece seria tarefa difícil e assaz dispendiosa, daí optar-se pelo SNS. Saliente-se que serão crimes de natureza económica e financeira, como corrupção, tráfico de influência e possível financiamento partidário ilícito, envolvendo figuras gradas do PS e PSD que estão na mira da operação “Tutti Frutti.”

Ainda se está por perceber a actuação do MP no caso das mortes dos seis jovens na praia do Meco, fez agora, em Dezembro passado, sete anos, quem e o quê terá andado a encobrir?, que fez com que Portugal, mais uma vez, tenha sido condenado pelo TEDH (Tribunal Europeu dos Direitos Humanos) pelo mau funcionamento da justiça; mau ou não funcionamento em relação às vítimas, note-se!, mostrando que a justiça em Portugal é uma justiça dual, uma justiça de classe. Repare-se que o Procurador, que pouco e mal terá investigado, foi elogiado pela então Procurador Geral Distrital de Lisboa, a actual ministra PS da Justiça.

Também interessante reparar que a PJ e o MP só mexeram o cu nas buscas ao Montepio só depois do principal suspeito ter sido removido da direcção daquela instituição. A justiça portuguesa parece que funciona bem no sentido de defender o poderoso e perseguir o pé rapado. Fica-se com a ideia que o MP, em relação à contratação em causa, aposta na privatização da investigação criminal, para não falar de toda a justiça. Contratos do estado com privados envolvem geralmente luvas, favores e corrupção. Em suma, um polvo, onde a corrupção e o tráfico de influências se encontram sempre presentes.

O racismo e a violência policial

Torna-se recorrente os episódios de violência policial, geralmente contra o preto e/ou o pobre e trabalhador, Ainda estamos para ver casos de violência contra o burguês bem vestido e influente, género Ricardo Salgado ou Joe Berardo, é sempre contra os mesmos: pobres e trabalhadores e pretos. A relação é mais longa do que a se conhece: Kuku (assassinado pela PSP, 2009); Guto Pires (agredido pela PSP, 2013); Bruno Lopes, Celso Lopes, Flávio Almada, Miguel Reis, Paulo Veiga e Rui Moniz (todos agredidos, sequestrados e torturados pela PSP em 2015); Matamba Joaquim (agredido pela PSP, 2016); Mário Mendes (agredido pela PSP, 2016); Francisca Lopes (agredida pela PSP, 2017); Fernando Coxi e Julieta Jóia (agredidos pela PSP, 2019).

O racismo é o expediente que a burguesia usa para justificar uma maior exploração e opressão dos trabalhadores ditos “de cor”, porque o tratamento que é dado aos pretos ricos, nomeadamente aos novos burgueses dos Palops é mais que reverencial, não deixa até de ser humilhante para os aduladores, no caso, a nossa burguesia branca. Não estamos a ver o polícia a espancar uma Isabel dos Santos ou motorista a chamar a polícia, embora, a cleptocrata para se defender se queixe agora de estar a ser vítima de racismo.

O perpetrador da violência foi um polícia que já foi de elite, culpa-se usualmente a deficiente formação dos polícias ou a falta de treino em lidar com situação difíceis respeitando os direitos do cidadão e de forma adequada ao contexto social. Não se aponta a lavagem ao cérebro aos recrutas da PSP e da GNR que os prepara exactamente para a tarefa que geralmente executam com prontidão e zelo: reprimir o pobre, o trabalhador e o preto. Mesmo o diferente, depende, pomos sérias dúvidas se o comportamento do polícia seria o mesmo se tratasse, já não dizemos de uma tia de Cascais, mas de uma cigana, com certeza que seria diferente, nem o motorista chamaria a polícia. A agressão posterior do motorista é mais que suspeita, no mínimo será tão verdadeira como a mulher se tenha ferido por ter caído no chão, vem a calhar, parece que foi feita por encomenda e pela própria polícia a fim de mostrar que pretos são vingativos e as que levam ainda são poucas. Operações de falsa bandeira é coisa que a polícia está mais do que treinada.

Estamos à espera que o governo do Costa do PS limpe a PSP e a GNR dos elementos de extrema-direita e abertamente nazis e que alguns deles, sabendo-se impunes, se manifestam livremente e em público em movimentos e em partidos que, pela Constituição, deveriam ser proibidos. Racismo e violência policial estão sempre de mãos dadas. O documento, produzido recentemente pelo Comité Consultivo da Convenção Quadro para a Proteção das Minorias Nacionais do Conselho da Europa, não deixa margem para dúvidas: as comunidades ciganas em Portugal continuam a ser discriminadas e a viver à margem da sociedade, e recomenda "medidas que previnam a disseminação do discurso de ódio nos media e nas redes sociais, a formação das forças de segurança para os direitos humanos e o apoio do Estado a projetos locais que promovam o combate aos preconceitos e estereótipos racistas e xenófobos". O que tem feito o governo PS/Costa? Nada. E percebe-se, é que polícias, militares e poder judicial serão sempre a última reserva da defesa da velha ordem política burguesa. O PS vela pelo bem-estar e segurança da burguesia e não do povo.

Uma democracia cleptocrática

Dentro deste contexto de endurecimento do regime formalmente democrático, onde estará admiração de uma cleptocrata tenha feito de Portugal a lavandaria do dinheiro sujo de sangue e de miséria. E só depois de ter sido formalmente denunciada, venham agora umas falsas virgens púdicas, que há muito perderam a virgindade embora invocando que não sabiam que estavam a ser desfloradas, unidas pelo medo de se verem afundadas no mesmo barco, reclamar inocência e virtude. Em Angola, assiste-se a uma luta entre duas cliques a ver quem rouba mais ao povo, e, em Portugal, estamos a assistir a uma mudança de posição de políticos e empresários, das nossas elites que não são menos corruptas que as angolanas, com o objectivo claro de continuar a embolsar o quinhão a que acham ter direito. Desde que, e quem o diz é o incontornável PR Marcelo, se respeite as leis e as instituições nacionais, precisamente aquelas que foram feitas por e à medida dos que se alimentam e alimentam a corrupção.

A burguesia portuguesa continua com a mesma política, não sendo a sua natureza substancialmente diferente, da antiga burguesia colonialista e roceira, agora a diferença está em ter de compartilhar o bolo resultante do saque com uma elite local e não menos corrupta. O que se compreende ao vermos a persistência do governo em manter no estrangeiro forças armadas, mercenárias (mais confiáveis), cujo objectivo é proteger a pilhagem levada a cabo pelos grandes grupos económicos da União Europeia, da qual as empresas portuguesas esperam colher as migalhas. São as velhas pretensões e hábitos coloniais de potências que já tiveram colónias e que agora irão desenvolver sob a protecção de uma Alemanha abertamente imperialista, não foi por acaso que a alemã Ursula von der Leyen foi catapultada para a presidência da Comissão Europeia. O IV Reich, de braço dado com a França, já mostrou querer estender as garras, a começar pelo apoio que presentemente está a conceder aos mercenários do Daesh na Síria, e o resto virá com o tempo.

A acumulação e concentração do capital fazem-se de forma imparável sem considerações moralistas ou humanitárias. A burguesia portuguesa encontra-se inserida na cadeia capitalista europeia e mundial mais geral, contenta-se com os restos e a manter-se no lugar subalterno que lhe foi reservado, mas não é por isso menos exploradora, pérfida e corrupta - também lhe está no sangue. A diferença entre a cleptocracia nacional e a angolana será quanto muito pormenor de idade e de polidez.

Imagem de destaque: https://henricartoon.pt/opiniao-publica-1159096

20 janeiro 2020