A preparação do 1º de Maio de 1974 mostrou que
o povo estava a lutar e antes que o regime caísse na rua… deu-se o 25 de Abril.
Salgueiro Maia não conseguiu esconder, pouco
tempo antes de falecer, as razões que levaram a que o golpe tivesse sido
antecipado para a data de 25 de Abril – não era esta a data prevista para o seu
desencadeamento - que era o “desconforto” existente no seio dos oficiais das
Forças Armadas devido às consequências imprevisíveis da realização do 1.º
de Maio Vermelho, cujo amplo trabalho de convocação era realizado desde o
princípio do mês, situação confirmada pelo próprio Otelo em outra ocasião.
Por todo o lado se mobilizava os operários
para o dia de luta do proletariado internacional, sendo visíveis de norte a sul
do país as inscrições nos muros realizadas por comunistas revolucionários e da
CDE sobre a libertação dos presos ou sobre a carestia de vida, mas cuja
propaganda era feita em ruelas esconsas ou comunicados deixados aos montes nas
casas de banho e corredores do Metro, sendo facilmente apanhados na sua quase
totalidade pela polícia, como refere o relatório (página 2-4)
É o “Ultimo relatório sobre a situação geral
do país do Ministério do Interior para a PIDE-DGS” (“Perintrep” do
Comando-Geral da P.S.P, nº15/74, respeitante ao período de 6 a 13 de Abril),
que diz.
A folha 2-1, ponto 1, Situação Geral e na
alínea a), pode ler-se o seguinte: «Continuam a aparecer panfletos (LISBOA,
AVEIRO, LEIRIA, SANTARÉM E VIANA DO CASTELO) e pichagens (LISBOA, COIMBRA E
BRAGA), relativos ao próprio dia 1 de Maio. O panfleto referente a Viana do
Castelo era já conhecido e os restantes não tinham sido ainda detectados. Os
seus autores são: “MRPP”, “CLAC” e “RPA-C”. Este último tem a finalidade de
pretender induzir o pessoal das Forças Armadas a manifestar-se no 1º. de Maio».
Páginas 2-3 e 2-4 do mesmo documento, faz-se
referência a comunicados contra a guerra colonial distribuídos porta a porta
pelos CLA-C's e pela RPA-C e a “inscrições murais com o desenho da foice e do
martelo: “VIVA O 1º DE MAIO / VIVA A DITADURA DO PROLETARIADO / TODOS AO ROSSIO
ÀS 19H30 / O 1º DE MAIO É VERMELHO / TODOS AO ROSSIO ÀS 19H30 MRPP”».
E a página 2-5 (só para citar algumas
referências), pode ler-se igualmente: «Data: 29 Mar 74. Editado: “Comité
Amílcar Cabral – Comité Directivo da RPA-C. Súmula: Procura arrastar soldados e
marinheiros para a anunciada manifestação do dia 1 de Maio no ROSSIO pelas
19h30, ao lado da classe operária e do povo contra a ditadura da burguesia
colonial-fascista, contra a exploração capitalista, etc., indicando ter-se
registado já no Regimento de Engenharia nº1 um caso de indisciplina».
Coimbra, 8 de Abril «detectadas na Rua
Rego do Bonfim e na Fábrica de Cortumes, as inscrições murais: “VIVA A CLASSE
OPERÁRIA, ABAIXO A EXPLORAÇÃO CAPITALISTA, O.C.M.L.P. / O GRITO DO POVO EM
FRENTE PELA REVOLUÇÃO POPULAR / VIVA O 1-º DE MAIO”» (pág. 2-10).
Em Barcelos, «em 10 de Abril, são
«detectadas em vários locais as inscrições murais: “VIVA O 1.º DE MAIO – GREVE
/ MANIFESTEMO-NOS CONTRA A EXPLORAÇÃO CAPITALISTA / ABAIXO O CAPITALISMO /
ABAIXO O CUSTO DE VIDA / MAIS DINHEIRO /JUNTOS NO 1.º DE MAIO DIA DO OPERÁRO /
LUTA”, seguidas das iniciais A.C.M.L.P. e do desenho da foice e martelo» (a
folha 2-12).
Em Viana do Castelo, «11 de Abril, foram
encontrados no Bairro Jardim, 26 exemplares do panfleto: “CAMARADAS: VIVA O DIA
DOS TRABALHADORES – VIVA O 1º DE MAIO, editado pela Organização
Marxista-Leninista Portuguesa (O Grito do Povo)”» (pág. 2-22).
Aveiro, 11 de Abril «foram encontrados em
Espinho, exemplares dos panfletos com o título: FERIADO NO 1.º DE MAIO! UMA
LUTA DE TODOS OS TRABALHADORES. Assinado por “Um Grupo de Trabalhadores” (pág.
2-11).
Outras indicações sobre a agitação e
propaganda para a convocação do 1º de Maio, realizadas em Braga, na Marinha
Grande ou em Torres Novas, se podem encontrar do mesmo documento (páginas 2-17
e 2-20), o que prova que a Pide e as outras forças repressivas tinham os olhos
postos sobre a actividade de quem se oponha com firmeza à guerra colonial e ao
regime.
O PADRE QUE PREGAVA CONTRA A GUERRA E OS
ESPECULADORES
Sem dúvida que uma das referências mais
interessantes encontradas no “ÚLTIMO RELATÓRIO sobre a situação geral do país
do ex-ministro do Interior para a ex-pide/dgs” é aquela que diz respeito à
prédica do padre de Maximinos, em 6 de Abril, que passamos a transcrever:
«Aspecto religioso: chegou ao conhecimento do CD que o padre LIRA, pároco da
freguesia de Maximinos desta cidade, nas meditações que fez durante a Via
Sacra, enquadrada no programa das solenidades da Semana Santa em Braga, que
teve lugar naquele dia, tendo por intenção especial os emigrantes, junto dos
respectivos calvários, entre o mais, pronunciou: “Ó Jesus Cristo auxiliei o
povo do século XX, ajudai o clero, as Instituições, os Bombeiros, os Educadores
e os que fazem greves para aumentar os seus salários;
Ó Jesus Cristo castigai os do século XX que
exploram os pobres, açambarcando os géneros e marcando-os por um preço mais
elevado, aqueles que compram por cinco e vendem por trinta e cinco, aqueles que
têm os presos a morrerem nas cadeias, aqueles que como Judas atraiçoam toda a
gente e estão agora colocados em grandes pedestais;
Ó Santa Mãe que recebeste uma medalha do teu
filho como exemplo de honra, mas não é como estas mães que agora recebem
medalhas e condecorações a título póstumo por os filhos que morrem na guerra”»
(pág. 2-13).
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