quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

O Bonapartismo e o fim da democracia burguesa

A Assembleia da República tem vindo a funcionar como caixa de ressonância do primeiro-ministro Costa e do presidente Marcelo e, como não poderia deixar de ser, aprovou, mais uma vez e outras virão, a “renovação” do estado de emergência. Será até 7 de Janeiro, depois das festividades de Natal e Fim de Ano, com o pretexto de impedir a 3ª vaga pandémica, como Marcelo já anunciara. É, na prática, uma situação que se irá eternizar, acabando por ser uma formalidade a dita “renovação” quinzenal que, banalizando-se, será ad aeternum, em claro violação da tal Constituição da República, que os partidos da esquerda bem comportada gostam tanto de elogiar. Sob a falsa bandeira de defesa da saúde e da vida dos portugueses, a democracia parlamentar burguesa já deu a alma ao criador, como dizem os crentes. Agora, trata-se de oficializar a nova situação, coisa que irá acontecer no próximo dia 24 de Janeiro com a reeleição do “presidente dos afectos”, que neste mandato irá mostrar qual é a sua verdadeira afectividade. Na entrevista à televisão do sócio nº1 do PSD, Marcelo já esboçou sobre o futuro da Nação, ao admitir um governo constituído com a extrema-direita, e entreabriu um pouco a sua personalidade, admitindo não ter contactado com a viúva de cidadão ucraniano para “não abrir excepção”.

A reeleição do homem é dada como mais do que certa, não parece que venha a haver alguma desagradável surpresa com as consecutivas sondagens a dar uma confortável vitória logo à primeira volta; sondagens essas cuja principal finalidade é condicionar o comportamento do eleitorado mais indeciso, o tal eleitorado do “centro”, que mais não é que a pequena-burguesia temerosa que geralmente se decide para o lado que lhe parece ser mais forte. Pela última sondagem, o homem irá receber votos dos eleitores de todos os principais partidos, sendo o eleitorado do BES o aparentemente mais mutável. O que revela que uma crise sem fim à vista, crise económica que foi exacerbada pela artificial crise pandémica e a sem resolução em termos imediatos, faz com que grande parte desta pretensa classe média se refugie no seio da contra-revolução. E o chefe da contra-revolução não é o "amigo dos ciganos", mas o afilhado do outro que não se tem cansado de mostrar que influencia de forma indelével a actuação do governo. Costa, de certo modo, vai gerindo essa denominada ingerência em seu proveito, dando a entender, ou alguém por ele, que meteu o presidente no bolso; no entanto, ambos tentam retirar dividendos da ambiguidade e, no final, talvez a realidade venha a confirmar que será o oposto, Costa é que estará na algibeira. As palavras “venturosas” de "Deus confiou-me a difícil mas honrosa missão de transformar Portugal" soam melhor na boca do influencer-mor.

Não se deve esquecer que o que faz mexer a superfície da crosta é o vulcão oculto nas profundidades que, por enquanto, silenciosamente já entrou em trabalho de erupção. E o vulcão são os trabalhadores e o povo na sua revolta ainda larvar, esmagados pelo desemprego e pela fome, que em 2021 irão crescer enormemente. O “Ronaldo das Finanças” quer intimidar, dizendo que serão precisos “mais de três anos para recuperar emprego que a pandemia (a pretexto de) apagou”; os patrões ou recusam aumentar os salários dos trabalhadores, como acontece na Sonae que invoca a pandemia para justificar a manutenção de salários já bastante depauperados; ou avançam para o despedimento, como parece que irá acontecer em breve com o encerramento da refinaria de Matosinhos da Galp levando ao desemprego mais de 500 trabalhadores; ou o povo português que empobreceu nos últimos dez anos, com o salário mediano mais baixo de toda a União, como demonstra o Eurostat; ou o número de casais de trabalhadores com ambos os elementos inscritos nos centros de emprego que aumentou 15,9% em Novembro face ao mesmo mês de 2019; ou os bancos que continuam no assalto aos dinheiros públicos, com o Goldman Sachs e outros fundos internacionais que avançam com novas ações em tribunal contra estado português a exigir o ressarcimento de 835 milhões de dólares enfiados no BES; ou a dívida pública que só nos primeiros nove meses deste ano aumentou 17 mil milhões de euros, ou seja, de 310.466 milhões de euros está agora em 328.200 milhões (na óptica de Maastricht), que é mais do dobro do aumento (8.476 milhões de euros) que teve nos três anos anteriores. O ano de 2021 será um ano inimaginável de pobreza e fome, superando o que está finar-se.

O PR é acusado pelo sindicato dos inspetores do SEF, em campanha corporativa, de ter “extrapolado as suas competências” ao ter falado publicamente sobre a reestruturação daquela polícia, e as pressões são mais que muitas para que exerça o seu magistério de influência para a demissão do ministro da Administração Interna. A chamada ao Palácio de Belém do director-geral da polícia, a fim de se inteirar da questão da aparente disfuncionalidade de uma polícia concorrente da PSP e com o cabo de esquadra a opinar sobre a questão, foi mais do que uma desautorização do ministro ou do Costa, mas um reafirmar de uma faceta não só dele (Marcelo) como do próprio estado: o autoritarismo, que se reforça no estado de excepção. A impunidade e a continuada violação da lei pelas diferentes polícias são a outra face de que o “estado democrático e de direito” não passa de uma ficção. Com o agravamento da crise do capitalismo não há espaço para facécias, a revolta social poderá estar no virar da esquina, e o Bonaparte tem de ir já assegurando pelo menos a guarda pretoriana. O agravamento da fome dos espoliados faz soar as campainhas de alarme, e a musculação do regime vai-se sentido não só com os candidatos a Bonaparte a tomar posição, mas com os partidos a “renovarem-se”, como exige o clérigo católico, e essa renovação já se iniciou com o aparecimento de outras formações políticas, apesar de todas elas defenderem o sistema de exploração dos assalariados, embora possam dizer o contrário.

Mas não é só o aparecimento de novos partidos, os existentes, em particular os que surgiram em torno do 25 de Abril, vão-se modificando. E se o PSD está a desdobrar-se nas suas duas facções mais importantes, uma mais moderada a outra mais trauliteira, e o CDS a desfazer-se, o PS, sempre numa inclinação à direita, irá de igual modo dividir-se. Ninguém se admire que uma parte se junte ao actual PSD, num outro partido de direita liberal, coisa que, aliás, está já a acontecer com alguns dos seus autarcas e militantes no terreno a recolher assinaturas para a recandidatura de Marcelo. Se a função faz o órgão, o bloco central de interesses irá formalizar-se num só corpo. Contudo, e a propósito das presidenciais, um outro partido se está a criar: o partido do presidente. O Bonaparte também não prescinde da tropa de choque, e o partido irá surgir, agora ou depois.

Se o PS se dilui na direita, o BE, desde há algum tempo, que se posiciona para substituir o PS na governação, a exemplo do que se passou com o Syriza na Grécia e, diga-se de passagem, de triste memória para o povo grego. A abstenção na aprovação do estado de emergência marca bem o seu carácter oportunista e de subserviência ao poder; quando aí alcandorado, imitará bem o congénere grego, e não hesitará em usar o cacete sobre os trabalhadores e obedecer aos ditames de Bruxelas. O PCP reafirma, depois do congresso (cuja realização em época pandémica foi tão contestada quer à direita, quer à esquerda), a sua natureza social-democrata e pequeno-burguesa, dando razão àqueles que sempre o acusaram de nunca ter deixado de ser, desde o primeiro minuto da sua fundação, um partido burguês para operários. Marisa Matias do “sou uma social-democrata, não na mesma graduação" não está só, mas não acompanhada pelos dois que referiu, porque esses nunca estiverem naquele barco e agora cada vez menos. O PCP jamais conseguirá fugir ao acicate de ter podido realizar o congresso a troco de não reprovação do OE-2021, o que por sua vez reafirma o apoio ao governo. O resultado eleitoral do seu candidato será também uma consequência e uma confirmação da suspeição. O aparecimento de uma candidata populista de esquerda talvez seja a outra face da mesma pequena-burguesia arrivista, Ana Gomes, a justiceira do futebol. Em relação a esta excrescência do PS, falaremos mais tarde.

Portugal é um dos países que menos emprega imigrantes”. É uma realidade incontornável, apesar de ter sido sempre um país de forte emigração. Ele figura no fim da tabela entre os países da Europa dos 27 que menos emprega população estrangeira: apenas 3% da população empregada é estrangeira. Terá sido uma forma de assinalar o Dia Internacional das Migrações, que ocorreu na passada 6ª feira. Não deixa de ser o espelho de um “país” racista, racista pelas suas elites, que ainda não perderam, nem jamais conseguirão perder, as ambições coloniais, agora levadas à prática através das forças militares destacadas em países estrangeiros onde as empresas da União Europeia mantêm interesses na exploração das riquezas naturais, contando ainda recolher algumas migalhas do saque. Um “país” de cultura autoritária e de impunidade, quase diariamente constatada nas violências policiais, com o SEF a dar notícia nos últimos dias pela violência exercida sobre um cidadão cabo-verdiano, mostrando mais uma vez quais são na realidade os seus valores humanistas, e os da União Europeia onde se insere.

Só que este “país”, este Portugal entre comas, é o país de uma burguesia retrógrada, rentista e parasitária, que a toda a hora inculca os seus valores sobre os trabalhadores e o povo, sendo a pequena-burguesia a classe mais sugestionável por força da sua posição no processo produtivo. Não deixa de ser interessante ver gente que se diz de esquerda ou de extrema-esquerda nas redes sociais estigmatizar os empresários da restauração que se têm manifestado na rua de “oportunistas” e de tropa que irá engrossar as fileiras da extrema-direita. Ora, foi devido à ruína das classes médias que o povo de Paris teve condições e força para ousar uma atitude mais que heróica, a Comuna de Paris – em Março assinalam-se os 150 anos. Para que a classe operária, independentemente das características que actualmente assuma nesta economia profundamente terciarizada, possa conduzir a revolução socialista a bom termo terá de ter a seu lado, sine qua non, a grande maioria das classes intermédias irremediavelmente depauperadas.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Portugal 2020: mais pobreza... e mais compressão dos direitos e liberdades

 

Walker Evans, 1937

O ano de 2020 está a chegar ao fim e a pobreza, uma realidade endémica entre nós, teve um surto bem maior que o número de doentes ou de mortes causados pela doença do ano e da década covid-19. Os números são iniludíveis e são as insuspeitas organizações, algumas delas ligadas directamente ao capitalismo que o afirmam: “Portugal é o país europeu onde os salários mais caíram por causa da pandemia, entre o primeiro e o segundo trimestre de 2020, os salários praticados em Portugal recuaram 13,5%, é a maior quebra entre os países europeus”, cuja média é de 6,5%; “trabalhadores com salários baixos foram os que mais perderam empregos na pandemia”; “mulheres portuguesas perderam 16% de massa salarial em 2020”; “estudo europeu feito em plena pandemia coloca Portugal no antepenúltimo lugar de uma tabela com 24 países sobre a capacidade de pagar contas”; “Portugal foi em 2019 o quarto país com nível mais elevado de despesas domésticas como água, alimentação, electricidade, gás e habitação” e cuja situação terá piorado; “mais de 600 novos pobres em Lisboa com segunda vaga da pandemia de Covid-19”. E para rematar: “OCDE arrasa retoma portuguesa, nem fundos europeus dão a volta à pandemia”, se o governo do PS/Costa baseou o OE para 2021 num crescimento de 5,4%, a mesma OCDE prevê apenas 1,7%, desse modo a retoma da economia em 2021 e 2022 não vai chegar, nem de longe nem de perto, para reverter a destruição provocada este ano com o pretexto de combate à pandemia; crise que já vinha de trás por força das contradições do capitalismo. O futuro será forçosamente de mais desemprego, mais precariedade, mais fome e mais miséria. Daí os contínuos estados de emergência e as medidas de reforço das forças policiais, estas cada vez mais arrogantes e prepotentes, contando com a impunidade, incluindo nos casos de tortura e homicídio, com o objectivo de afastar a revolta popular que fácil e rapidamente se anuncia.

Portugal recebeu uma tranche de três mil milhões de euros do programa europeu SURE, é a primeira tranche do programa que diz que é “de protecção dos trabalhadores e empresas”. No entanto, todos sabemos que a protecção ao emprego é uma falácia, um engano para esconder que a verdadeira protecção é a dos accionistas das empresas, das grandes empresas e dos grandes patrões que não podem ver os lucros a baixar. Quanto ao lay-off, este está a ser suportado graças aos fundos da Segurança Social, que irá também financiar os “prejuízos” dos patrões com a reles e mísera subida de 30 euros do Salário Mínimo Nacional, uma cedência do governo aos patrões, representados pelas grandes associações que não se cansam de vir às televisões ameaçar com as falências em massa, através da redução da TSU (Taxa Social Única); uma tentativa que fracassou no tempo do governo Passos/Coelho/PSD/PP, mas que parece que irá ser bem sucedida com um governo que se diz de esquerda e que ainda vai tendo o apoio dos outros partidos da putativa esquerda: BE e PCP. Não esquecer que os dinheiros de Bruxelas, independentemente da proveniência específica, não são, nunca foram e jamais serão a fundo perdido. Mais tarde ou mais cedo, tudo esse dinheiro será pago pelos trabalhadores e pelo povo com língua de palmo e sempre com juros acrescidos. Na Europa do capital, não há “solidariedade”, como refere o “nosso” primeiro ou o ministro das cativações, apenas negócios e lucros.

Se a média salarial em Portugal, segundo os números oficiais do INE, anda pelos 1019 euros mensais brutos, contudo, verifica-se uma grande variação conforme o sector de acitividade e, assim, constata-se que a maioria dos salários são bastantes baixos em sectores como na construção civil (-23,4% em relação à média), na restauração (-32,3%), na agricultura (-33,9%) e na industria extractiva é que são superiores à média (apenas +1,2%). E se a criação de riqueza no país (PIB) tem vindo a crescer, aumentando, em preços correntes, em mais 21,6% (29.767,7 milhões de euros), entre 2009 e 2019, verifica-se que a repartição entre o Capital (Excedente Bruto de Exploração) e o Trabalho (ordenados e salários) tem sido cada vez mais desigual: o Excedente Bruto de Exploração cresceu em 12.224,9 milhões de euros (+20,8%) e os ordenados e salários subiram apenas 5.649,9 milhões (+13,8%), ou seja, menos de metade. Em conclusão: em 2019, apenas 35% da riqueza criada no país revertia para trabalhadores, que eram 4.009.600, enquanto 41% revertia para os patrões, que eram 224.700, isto é, vinte vezes menos. Não só existe uma enorme disparidade de salário entre os diversos sectores dos trabalhadores como a desigualdade económica e social na sociedade portuguesa não cessa de crescer, nomeadamente em tempo de governos “socialistas”. Estes números, coligidos pelo economista Eugénio Rosa, são como a prova do algodão, não enganam. Nem será preciso vir a OIT dizer que “o terramoto económico e laboral trazido pela pandemia está a conduzir a um aumento da desigualdade de rendimentos” - já o era!

Enquanto o povo português vai empobrecendo, agora com a excelente desculpa de que a responsabilidade é da doença covid-19 e de que o governo não faz mais e melhor é porque não pode, a realidade segue o seu curso sem olhar para a mentira e a manipulação do Costa e da sua trupe: “a dívida pública, na óptica de Maastricht, subiu 1,1 mil milhões de euros em outubro para os 268,14 mil milhões de euros, atingindo um novo recorde”; concretamente, 130,6% no terceiro trimestre, subindo face aos 126% do PIB no segundo trimestre. A subida para um novo e triste recorde deve-se, em parte, às emissões de títulos de dívida, no valor de 1,1 mil milhões de euros“, segundo explicação do Banco de Portugal. Também é notícia que “Portugal empurra 1.376 milhões de euros em dívida para 2028 e 2029. O quer dizer, em linguagem mais popular, o governo PS/Costa vai empurrando com a barriga a dívida pública, à espera do que nunca virá a acontecer que seria uma grande retoma da economia (capitalista) nacional. E facilmente se prevê o que irá acontecer já no futuro próximo, para além do que já aconteceu: os trabalhadores irão ter salários mais baixos, mais contas para pagar ao fim do mês, os que ainda tiverem emprego, e os desempregados deparar-se-ão com mais fome e miséria. O exército de mão-de-obra de reserva aumentará não só pela consequência directa da crise do capitalismo, através da destruição massiva das forças de produção, mas, o que não deixa de ser irónico, pelo reinicio anunciado do capitalismo, sob o slogan do verde e da protecção do meio ambiente, que será com menos trabalhadores, seja pela robotização ou pelo teletrabalho, e com jornadas de trabalho mais longas e salários mais curtos. Quando a pandemia se for, como todas as outras que aconteceram no passado, com ou sem vacina, os estados de emergência ficarão... para meter os trabalhadores na ordem.

Ainda antes da repressão pura e dura, como já está a acontecer em França, os trabalhadores deparam-se com mais doença, seja pela incerteza do futuro, como refere o European Consumer Payment Report 2020, seja pela paralisação do SNS, com o pretexto do combate à pandemia, e a sua subsequente rápida destruição com a inclusão dos privados e do sector dito “social”. O Relatório Anual de Pagamento ao Consumidor Europeu 2020 (em português), realizado em plena pandemia pela empresa sueca especialista na gestão de créditos Intrum, mostra que 59% dos portugueses inquiridos afirmam ficar com menos de 20% do rendimento após pagar as contas”, um valor que é “superior à média europeia, de 41%”, e que “a preocupação com o futuro e o aumento do stress e ansiedade atinge cada vez mais os portugueses” e que estes estão, neste momento, “mais preocupadas com o seu bem-estar financeiro do que em qualquer outro momento da sua vida”. O governo PS/Costa, através das ARS está afazer contratos com os privados para a realização das cirurgias, consultas e outros cuidados de saúde, com o pretexto da pandemia, listas que antes da covid-19 já eram assaz longas, devido à cumplicidade das administrações hospitalares com os médicos que, acumulando o público e o privado, sempre sabotaram o seu trabalho no SNS para o fazerem no privado e ganharem pelos dois lados; a Saúde deve ser o único sector em que o estado/patrão incentiva os seus trabalhadores a fazer-lhe concorrência desleal. O propalado reforço de pessoal do SNS não passa de um logro já que o total de horas extra no SNS atinge o valor mais alto de sempre, cerca de 15,4 milhões de horas suplementares, até o mês de Novembro, ou seja, mais 860.344 que o valor registado em todo o ano passado. E até foram realizadas menos 9 milhões de consultas presenciais nos centros de saúde até Outubro e nos hospitais, as consultas presenciais sofreram uma redução de 2,7 milhões entre Janeiro e Outubro de 2020, face ao mesmo período de 2019. E, assim sendo, os negociantes privados da saúde (doença) esfregam as mãos de contentes, a seguir à ARSN é agora a ARS Lisboa e Vale do Tejo com o Hospital de Santa Maria que vai operar 500 doentes não covid-19 em hospitais privados, num plano que engloba cinco unidades, quatro privadas e uma do sector social, com “a contratação de 250 camas, das quais 50 de cuidados intensivos, bem como outros recursos, anestesistas, equipas técnicas, medicamentos e urgências, caso sejam necessários”. É o fartar vilanagem!

Enquanto os ricos ficam mais ricos e os pobres ficam mais pobres, é demitida ou demite-se a directora nacional do SEF nove (!) meses depois do homicídio do trabalhador imigrante Ihor Homenyuk às mãos dos torturadores daquela polícia com laivos de política. Poderemos dizer que se Ihor Homenyuk fosse algum oligarca ucraniano nada daquilo teria acontecido, bem pelo contrário, teria adquirido um visto gold (golden visa) e à sua espera estaria algum ministro ou secretário de estado e com a polícia do SEF a fazer-lhe continência. A propósito desta questão da repressão sobre o trabalhador, seja ele nacional ou imigrante, é o relatório Estado Global da Democracia, do Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA Internacional), que diz que “muitas democracias usaram medidas ilegais ou desnecessárias durante a pandemia”. E vai mais longe: “um ano após os primeiros surtos do novo coronavírus, a pandemia parece ter aprofundado os regimes autocráticos em países não-democráticos e retirou liberdades e direitos nos regimes democráticos”. Como se vê, a pandemia serve para tudo e mais alguma coisa e, para quem ainda tivesses dúvidas, e é um organismo insuspeito que o afirma: “dois dos aspectos mais afectados pelas medidas de (pretensa) contenção contra a pandemia foram a liberdade de expressão e a integridade dos 'media' e 43% das democracias aplicaram medidas de combate contra a crise sanitária que prejudicaram valores políticos e cívicos essenciais. E ainda mais: “Tribunal de Almeida diz ser impossível punir infectados que tenham saído de casa durante o primeiro estado de emergência, com a juíza do Tribunal de Almeida a subscrever o entendimento do acórdão da Relação de Guimarães de que o Governo exorbitou as suas competências ao criar um novo tipo de crime e que este é inconstitucional”. Ou como Costa está a seguir os passos do seu antecessor João Franco que, ao governar por decreto, instituiu em Portugal o que ficou conhecido por “ditadura franquista” (1906-1908) e que levou ao regicídio e à queda da monarquia. É que, embora não pareça, a História repete-se.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Costa telefona a Lagarde

 

Elliott Erwitt

Durante a aprovação do Orçamento de Estado para 2021 e à medida que eram aprovadas algumas das propostas apresentadas pelos partidos da dita oposição, as reacções do ministro das Finanças/cativações de nome Leão não se fizeram esperar, fazendo soar os alarmes devido aos “custos” crescentes para as contas públicas, mais de “20 milhões de euros” por 21 propostas aprovadas por “coligações negativas”. A seguir foram as reduções das portagens das SCUT's que poderão acrescentar mais “100 milhões”, ou 1000 milhões durante todo o período de concessão. E, para cúmulo dos cúmulos”, o BE, numa de esquerda, vê aprovada a proposta de não transferência dos 476,6 milhões de euros do Fundo de Resolução para o Novo Banco. E, ainda por cima, com os votos favoráveis do PSD, então, sim, é que foi o alarme total. Mais uma coligação negativa que fez com que Costa, arrepelando os cabelos, tivesse de imediato telefonado à “mãezinha”, Christine Lagarde, a fim de garantir que Portugal, ou seja, o governo PS/Costa irá cumprir rigorosamente o contrato do Novo Banco. É que com o grande capital financeiro, em geral, e o BCE, em particular, não se pode brincar. Que se brinque com os portugueses, desrespeitando o contrato social dos direitos, garantias e liberdades do povo ainda vá lá, com Bruxelas e com a Alemanha é que não!

Este episódios de aprovação do OE-2021, com a abstenção vigorosa do PCP – que até é “parte da oposição e não da maioria governamental”, diz o palerma do Jerónimo – e do telefonema à patroa pelo Costa até seriam irónicos se não se tratasse de questões extremamente sérias para os trabalhadores deste país. Estamos perante encenações, quanto à aprovação do OE, e de mais abjecta subserviência por parte de um governo que se presumia ser de um país soberano, mas não, o Costa e os seus capangas não passam dos lacaios que, nomeados e não eleitos, ainda vão dando conta dos negócios do länder situado na ponta mais ocidental do Reich.

O Orçamento não deixará de ser o que sempre foi: a distribuição do produto do saque da riqueza produzida pelos trabalhadores pelos diversos sectores da burguesia indígena, cada vez mais rentista e inútil, que alguma vez existiu por estas bandas, e cujo patriotismo está na conta bancária, e do pagamento do tributo ao grande capital financeiro, através do pagamento da dívida soberana, esta, por sua vez, cada vez mais impagável.

O Orçamento de Estado para 2021, mesmo de um ponto capitalista, não é um considerado “orçamento expansionista” devido ao fraco aumento do investimento público, será o orçamento que irá necessitar de um orçamento rectificativo, e de onde sairá o dinheiro para o Novo Banco e para a salvação de outras empresas do grande capital, somando-se aos diversos sacos azuis no montante de muitos milhões de euros. As poucas e magras migalhas, de que o BE e o PCP se possam agora gabar de ter conquistado para benefício de quem trabalha, serão facilmente comidas por outras vias, desde a inflação, desvalorização real do salário, à retirada de outros direitos, nomeadamente parte nominal dos salários sempre com a justificação da pandemia.

O OE-2021 será o orçamento do desemprego e da miséria dos trabalhadores, com as “falências massivas” e os “despedimentos massivos” já anunciados, não sendo por acaso que o governo entendeu proibir os cortes de de água, luz, gás e comunicações durante o primeiro semestre de 2021, porque sabe que este período irá ser mais complicado, não sabendo bem se o dinheiro da bazuca virá ou não e se será suficiente para mitigar a vaga de mais desemprego, mais fome e privações, todas elas bem piores que a putativa segunda vaga do SARS-CoV-02. Será o orçamento que irá aumentar a dependência do país em relação aos países mais ricos da Europa, com a destruição de parte do nosso já debilitado tecido produtivo, com a proletarização forçada, que iria sempre acontecer mas de forma mais lenta e gradual em situação normal do desenvolvimento capitalista, da pequeno-burguesia que ficará sem perspectivas, nem a mudança de actividade nem o escape da emigração.

A conflitualidade social irá surgir e aumentar rapidamente, não restará outra alternativa para essas pessoas descartadas pelo capitalismo senão juntarem-se aos operários e outros trabalhadores para a mudança da economia e do regime político pela revolução comunista - não haverá outra via. Costa com o seu telefonema à presidente do BCE, mostra à evidência que o dito “Estado de direito que cumpre as suas obrigações contratuais” é um estado que não é pessoa de bem e que não cumpre as suas obrigações para com o povo português, e, mais ainda, não respeita as decisões do órgão de soberania, a Assembleia da República, o órgão máximo de poder da democracia, consagrado pela Constituição da República.

Enquanto que o Costa prometia lealdade ao BCE e ao grande capital financeiro internacional (Lone Star/Novo Banco), o PR monárquico Marcelo completava a ronda de reuniões com os grupos farmacêuticos, Pfizer, Moderna e Gilead Sciences, ou seja, com o grande capital americano, com o objectivo, presume-se, de conhecer a viabilidade das vacinas criadas à pressão por estes gigantes dos negócios multimilionários e todos eles com vários e escabrosos casos de corrupção a médicos e governos no curriculum. Marcelo gosta muito, e a imprensa vai-lhe ao jeito, de se arvorar em governante ou como se o regime fosse presidencialista ou, tão do seu agrado, uma monarquia absoluta, coisa que ele não enjeitaria de todo. E será para aí que se dirigem estes estados de emergência consecutivos e que tenderão a ficar depois do coronavírus se ir embora, tal como os outros vírus, seja com ou sem vacina. Mais do que Dupont e Dupond, estamos a lidar com dois reaccionários, verdadeiros Migueis de Vasconcelos, que afivelaram à pressa e de maneira desajeitada a máscara de democratas, mas que a não conseguem manter por muito mais tempo e é com particular dificuldade que vão aguentando a farsa.

Ainda sobre o Novo Banco, não deixa de ser curioso ouvir os comentários dos seus responsáveis, respirando confiança por todos os poros, que o tal contrato assinado com o governo português e a mando de Bruxelas (a resolução do BES terá sido experiência inédita e para ser replicada, no sentido de recapitalizar a banca falida, e com os acionistas ainda mais ricos) será mesmo para cumprir, mandando este regime de democracia de opereta para as urtigas. Processo idêntico estará a passar-se com a dita “transportadora aérea nacional”, que irá ser limpa de dívidas e reduzida ao mínimo, isenta de “gorduras”, quer em trabalhadores, cerca de dois mil irão em breve ser despedidos, quer com a redução de salários, que os sindicatos calculam poder ir até aos 25%, mas sem que nada façam para o impedir, para ser entregue ao grande capital que – apostamos! – será o alemão, mais concretamente à Lufthansa. E depois dos accionistas privados terem já embolsado grossa quantia e saído a rirem-se, mais uma vez, na cara dos cidadãos portugueses. É sempre o fluir da riqueza do trabalho para o capital, com o governo PS/Costa como o artista ainda em cena.

Christine Lagarde, quando ainda directora do FMI, ficou famosa por ter dito: "Os idosos vivem demasiado e isso é um risco para a economia global! Há que tomar medidas urgentes". E as medidas eram, e ainda são, aumento da idade para a aposentação, privatização da Segurança Social, como forma de garantir o eterno processo de acumulação do capital. A terceira tentativa de criação de uma pandemia terá saído desta vez bem, as outras foram a gripe das aves e a gripe suína, tendo como certo o negócio das vacinas que, com a Covid-19, irão prosseguir com o trabalho sugerido pela madrinha do Costa: a morte prematura dos nossos “improdutivos” idosos. E é a imprensa do regime que o confirma: “Covid-19: um quarto das mortes em lares ocorreu em Novembro. Há mais de quatro mil casos activos de covid-19 em lares portugueses e 1409 mortes até à data”. Os responsáveis dos lares, que se vão governando com o negócio já que a clientela não tem faltado até agora, queixam-se de falta de funcionários, à espera que o governo lhes resolva este problema sem que terem de abrir os cordões à bolsa. Simultaneamente, a DECO alertou para “a deterioração da qualidade de vida de idosos em lares”, para “o tempo de espera por vagas, valor incomportável dos lares para os idosos e deterioração da sua qualidade de vida e saúde durante a pandemia de covid-19”. É a política de eugenia tão de agrado do nazismo. Ninguém se admire que o Costa, presumivelmente depois de ter recebido telefonema da führer Merkel, tenha ordenado à representação portuguesa na ONU o boicote da aprovação da Resolução que condenava a glorificação do nazismo, agora em ascensão na Europa e no mundo, juntamente com as representações dos restantes países da UE.

O Orçamento para 2021 é o orçamento em que as despesas para o SNS serão inferiores à despesa total prevista em 1089 milhões de euros; e, segundo contas feitas pelo economista Eugénio Rosa, os saldos negativos somados dos 11 anos constantes obtém-se o impressionante montante de -12 467 milhões de euros. E mais: “entre 2020 e 2021, as transferências do OE para o SNS aumentarão apenas 134 milhões de euros (+1,3%) e não 467,8 milhões de euros como o Governo refere na sua propaganda”. Estes valores “mostram de uma forma clara, a política de estrangulamento financeiro a que os sucessivos governos têm sujeito e continuam a sujeitar o SNS” e “o financiamento do SNS pelo Orçamento do Estado tem representado apenas entre 86,1% e 92,1% da despesa total do SNS”. É mais do que evidente que, e ao contrário do que o governo apregoa, a política seguida em relação ao SNS é para este ser “estrangulado no seu funcionamento diário, impedindo qualquer gestão racional, eficiente e responsável”. Como se tem verificado ultimamente e à conta da pandemia, os doentes não covid estão a ser enviados para o sector privado, fazendo com que o SNS continue, e cada vez mais, “uma fonte enorme de negócio e de lucro para o setor privado”. O que se reflecte no Orçamento de 2021, como já acontecia com o Orçamento de 2020, com 56,7% do orçamento do SNS (6412 milhões) “é utilizado para aquisição de bens e serviços a empresas privadas (na ADSE são 550 milhões de euros para privados sendo criticada por isso)”, enquanto “a parcela destinada aos profissionais de saúde (42,6% do total da despesa corrente) é muito menor (4841 milhões de euros)”, acrescentando-se ainda que “o investimento no SNS em equipamentos e outros bens de capital tem sido mínimo, mesmo ridículo”: em 2019, representou “apenas” 1,46% da despesa total; em 2020, 2,2% de despesa, e, em 2021, apenas 2,5% da despesa total do SNS. Ou como o Costa, contrariamente ao que diz a Lagarde, não garante o escrupuloso cumprimento dos compromissos assumidos para com o povo português.

A política em relação aos idosos ficou bem definida pela famosa frase de Lagarde, mas a escola possui muitos seguidores em todo o lado do mundo capitalista e Portugal não é excepção: em 2012, a ex-dirigente do PSD e ex-ministra das Finanças Ferreira Leite deu nas vistas opinando que os doentes com mais de 70 anos que necessitassem de tratamentos de hemodiálise os deviam pagar, porque “tem sempre direito de pagar”, ou seja, eram uma despesa acrescida ao sistema da segurança social e ao estado. Parecendo que fez escola no partido, mais tarde o deputado Peixoto, em artigo de opinião e apesar de o ter negado quando questionado pelo Costa em plenário da Assembleia da República, verberou contra a “peste grisalha”. Costa, na altura, indignou-se com a falta de humanidade do deputado, invetivando o chefe da bancada laranja por "se senta(r) ao lado de quem disse que os nossos idosos, que os nossos pensionistas eram a peste grisalha do nosso país". Agora, Costa telefona a Lagarde a jurar fidelidade: “ Portugal é um Estado de direito que cumpre as suas obrigações contratuais”, mas não com os nossos idosos que vao morrendo nos depósitos-de-espera-da-morte.

Se o governo nada fez durante o Verão, antes da propalada segunda vaga pandémica, quanto à protecção dos nossos idosos encafuados em lares à espera da morte, quanto à melhoria das sua condições de alojamento, alimentação, higiene e prestação de cuidados por equipas efectivas de enfermeiros e de auxiliares devidamente formados, porque espera pelo milagre das vacinas. No entanto, estas, atendendo à falta de tempo para testar a sua eficácia e segurança, irão (seria bom que nos enganássemos!) completar o trabalho da rasoira dos lares, muitos deles ironicamente pertencentes ou geridos pela Santa Casa da Misericórdia, que de “santa” e de “misericórdia” pouco ou nada terá. Na segunda tentativa de criação pandémica, gripe A (H1N1), os medicamentos revelaram-se ineficazes (Timaflu) e as vacinas, em muitos casos, com efeitos colaterais perigosos, desde provocação da própria doença, perturbações neurológicas graves, devido ao aditivo exacerbador da reacção imunológica, ao surgimento de formas de autismo em crianças, casos pouco referenciados pela inefável imprensa corporativa. Nesta terceira criação pandémica, outras já estarão prometidas pelo incontornável Bill Gates, a situação não será diferente: o Remdesivir não será melhor que a vigarice do Tamiflu e as vacinas terão efeitos igualmente perigosos, não terá sido por acaso que o o lobby Vaccines Europe (grupo especializado em vacinas da Federação Europeia das Indústrias e Associações Farmacêuticas) pressionou a Comissão Europeia para que haja “isenção de responsabilidade civil”, porque os “riscos são inevitáveis”, tendo em conta “a rapidez com que se tenta produzir uma vacina contra o novo coronavírus”. E o Vaccines Europe foi ainda mais longe: a Comissão diz que está a preparar disposições para que os 27 Estados-membros indemnizem as empresas por “determinadas responsabilidades” relacionadas com os acordos de compra antecipada, de forma a “compensar os riscos tão elevados assumidos pelos fabricantes”. Fica claro que a Comissão Europeia é um órgão de gestão dos negócios do grande capital a nível da União Europeia: para além de comprar milhões de vacinas de eficácia duvidosa, ainda se compromete a isentar as farmacêuticas de responsabilidades se as coisas correrem mal e até a indemnizá-las em caso de quebra de contrato.

Ora, basta descer na escala hierárquica para se ficar a saber qual o papel do Costa e do PS, partido criado com os dinheiros da social-democracia alemã, cujo objectivo era enfiar Portugal na então CEE e que teve um papel relevante no combate à revolução que se chegou a esboçar em 1974 e 1975 (incorrectamente designada PREC, porque o objectivo não era uma mera mudança de partidos ou de figurões no poder, mas erigir um mundo novo nas mãos dos que trabalham), e ao serviço não só do imperialismo norte-americano, mas ao serviço das ambições hegemónicas de uma Alemanha emergente. É o papel de lacaios menores, mas nem por isso menos abjectos. E se a UE já contratou vacinas no montante que poderá ultrapassar os 10 mil milhões de euros, o governo não ficará somente pelos 16 milhões de vacinas, que irão rondar os 300 milhões de euros se não mais, e prepara-se para intimidar o povo para a vacinação em massa, seguindo a orientação de Christa Schweng, presidente do CESE (Comité Económico e Social Europeu), órgão meramente consultivo, que admitiu a possibilidade de uma empresa se negar a contratar um trabalhador que se recuse a ser vacinado contra a Covid-19, e que de conselho depressa passará a directiva obrigatória, porque o negócio não se pode perder e para não acontecer o mesmo com a gripe A em que mais de metade das vacinas ficou por administrar.

O presidente/rei Marcelo já há algum tempo que deixara a ameaça, como esboço mal amanhado de Sidónio à civil (para quem não saiba, Marcelo fugiu à tropa para não ir p'ra guerra), de que haverá estado de emergência no Natal e, como bom vidente que é, conseguiu ver nas cartas uma terceira vaga pandémica entre Janeiro e Fevereiro, daí não se poder facilitar em Dezembro. Ora, o homem, que parece ter mais medo do que aqueles que quer atemorizar, está mais preocupado é com a sua reeleição e com uma possível crise política, como reflexo da revolta social que se poderá estar a fermentar e que, por todo o ano de 2021, poderá explodir. O futuro, mesmo o mais próximo, é incerto, na justa medida em que a velha toupeira nunca deixou de fazer o seu trabalho e, com medo da revolução comunista, se percebe a pressa de se vacinar em massa os trabalhadores, transformando-os em zombis e mantendo-os no redil do medo e do estado de excepção, uma estratégia que irá ter como resultado o inverso do desejado.

Costa telefonou a Lagarde porque está à rasca: ou cumpre as ordens dos amos ou é descartado, tal como está a fazer com os nossos idosos. Em qualquer das hipóteses, o homenzinho já está descartado, e a seguir irão todos os partidos que, incluindo os por omissão, deixaram que o OE-20121 tenha sido aprovado. Como já afirmáramos em artigo anterior, estamos em fim de ciclo.

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

O estado de emergência, o OE-2021 e os negócios à conta da pandemia

A Assembleia da República acaba de aprovar o quinto estado de emergência, mais propriamente estado de excepção, desde o início da propalada pandemia, que vai endurecer as medidas restritivas e atentatórias das liberdades, direitos e garantias dos cidadão, alegando a defesa da vida dos mesmos cidadãos, que, contraditoriamente, vêm o direito aos cuidados de saúde mais restringido com o encerramento das cirurgias e consultas nas instituições do SNS. Se os números de infecções e de mortes pelo SARS-CoV-02 não cessa, então o número de mortes por outras doenças que não tratadas pelo SNS aumentam no valor triplo das primeiras. Então, os números mostram que a preocupação do governo será mais a economia do que propriamente a saúde, ou a vida, dos portugueses em geral, e Centeno não consegue impedir que a boca lhe fuja para a verdade: “são necessárias medidas de fortalecimento do capital das empresas, para reduzir a alavancagem e aumentar a sua capacidade de serviço da dívida” e “uma utilização eficiente dos fundos públicos exige o estabelecimento de procedimentos que permitam uma identificação efectiva das empresas viáveis, que devem ser as receptoras privilegiadas destes apoios”.

Ora, as palavras do governador do Banco de Portugal, agência local do Banco Central Europeu, que é quem na realidade dita as leis na União Europeia para cada estado obedecer, devem ser trocadas por miúdos: o país tem capacidade de produção a mais, há que seleccionar as empresas “viáveis” através do financiamento bancário; há que garantir a sustentabilidade da banca, que é quem se encontra no topo do sistema económico e que no final da linha arrecada o maior quinhão dos lucros; há que respeitar as obrigações impostas pela dívida, seja ela pública e privada, qualquer uma delas não se cansa de crescer, e as dívidas são para ser pagas, já que são os bancos as principais entidades credoras, com o BCE a controlar as operações; uma “boa utilização dos fundos públicos” é necessária para recapitalizar as empresas que o devem ser mas na óptica de Bruxelas, não numa perspectiva de soberania económica – uma economia baseada na agricultura e com a indústria como elemento orientador para a satisfação das necessidades do povo português será impossível no quadro de uma UE e com a agravante de não se possuir autonomia monetária. Centeno parece manter ainda o papel de ministro das Finanças, senão mesmo de primeiro-ministro, ou mais ainda, é o BCE a dar as directivas pela sua boca – os alunos até são aplicados, o esboço do OE-2021 já foi aprovado por Bruxelas.

O estado de emergência ou de excepção veio para ficar e não se quedará pelo tempo de pandemia viral, porque a seguir virá a pandemia da contestação social, a mais perigosa e preocupante para as nossas elites, que aquele pretende esconjurar ou prevenir, mas que conduzirá forçosamente a um efeito perverso: a contestação social, a revolta popular será inevitável e em forma mais violenta – o remédio acabará por exacerbar a doença. Pelo aumento rápido do desemprego, também inevitável pela falência das empresas que estão a mais, na sua maioria pequenas e médias empresas que pouco ou nada irão beneficiar dos fundos públicos, onde se incluem milhares de pequenas empresas ligadas ao turismo e ao comércio, outras de sectores de actividade não produtiva, mas essencialmente no sector industrial, tornando o país ainda mais dependente perante a UE, dos países do centro, os mais industrializados e que irão resolver a crise à custa dos países periféricos. A pandemia mais grave será a pandemia da destruição de enormes forças produtivas, incluindo a mais importante de todas, a força humana. A guerra existe, não exactamente a do vírus, mas sim a guerra do capital contra o trabalho, desvalorizando e destruindo este último. A riqueza que agora se produz é demasiada para ser contida no quadro do capitalismo, outra sociedade sob o comando dos que trabalham se tem de criar.

Uma das razões para fundamentar a restrição de circulação dos cidadãos e de reuniões alargadas em família, estando por isso o Natal em risco, como anunciou com pompa e circunstância o beato e monárquico PR Marcelo, era o número de 68% dos contágios acontecerem dentro da família, Costa bem salientou em habitual conferência de imprensa com papel na mão; ora, ficou-se a saber na reunião do Infarmed, que 80% do total de infecções têm origem desconhecida; assim, será 68% de 20%, o que dá uns míseros 13,6%, e só 2% das infecções terão origem em restaurantes. Como se comprova, os números apresentados pelo governo e pela sua inefável directora geral da Saúde são enganosos, como já tinha sido denunciado pela equipa de investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto que foram claros: os dados que têm sido fornecidas à comunidade científica, nos últimos meses, sobre os casos de covid-19, “têm uma qualidade baixa, erros, inconsistências e muita informação em falta”. É na base da mentira e da manipulação para incutir o medo que Costa+Marcelo+Parlamento têm confinado os cidadãos portugueses com o objectivo de implementar as medidas económicas para a reconversão da economia, que serão sempre mais austeridade para o povo.

A partir de Janeiro as medidas de austeridade serão a dobrar e o OE, em aprovação na especialidade, será somente o reportório dessa austeridade embora disfarçada em “relançamento da economia”, que será sempre em termos de capitalismo com menos emprego, salários mais baixos e jornadas de trabalho mais elevadas e penosas – sempre assim foi ao longo da história do capitalismo. Os partidos que aprovarem o OE para 2021 são cúmplices no agravamento inaudito da miséria dos trabalhadores e do empobrecimento do povo português em geral. Esta realidade está bem visível, não sendo necessária a carta dirigida ao ministro das Finanças e subscrita por algumas figuras conhecidas do regime, a fim de esclarecer os milhares de milhões de euros em “compromissos sem suficiente fundamentação”, por exemplo, 9.813,5 milhões em ‘despesas excepcionais’ (10% da despesa pública anual prevista em 2021 e um acréscimo de mais de 40% relativamente ao ano de 2020), ou 4.911,3 milhões de euros para empréstimos concedidos pelo Estado (mais 280% nos empréstimos a médio e longo prazo), ou 2.245,2 milhões de euros previstos em participações de capital em empresas privadas (+41% em relação a 2020), ou 852,5 milhões de euros para o Fundo de Resolução Europeu da Banca (+22%). No OE para 2021 não haverá mais dinheiro para o aumento do investimento público nem para a contratação de mais profissionais de saúde, ou para o aumento dos salários dos trabalhadores da administração pública que, por sua vez, seria um empurrão para a subida dos salários dos trabalhadores do sector privado, nivelando todos os salários por cima, ou para acabar com os trabalhadores precários no estado, ou mais dinheiro para o SNS ou Educação ou Segurança Social, já que o desemprego irá ser incontrolável. Ou como o governo PS, com os dinheiros públicos, recapitaliza a economia nacional (capitalista) para que a burguesia não veja os seus lucros a diminuir, ou seja, se mantenha a incessante acumulação do capital.

O tempo de pandemia covideira tem sido boa oportunidade para a proliferação de bons negócios, a par dos financiamentos do estado, para as diversas grandes empresas, cujos accionistas não possuem os mínimos pruridos de distribuir entre si os muitos milhões em dividendos enquanto os trabalhadores vão sendo despedidos ou com os magros salários cortados em elevada percentagem. E os exemplos são vários, para além das empresas cotadas em bolsa e com sede na Holanda, temos uma Navigator que, depois de ter recorrido ao lay-off para 1200 trabalhadores, uma excelente recapitalização com os dinheiros da Segurança Social, e apesar de ter tido lucros de 168,3 milhões de euros em 2019, distribuiu aos accionistas 99,14 milhões de euros; Altice, que recorreu ao lay-off para 612 trabalhadores, despediu trabalhadores precários, quer congelar salários para 2020 e agora até pede apoio do estado para instalação da rede 5G, apesar de ter obtido lucros de 210 milhões de euros no ano passado; a Sumol+Compal vai iniciar um processo de despedimento colectivo, 80 trabalhadores, depois de ter colocado em lay-off 40% dos seus 1200 trabalhadores, alegando “dificuldades provocadas pela crise pandémica”; o grupo Global Media, detentor de órgãos de imprensa JN, DN, TSF e Jogo, entre outros, quer despedir 81 trabalhadores, um despedimento colectivo, para reduzir 7,8 milhões de euros em despesas de salários, depois de ter recebido do governo PS 1.064.901,66 euros para compra de publicidade institucional, o quer dizer na prática para fazer publicidade às políticas do governo, principalmente no que concerne às medidas de pretenso combate à doença covid-19. E o número não acaba de empresas que depois de terem sido recapitalizadas, vão despedindo e esperam possivelmente por mais fundos públicos... porque são viáveis. Conhecendo os factos, melhor podemos entender a real motivação das medidas de combate à pandemia e para que serve na realidade os estados de emergência e o OE para 2021. Tudo se liga e se inter-relaciona.

O governo PS ao mesmo tempo que vai despedindo enfermeiros, embora diga que nem sequer os vai deixar sair do SNS, prepara-se para dar mais de 200 milhões por vacinas que ainda não tiveram tempo para se comprovar que são seguras e eficazes e continua na compra de um medicamento comprovadamente ineficaz, o Remdesivir, onde já terão sido gastos 35 milhões de euros, uma forma pouco hábil de enriquecimento dos grandes grupos farmacêuticos internacionais, conhecidos pelos seus processos pouco limpos de aliciar médicos, cientistas e governantes para o bom prosseguimento dos seus mais que chorudos negócios. A pandemia do covid-19, feita à medida e depois da pandemia da gripe suína ter falhado há 10 anos, marcará a reorganização e a desejada revitalização da economia capitalista, onde nenhum sector de actividade humana ficará de fora, nomeadamente o sector da saúde, onde os privados tentarão sempre ter o melhor quinhão – neste momento as empresas privadas da saúde já terão garantido umas centenas largas de milhões de euros – e com os responsáveis do negócio da doença a reclamar que “a saúde também tem de ser tutelada pelo ministério da Economia” – presidente do Health Cluster dixit.

O governo está cada vez mais isolado, e sabe disso. As sondagens, descontando o que possam incluir de imprecisão ou até de manipulação, revelam que os portugueses estão cada vez mais desiludidos com as políticas do governo em relação à pandemia, porque se em Março eram 25%, agora, são 50% os inquiridos que consideram as medidas do Governo pouco ou nada adequadas; 35% dos inquiridos declaram que nem sempre usam a máscara em grupos de 1o ou mais pessoas; e, mais grave, 20% das pessoas que disseram necessitar de uma consulta, nas últimas duas semanas, não a tiveram porque decidiram não ir ou foi desmarcada, e cerca de 40% de pessoas evitaram marcar ou adiaram cuidados de saúde não urgentes por receio de contrair covid-19; também é grande o impacto na saúde mental, com mais de 20% a dizer que se sentem agitadas, tristes ou ansiosas todos os dias ou quase todos os dias. – dados do estudo Barómetro covid-19 Opinião Social, que inquiriu 182.581 pessoas desde Março.

A renovação do estado de excepção foi aprovada com os votos favoráveis de PS e PSD, com apenas 187 votos; desta vez até o CDS, que tinha aprovado o anterior, se absteve, e o Chega a mudar o voto de abstenção para contra; o PCP, escaldado com os resultados eleitorais nos Açores, já não tinha chegado o mau resultado na legislativas, parece que não tem meio de aprender, votou contra; e o BE, no seu crónico oportunismo, absteve-se com a ideia peregrina de alguma vez vir a ser governo. Este resultado mostra que o PS se encontra cada vez mais só e que a votação para o OE-2021 não será muito diferente. A gestão da pandemia e a aprovação do OE, bem como toda a governação dos últimos tempos, irão ter um efeito de desgaste enorme quer no PS quer no PSD. Ao mesmo tempo que a burguesia tenta a reestruturação da sua economia assente no extorquir acelerado e extremo da mais valia produzida pelos operários, irá mais dia menos dia reorganizar o seu quadro partidário, e os partidos que surgiram no pós-25 de Abril estão a dar as últimas, em termos internos, e, a nível internacional, a UE é um cadáver adiado e o sol do capitalismo mundial está a virar para leste. Encontramo-nos em fim de ciclo. E daqui para a frente tudo estará em aberto, incluindo no campo do proletariado e da revolução comunista.

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

A Economia em estado comatoso, o fascismo brando e o PS em fim de linha

 

João Abel Manta 

O alarme, o medo, o estado de emergência, com a mentira e a manipulação
pelo meio, têm sido a estratégia do governo PS/Costa neste segundo mandato para impôr uma segunda vaga de austeridade, agora em dose maciça. Para atingir o objectivo há que amedrontar o povo e os trabalhadores e atirar com a responsabilidade para uma falsa pandemia, por sua vez, amplificada por uma imprensa subserviente, paga por muitos milhões de euros através de contratos de publicidade institucional e que agora, em final de Novembro, serão renovados, para continuar a propagar a mentira e induzir o medo. A declaração de estado de emergência, com o apoio servil da Assembleia da República, cada vez mais secundarizada para o papel de caixa de ressonância do executivo, e sob o alto patrocínio do PR Marcelo, que em segundo mandato irá mostrar os dentes, tal como o faz presentemente o Costa, e a explicitação em reunião extraordinária de ministros das medidas concretas que enformam a situação de suspensão de algumas liberdade e direitos dos cidadãos foram antecedidas, acompanhadas e seguidas por números manipulados e até falsos com um único fito de lançar o pânico e levar à aceitação de uma inevitabilidade, como se a vida de cada português estivesse em causa com uma virose que não mata mais do que qualquer outra patologia de causa infecto-contagiosa já existente em Portugal.

Os números apresentados são para isso mesmo, para aterrorizar, os títulos da imprensa o dizem: “Nunca em Portugal se registaram tantos casos em 24 horas: mais 5.550 infetados, a maioria no Norte (3.006)“ (DN, 06), “Pico de 6500 casos por dia de covid-19 esperado para o fim de Novembro” (JN, 07), “COVID-19: Portugal com novo recorde de óbitos. Mais 63 mortes e 4.096 infetados em 24 horas” (DN, 09), “Portugal ultrapassa as 3 mil mortes, com mais 62 nas últimas 24 horas” (DN,11), contudo a imprensa passa ao de leve ou não fala de todo que se em Março se começou a testar 800 pessoas se passou em Novembro (dia 05) a testar mais de 40 mil por dia, o que prova que a letalidade é pequena (1,7%), mas o medo devido ao matraquear constante dos números fica. Números que afinal até serão falsos, como denunciam os 12 investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto em estudo publicado que aponta que os dados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE) que têm sido fornecidas à comunidade científica, nos últimos meses, sobre os casos de Covid-19, “têm uma qualidade baixa, erros, inconsistências e muita informação em falta”, onde são encontrados “casos de um doente com 134 anos e três homens classificados como 'grávidos', bem como 19 doentes que supostamente teriam tido a doença antes do primeiro caso que se sabe que foi diagnosticado em Portugal”, colocando por terra a fiabilidade de todos os dados. O governo pode mentir uma vez e mais vezes, mas não conseguirá mentir sempre de molde a continuar com a intimidação, os factos são a contraprova da mentira e o povo mais cedo ou mais tarde abrirá os olhos e enviará o PS para o sítio onde já deveria estar, a história do lixo político.

A economia nacional encontra-se em estado comatoso

Por que é que o governo do Costa e do PS se encarniça na mentira e decretou o estado de emergência, não foi para “controlar e reprimir a pandemia” ou “apoiar os profissionais de saúde”, como Costa não se cansa de afirmar? Por uma simples razão, é que a economia nacional se encontra em estado comatoso, se em 2010 eram os bancos que se encontravam à beira da falência, agora são as empresas em geral que vêem os lucros a estagnar, muitas delas estão descapitalizadas e com o mercado a não conseguir consumir o excesso de produção do capitalismo devido à diminuição dos rendimentos dos trabalhadores – uma das contradições do capitalismo. As medidas que irão ser aplicadas daqui para frente, na continuidades das que foram no quadro do primeiro estado de emergência, serão para salvar as grandes empresas, os grandes capitalistas e patrões, não os pequenos e mesmo médios, como diz Costa: “"as medidas... não são alternativas ao layoff, somam-se ao layoff", reforçando que "o layoff continua a existir, quer o geral como a medida de apoio à retoma que substituiu o layoff simplificado", e já foram 1.550 milhões de euros, para além da “bazuca” que já está a caminho, são 750 milhões em subsídios a fundo perdido para as ditas “micro e pequenas empresas” que apresentem uma quebra de facturação de pelo menos 25% nos primeiros nove meses deste ano. Ora, iremos ver muitas empresas a apresentar subfacturação sem necessitar de ajudas e outras já com a corda ao pescoço a falirem inapelavelmente. Costa não acredita que seja possível "impedir a insolvência de todas as empresas" e assim estaria a pensar, já depois do estado de emergência em vigor e com o seu ar de hipócrita crónico, nas medidas mais adequadas, que irão sobretudo para os grandes hoteleiros e cadeias de restauração... um dia destes quem quiser tomar uma refeição pouco mais terá para além de um McDonald's ou de um Burger King e em centros comerciais. O pequeno comércio de rua terá desaparecido por força da prisão domiciliária dos portugueses , e em especial aos fins de semana!

Não será só o pequeno comércio ligado ao turismo, mas serão todas as pequenas e empresas que terão de fechar, no processo pandémica acelerado da concentração do capital, e é entidade insuspeita, agência Moody's, que o revela de forma insofismável: “Portugal é dos países que poderá ter maior destruição económica”. E em função disso, e não só, será um dos países que terá mais dificuldade em sair da crise económica e se alguma vez o conseguir fazer, porque economia dependente e subsidiária dentro da UE, onde faz 70% das suas trocas comerciais. E, mais importante ainda, a dívida pública que irá subir para os 135,1% do PIB, segundo perspectiva da Comissão Europeia, acima dos 134,8% previstos pelo Governo no OE 2021 – uma dívida cada vez mais impagável. E não será apenas Portugal, como todos os países do sul, Grécia e Itália, a que se pode acrescentar Espanha, com a maior quebra do PIB neste momento, devido ao grande número de pequenas empresas e, por essa razão, “de reduzida dimensão, possuem menores alternativas de financiamento e menores horizontes”. Uma perspectiva de uma situação que, segundo o relatório “Perpectivas Mundiais dos Soberanos (estados)”, que se irá estender por 12 a 18 meses. Será ainda mais grave no nosso país porque não há indústria nem o país se poderá reindustrializar no quadro da União Europeia, como a emigração, escape para a mão-de-obra excedentária, se encontra bloqueada na justa medida em que os países mais ricos e industriais, Alemanha e França, ou tradicionais destinos da emigração portuguesa, se encontram igualmente em crise (o Reino Unido já não faz parte da UE) e as suas necessidades de mão-de-obra barata e dócil já foram supridas pela imigração de refugiados.

Daqui para a frente será mais desemprego e mais miséria
sem que o sistema económico consiga dar solução, já que a reorganização e possível recuperação do capitalismo será sempre com menos mão-de-obra e salários mais baixos, a robotização anunciada, tal como a introdução da máquina a vapor nos primórdios do capitalismo, será feita com mais desemprego (espera-se que um robot faça o trabalho de pelo menos três trabalhadores) e miséria para os trabalhadores, agora para todos e não apenas para os operários, daí a proletarização da pequena-burguesia que vai dando terreno para o medrar dos populismos e da extrema-direita. E os números não metem: a diferença do rendimento médio bruto por agregado entre aquele com maior rendimento (IRS) e o com menor rendimento era, em 2011, de 171 vezes, em 2015 de 174 vezes e, em 2018, era já de 182 vezes; no 4º trimestre de 2019 havia 522.300 desempregados, no 3º trimestre de 2020 são já 655.100, sendo o desemprego é a causa mais importante da pobreza no país; antes da pandemia, 47,5% dos desempregados estavam no limiar da pobreza e a maioria dos desempregados não recebe o subsídio de desemprego porque a lei os exclui; no fim do 3º trimestre de 2020, o teletrabalho já abrangia 681.900 trabalhadores, segundo o INE, e a partir da imposição do segundo estado de emergência com a sua obrigatoriedade, irá disparar, o que significa menos rendimentos para os trabalhadores e mais lucros para os patrões. A pandemia traz mais pobreza e miséria enquanto permite aos ricos ficarem cada vez mais ricos.

A pandemia do medo como distracção

A pandemia do medo tem outra finalidade, além do resultado de justificar a miséria, o de distrair os trabalhadores e o povo de assuntos que neste momento são questões de primordial importância para a sobrevivência de quem trabalha e produz, como é a discussão e aprovação do Orçamento de Estado para 2021. Em artigo anterior já denunciáramos o facto da disputa entre as diversas cliques da classe dominante e outras clientelas dependentes dos dinheiros públicos era o pote não ser suficiente, para mais em tempo de vacas magras, e não é que, sem surpresa para nós, que o incontornável advogado dos negócios e ministro da Economia veio desabafar para a opinião pública que “Ninguém está satisfeito; à mesa do Orçamento, todos acham que é insuficiente aquilo que lhes toca". O homem, para além de verberar que “todos acham que é insuficiente aquilo que lhes toca”, deixa claro que “o Governo tem de gerir aquilo que tem” e será neste cuidado que o governo e o ministro não deixarão de dar às grandes empresas, onde se inclui a banca, o maior quinhão, abrangendo todos aqueles que à mama da pandemia vão enchendo os bolsos: 496 milhões de euros para testes, equipamentos e outros serviços.

Perante a pressão dos lóbis, foi dado como garantido pela ministra da Saúde, e já orçamentado, mais 35 milhões de euros para os hospitais privados pela ocupação de umas, por enquanto, largas centenas de camas para doentes não só covid-19, como para de outras patologias, tendo ordenado o fecho, alegando caso de necessidade, dos serviços do SNS no atendimento dos casos não covid-19, o que irá engrossar as listas já de si enormes para cirurgias, consultas, exames complementares de diagnóstico e outros cuidados de saúde, incluindo os de enfermagem. Não deixa de ser curioso assistir ao perorar de um Marques Mendes, o conhecido recadeiro de Marcelo, na televisão do sócio nº1 do PSD, contra as dificuldade do SNS, já que o homenzinho é responsável máximo de um dos mais importantes grupos económicos privados da saúde, a Lenitudes! No entanto, os cuidados prestados no privado não serão de qualidade e haverá sempre o risco de o sector também estourar como o público, porque a maior parte dos enfermeiros e médicos que ali trabalham ser constituída por funcionários públicos que acumulam os dois lados. É todo o SNS que está a ser degradado e sem haver uma resposta de qualidade e à altura por parte do sector privado ou social, estando aí outros casos a comprová-lo: "desde 29 de outubro foram detetados 64 casos de legionella no norte do país", com 6 mortes, não se conhecendo exactamente qual a fonte do contágio. Outros casos surgirão, o concentrar de meios no pretenso combate à pandemia irá fazer com que outras patologias atinjam números que não existiam até agora, estando aí o número de mortes a mais para o atestar.

A pandemia como meio para endurecer as medidas de controlo e de repressão dos trabalhadores

A pandemia é, a par do espantalho do terrorismo, um bom pretexto para endurecer as medidas de controlo e de repressão dos trabalhadores e do cidadão em geral, é com o recolher obrigatório, ainda circunscrito a 121 concelhos em Portugal, mas que facilmente se prevê que será estendido a todo o território continental, visto que o número de infectados aumentará em proporção ao número de testes diários e de mortes, que poderão atingir as 100 por dia, e não será preciso ser matemático para ver isto, já que não se está a proteger os grupos mais vulneráveis, idosos e doentes crónicos que agora vêm as portas do SNS a fechar, e se testa inclusivamente os mortos suspeitos de terem tido contacto com alguém com teste positivo apesar de não sintomático, chegando-se ao cúmulo de se considerar “paciente assintomático” as pessoas saudáveis.

Mais liberdades, direitos e garantias reprimidas pelo governo a nível interno e mais limitação de entrada de imigrantes é a política que vai prevalecer em todos os estados da UE, e as medidas estão aí a começar por alguns países: o presidente francês Macron anunciou reforço de patrulhas fronteiriças e quer reforma de Schengen e o chefe da diplomacia italiana, Luigi Di Maio, propôs um `Patriot Act` europeu, semelhante à lei antiterrorista nos EUA. Qualquer indivíduo pode ser detido por tempo indeterminado desde que acusado de “terrorismo”, sabendo nós que estes grupos de mercenários foram criados pelos países do Ocidente para fazerem o trabalho sujo das suas forças armadas, como ficou bem provado na Síria. Como se acaba com a democracia, sob pretexto de se querer defender a vida dos cidadãos a nível da saúde e da segurança física! Costa já o afirmou, o estado de emergência poderá ir até ao fim da pandemia, e a Ordem dos Médicos concorda com o estado de emergência. Os portugueses ficarão em prisão domiciliária até quando calhar!

A par da repressão pelo cacete, a repressão sobre aqueles que pensam diferente, independentemente de ser por boas ou más razões, há muito, ainda antes da pandemia, se faz sentir: são os facebook ou twitter que fazem censura sobre as opiniões politicamente incorrectas, estejam mais à esquerda ou mais à direita, ou os artigos de opinião pagos a milhares de euros para descredibilizar quem contesta os dados e o discurso apresentados pelo governo, taxando de nagacionistas e de ignorantes e de outros impropérios mais violentos os que desalinham, ou são as televisões do império que cortam a palavra ao candidato que se pretende derrotado. O dito quarto poder cada vez com mais força para controlar a mente e o comportamento dos cidadãos. São as televisões que anunciam oficialmente o candidato vitorioso, ainda antes da instituição do estado que tem essa missão, são as televisões que vendem um candidato Marcelo que ganha sem precisar de fazer campanha no tempo próprio, são as televisões que lançam o impedimento de presidentes democraticamente eleitos quando deixam de ser convenientes para o sistema, são as televisões que amplificam os números deturpados da DGS, são as televisões de difundam o medo e criam o alarmismo, são as televisões que promovem a bufaria, sendo frequente ver pessoas na rua a olhar desconfiadas para outras que não usam a máscara, ou a telefonar para a polícia porque há um grupo de jovens em alegre farra em casa ou em bar já fora de horas. As televisões, nas mãos de grandes grupos económicos financiados com dinheiros públicos ou públicas dirigidas por ex-deputados e dirigentes do partido da oposição são os olhos do Big Brother. Em Dezembro irão receber outros 15 milhões de euros.

A democracia parlamentar burguesa está suspensa e dará lugar ao fascismo brando

É toda uma política económica de impôr a austeridade sobre os trabalhadores, uma política de repressão e de silenciamento, atentatória dos mais elementares direitos individuais, sobre o povo em geral, políticas impostas por um governo, cingindo-nos agora ao nosso país, por um governo que se diz de esquerda e que fará com que o próximo governo seja um governo aberta e formalmente de direita, aproveitando demagogicamente de uma política que facilmente terá sido identificada de “esquerda”, na medida em que foi aplicada por um governo também dito de “esquerda” e apoiado por toda a esquerda bem comportada do regime, pese toda a desculpabilização pela pandemia. Ninguém se admire que este governo PS/Costa não chegue ao fim de mandato por diversas razões, porque a mentira não dura sempre e Costa será escorraçado pela falsidade e pelo agravamento inaudito das condições de vida do povo português e porque Marcelo já em segundo mandato fará a este governo bem pior que o seu antecessor fez ao governo Sócrates/PS e não descansará de pôr na governação o seu partido e mais uns acrescentos. A democracia parlamentar burguesa está suspensa, dará lugar ao fascismo brando, porque o capitalismo se encontra falido.

Os resultados das eleições para a Assembleia Regional dos Açores marcam o princípio do fim de linha do PS,
porque já deixaram indício do que poderá acontecer no Continente, quando a miséria aqui igualar a miséria no arquipélago, esta agora ainda a vários pontos acima no que concerne a privação material severa, beneficiários do RSI e taxa de desemprego, será uma geringonça de direita, com o ainda principal partido da burguesia nacional a aliar-se com a extrema-direita; extrema-direita essa que apenas teve o trabalho de se mostrar porque sempre esteve lá dentro, desde que o PPD foi fundado. E ninguém se admire com a participação do partido de extrema-direita no governo, que irá sendo entretanto normalizado, quer pelo PR Marcelo quer por toda a imprensa de referência, com o seu dirigente-comentador-desportivo-televisivo a sobraçar alguma pasta mais importante, género Administração Interna ou Defesa. Se isto vier a acontecer, a exemplo do que está a suceder por essa Europa fora, devemos agradecer a um PS, com a sua política de direita a destruir a sua base de apoio, e aos partidos de dita “esquerda”, BE, ansioso em ir para o governo, e PCP, com as suas oportunistas abstenções e votos contras a pensar no próximo acto eleitoral, aplanaram o caminho para o fascismo - como já aconteceu no passado. De nada valerão as lágrimas de crocodilo dos falsos democratas nem os abaixo-assinados-cordões-sanitários... porque é da sobrevivência do capitalismo, e da burguesia, que se trata.

À medida que os campos se extremam, a luta de classes se intensifica, a revolução comunista surge como iminente e necessária.

sexta-feira, 6 de novembro de 2020

A pandemia combatida por dois cabos de esquadra

 

Nápoles, 1960 - Henri Cartier-Bresson

O homem não pára, lembrou-se da aplicação informática para controlar o cidadão, como a coisa falhou, para já, veio com o uso obrigatório da máscara no espaço público por um período de 70 dias revogáveis, a primeira das suas cinco medidas para prevenir a propagação do coronavírus, apesar de se comprovar que a medida por si só é inútil como se mostra pelo aumento incessante do número de infectados na Itália após quase um mês de ter sido imposta a sua obrigatoriedade; a seguir entendeu, e a pedido de vários autarcas locais, outros tantos caciques encartados, alargar o confinamento, que já existia em 3 concelhos do norte do país, a mais 118, abrangendo uma população de cerca de 7,1 milhões de pessoas, depois de ter imposto limitação de circulação de pessoas entre concelhos no período de 30 de Outubro a 3 de Novembro, sempre com a mesma alegação de impedir o alastramento da pandemia, que ameaça poder ir aos 7 ou 8 mil infectados por dia. Agora, para responder aos que criticam que estas medidas do governo são anti-constitucionais e atentatórias das liberdades, direitos e garantias do cidadão, foi conversar com o PR Marcelo para ser declarado o estado de emergência, no seu dizer, “um estado de emergência com natureza preventiva”. Em conversa de família (a entrevista dada na RTP foi mais um monólogo e uma entrevista feita pelo próprio ao jornalista, lembrando o seu saudoso padrinho), Marcelo corroborou que será um estado de emergência para “medidas não muito extensas”, porque a sociedade se encontra “fatigada da pandemia”. Rui Rio concorda com o novo estado de emergência, lamentando que "não possa ser como foi em Março", numa perspectiva de revisão da Constituição, com maioria de dois terços dos votos, porque ter de “ouvir” (como referem os jornais, o Parlamento já não decide) sempre a Assembleia da República para o estado de emergência ser decretado e depois renovado de 15 em 15 dias, é uma grandessíssima chatice!

Em conferência de imprensa, realizada no Palácio da Ajuda, para explicar as medidas restritivas a vigorar a partir de 4 de Novembro, abrangendo quase três quartos da população portuguesa, e que poderão ser rapidamente alargadas a toda a população caso o número de infectados dispare, saliente-se que é número de infectados e não de doentes embora se continue a falar de covid-19 (doença), bastando para isso aumentar o número de testes diários, ouviu-se a provocação de que “se os portugueses estão cansados, imaginem os profissionais de saúde!”. Ficamos a saber que estes profissionais estão cansados porque os portugueses gostam de se infectar e recorrer aos hospitais, inundando enfermarias e unidades de cuidados intensivos. Ficamos também esclarecidos que a maior parte dos contágios acontece não nos transportes públicos apinhados, nas fábricas e empresas sem condições mínimas de trabalho, mas no seio das famílias, daí se pensar em confinamento mais apertado na primeira quinzena de Dezembro para se tentar “salvar o Natal”. Ou como se quer virar trabalhadores da saúde contra o povo, desviando-os do alvo verdadeiro que é o governo e destruir-se a própria família, levando ao isolamento do cidadão para o melhor amedrontar e submeter aos ditames e medidas económicas de austeridade a dobrar. Ao invés do propagandeado, o dever cívico dos portugueses é ajudar os profissionais de saúde a lutar por melhores condições de trabalho, salários dignos e carreiras profissionais que permitam maior desenvolvimento profissional e pessoal. A fadiga de que esta gente fala é a fadiga não da pandemia, mas das medidas desajustadas, que o governo em colaboração com o PR e o ámen do Parlamento tem posto em prática, que poderão levar o povo à revolta.

Antes das provocações do cabo de esquadra que lidera o governo lançadas sobre o povo português e os trabalhadores da saúde, já outro cabo de esquadra, especialista do cacete, e nomeado pelo primeiro para função específica de pôr os portugueses recalcitrantes na devida ordem, já avisara: "(os portugueses) vão ter que cumprir as regras quer queiram quer não". O cabo de esquadra com farda não esteve com modas, esclarecendo que "vivemos uma situação excepcional e em situações excepcionais não se resolvem [as coisas] fazendo como se fazia em situações normais, exigem-se situações excepcionais", ou seja, o cacete está pronto a ser usado, à boa maneira fascista, não importando que as medidas decretadas pelo governo até agora são frontalmente anti-constitucionais, coisa que não interessa de todo ao cabo de esquadra fardado às ordens de outro cabo de esquadra sem farda, sem vergonha e sem escrúpulos. E, para que ninguém ficasse com dúvidas, acabou de esclarecer, em conferência de imprensa como de político se tratasse: "a acção repressiva acontece quando as pessoas não querem nem se deixam sensibilizar... mas há cidadãos que não se deixam ensinar e sensibilizar". Ficamos, com certeza, bem elucidados, as pandemias combatem-se não com planos sanitários, mas com medidas repressivas, para enquanto policiais, mas não demorará muito que a tropa, à semelhança do que acaba de fazer o presidente francês Macron, será colocada na rua. É mais do que evidente que o real e verdadeiro alvo destas medidas não é o combate à covid-19 mas o combate aos trabalhadores e ao povo português - a luta de classes sem disfarces.

A política levada a cabo pelo governo não é exactamente para combater a pandemia da doença covid-19, e esta não é nenhuma teoria da conspiração porque se baseia em factos indesmentíveis e por isso ocultados pela imprensa paga com 15 milhões de euros, mas para permitir uma maior acumulação de capital, o que vai inevitavelmente conduzir à destruição das pequenas formas de economia, sempre com o fim último de maiores lucros para as grandes empresas capitalistas. Não é por acaso que o governo português quis proibir os mercados e feiras ao ar livre ao mesmo tempo que deixava abertos as grandes superfícies de retalho, e foi por pressão popular e do populismo do PR em tempo de campanha eleitoral que fez marcha atrás, ou o governo francês ter proibido a abertura das pequenas livrarias enquanto deixava abertas as grandes loja do sector, como por exemplo a FNAC. Há que facilitar a acumulação dos lucros, sempre a favor do grande capital, e para mais em tempo de crise profunda e prolongada do capitalismo e de reorganização do mesmo. Pelo lado da saúde dos portugueses, esta vem sempre em último lugar, porque se houvesse tão grande preocupação então não se teria deixado degradar e de forma deliberada o SNS. Neste Verão, houve tempo não só para contratar mais pessoal com vínculo efectivo como se tinha aumentado o número de camas, coisa fácil de se fazer visto que nos hospitais centrais há muitas camas vazias e serviços ao abandono, assim como hospitais fechados ou a funcionar a meio gás. Só em Coimbra haverá perto de 500 camas vagas, com pavilhões inteiros fechados no Bloco de Celas e Hospital de Sobral Cid, e enfermarias subaproveitas no Bloco Central, no Hospital dos Covões e Maternidade Bissaya Barreto, isto só no CHUC, ou o Hospital Militar semidesactivado e as antigas instalações do Hospital Pediátrico, ainda com material, tudo ao abandono e à espera da especulação imobiliária, tão da especialidade da câmara socialista e do autarca que mais tem promovido a corrupção e o caos urbanístico em Coimbra.

Se o governo se interessasse minimamente pela saúde do povo português não teria deixado morrer mais 7.525 pessoas por outras patologias que o SNS não tratou por estar centrado quase exclusivamente na covid-19 e não apenas as 2500 falecidas por esta doença, desde 15 de Março até finais de Outubro – uma das piores situações da UE, incluindo países que inicialmente registaram mais mortes no início da pandemia. O governo, embora diga o contrário e é até uma outra medida para justificar o estado de emergência, não pretende requisitar os privados da saúde, mas contratar os seus serviços, para já em termos discretos e graduais, como está a acontecer no norte do país com a ARSN a fazer contratos, cujos contornos são pouco claros e conhecidos, justificando-se com o esgotamento da capacidade de hospitais que em tempo normal sempre estiveram no limite. Para se perguntar, mais uma vez, em que hospitais privados trabalham, acumulando com o público, os responsáveis que fizeram os contratos e que comissões que receberam por debaixo da mesa?

Perante a azáfama de medidas limitadoras das liberdades dos cidadãos e da difusão do medo, assistimos a uma situação que não deixa de ser caricata e irónica: enquanto os partidos ditos de “esquerda” com assento parlamentar defendem, de uma maneira ou outra, estas medidas, colaborando activamente com o governo, os partidos de extrema-direita e de defesa clara e intransigente dos interesses do grande capital e da burguesia mais retrógrada nacional, arvoram-se em defensores dos direitos e das liberdades. Não deixa também de ser curioso assistir a uma ICAR, no que concerne à questão da eutanásia, criticar a casa da democracia por ter chumbado a realização do referendo, querendo assim colocar-se, de igual modo como a extrema-direita, no campo da defesa das liberdades e da democracia, enquanto os deputados, e agora com especial incidência para os que se dizem “comunistas”, são contra o franco e livre debate de ideias no seio da sociedade. E mais ainda, quem ousa contestar as medidas autoritárias do governo é estigmatizado e taxado de “negacionista”, defensor das “teorias da conspiração”, ou seja, os tais que não se deixam ensinar pela polícia, como aponta o cabo de esquadra com farda, ou até de fazerem o jogo da extrema-direita ou de serem mesmo “nazis”, quando surgem as manifestações de rua em Espanha, aqui tão perigosamente perto, em França, na Alemanha ou na Itália, onde estão mobilizados sindicatos e uma grande camada das massas operárias contra o governo. É o mundo às avessas. A confusão, a manipulação e a demagogia promovidas pelo governo não escondem a incapacidade e o medo da nossa burguesia e dos cabos de esquadra de serviço, é que o estado de emergência, que irá ser brevemente instaurado, não poderá ser muito severo não porque a economia não aguenta mas... porque o povo se pode impacientar e revoltar-se. O PS, o tradicional bombeiro da contestação social, um dia destes se esgotará, talvez primeiro que o SNS.

A dita pandemia, que até agora levou desta para melhor cerca de 2.500 cidadãos, na sua grande maioria com mais de 80 anos, nada parecido com a pneumónica de há cem anos que levou cerca de 120 mil pessoas numa população de perto de 6 milhões de habitantes, e que incidiu particularmente em crianças com menos de 2 anos e em jovens entre os 20 e 30 anos, não está a ser combatida com um plano sanitário, mas com medidas de tipo militar para confinamento de toda a população. Em vez de se testar os grupos de risco, está-se a testar a população a eito para inflacionar o número de infectados, que na maioria poderão ser falsos positivos, apesar do número de sintomáticos (os verdadeiramente doentes) ser baixo e com bom diagnóstico, fazendo crer que todos são doentes, confundindo intencionalmente infectados assintomáticos (não doentes) como sendo doentes, coisa jamais vista em outras doenças infecto-contagiosas e nomeadamente viroses. Em vez de se proteger os grupos de risco, concretamente os mais idosos, criando o Estado uma rede nacional e pública de lares, acabando com o negócio dos privados e principalmente com os lares ilegais, estabelecendo regras de habitabilidade e de higiene condignas (condições essas que foram agravadas pelo governo de Passos/Portas devido à autorização do aumento da lotação dos lares, o que valeu uma medalha ao Passos pelas Misericórdias agradecidas pelo fomento do negócio, medida que não foi revertida pelo actual governo do PS), obrigando a programas saudáveis no que respeita à alimentação e actividades ocupacionais e, aqui está o busílis, com rácios adequados de pessoal auxiliar devidamente formado, de enfermeiros a tempo inteiro e de médicos. Para além, como já referido, de robustecer o SNS, com mais pessoal, mais equipamento, mais serviços e reactivação das mais de 3 mil camas que foram encerradas nos últimos 12 anos. Ora, até agora nada disto foi feito, bem pelo contrário, entregou-se a gestão da crise pandémica a dois cabos de esquadra, um com farda, o outro (ainda) desfardado.

A norma daqui para à frente será o estado de emergência, por enquanto “suave” mas que rapidamente se eternizará e se tornará mais violento, será a nova normalidade: em Espanha vigorará até Maio de 2021, em França nos últimos anos tem sido mais o tempo com estado de excepção do que sem ele, vindo da presidência Sarkozy. Em função da grave crise económica sem remissão à vista, mas justificada pela crise pandémica da covid-19, o estado de excepção significa a degenerescência irreversível da democracia burguesa, que já não tem retorno, e cujo resultado será a guerra, ou entre facções das elites que se digladiam ou a revolução comunista, que poderá ser a forma de conjurar a guerra contrarrevolucionária ou uma consequência, nesta hipótese será sempre com maiores custos e sacrifícios para as massas proletárias e populares. Como refere o filósofo Giorgio Agamben, o final será sempre a guerra.

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Autoritarismo casa bem com corrupção

 

Dogs - Elliott Erwitt

O lobo perde os dentes mas não perde os intentos, sói-se dizer, e foi o que aconteceu e nem seria outra coisa a esperar, conhecendo-se o bicho. Costa não gostou do repúdio generalizado que a sua intenção de tornar obrigatória a aplicação Stayaway Covid recebeu, daí que impor a outra medida de tornar obrigatório o uso de máscara em espaço público desde que não se consiga respeitar a distância mínima de afastamento social de 2 metros; uma medida que o próprio considera mais autoritária que a da aplicação informática. A aprovação pronta e fácil da proposta de transformar o cidadão em zumbi (termo que provem da língua quimbundo que significa cadáver) deve-se ao papel prestado pelos restantes partidos da Assembleia da República que têm aprovado quase de cruz todas as propostas do governo para erodir gradualmente a tão incensada democracia; inclusivamente as abstenções, como acontece com a aprovação do Orçamento de Estado, não passam de uma aprovação (mal) dissimulada. Não deixa de ser curioso que a medida tenha sido o resultado de um projecto de lei apresentado pelo PSD, o partido que ainda se constitui como o partido de excelência da direita governativa e de representação dos interesses da burguesia em geral, embora se assista a alguma reordenação dentro das suas fileiras com o aparecimento dos partidos abertamente de extrema-direita. O que significa que, em caso de insucesso em indrominar os partidos que ousam ainda reivindicar-se de “extrema-esquerda”, a direita estará pronta a avançar: o bloco central de interesses não foi desactivado.

O uso da máscara na rua, ou seja, sem ser em espaços fechados, e por tempo demasiado, terá mais efeitos negativos para a saúde do que benefícios, sendo recomendado a sua substituição ao fim de 4 horas, coisa que não acontecerá com a grande maioria das pessoas, e iremos assistir ao aumento brusco do número de mortes por pneumonia bacteriana, engrossando assim o número de mortes a mais por não covid-19. O caso da jovem que faleceu dentro da sala de aula em Barcelos, aqui alguns dias, terá sido não apenas pela cardiopatia congénita de que sofria, mas possivelmente pelo uso permanente da máscara a que era obrigada, sendo frequente doentes com esta patologia sofrerem de alguma dispneia; foi nesse sentido que a notícia foi dada em alguns órgãos da comunicação social em Espanha, ao contrário da imprensa portuguesa que referiu a causa por simples "queda", sendo esta talvez a consequência e não a causa. A prova que o uso da máscara é ineficaz está bem demonstrada pelo aumento contínuo e enorme do número de casos de infecção registados em Itália desde que tal obrigatoriedade foi imposta no dia 7 de Outubro, de 2.677 novos casos por dia passou-se para 21.273 (+735%) em apenas 18 dias (25 de Outubro). Claro que este número se deve a uma maior testagem da população, cerca de 161 mil pessoas, mas isso a nossa imprensa comprada por 15 milhões de euros pelo governo não diz. A imposição da máscara é uma espécie de selo que atesta a docilidade para a aceitação de mais desemprego, mais miséria e mais austeridade que serão “naturalmente” atribuídas à pandemia da covid-19. Atendendo ao número de mortes e à incidência nas faixas etárias mais elevadas e sempre associada a outras comorbilidades, que, por sua vez, potenciadas é que provocam a morte, não passa de uma falsa pandemia.

O autoritarismo casa bem com a corrupção e o papel, que tem sido histórico dos partidos ditos “socialistas”, de trazer o fascismo, agora em modo brando e made in UE, é também o papel de promover e tentar encobrir a corrupção que sempre fez parte do genoma do capitalismo e que em tempo de profunda e irreversível crise de sobrevivência se torna mais conspícua e incontornável. Um dos jornais do regime, propriedade de uma das famílias mais ricas e emergentes pós-25 de Abril, à custa de muita habilidade bolsista, exploração dos trabalhadores e fuga ao fisco, tornou público os gastos do governo, feitos todos eles por ajuste directo por causa do coronavírus ("É o vírus que manda, não somos nós"!), que totalizavam na altura da publicação mais de 477 milhões de euros, isto é, 47 euros por cada cidadão português, com a chinesa GLSMed Trade/Grupo Luz Saúde à cabeça com 32,7 milhões de euros. A conta, nesta altura, já irá em montante bem mais elevado, com aumento expectável para breve de mais 35 milhões de euros na compra de 100 mil (!?) frascos de Remdesivir à norte-americana Gilead, medicamento que a própria OMS (ver https://news.un.org/pt/story/2020/10/1729852) considera ineficaz por ter “pouco ou nenhum efeito na prevenção da morte por Covid-19 ou na redução do tempo no hospital”. Será para perguntar quanto é que a ministra da saúde, que foi quem anunciou a compra, irá receber de comissão por debaixo da mesa ou mais alguém interveniente directo no negócio por parte da administração pública e/ou do PS? Será para diversificar o negócio, já que a segunda empresa do pódio é outra chinesa, Guangdong H&P Import and Export Co, com 31 milhões de euros pela venda de ventiladores (o tal ventilador de concepção e fabrico nacional não passou de uma fraude e outro negócio!), e em terceiro lugar uma empresa nacional, a Enerre, com 22 milhões de euros em 119 contratos, uma empresa cujo negócio são brindes e tendo como principal cliente a câmara laranja de Cascais; ou quando se trata de negociatas manhosas o bloco central de interesses está sempre em movimento.

Em relação ao Remdesivir, será bom recordar a fraude que foi o Tamiflu, criado pela mesma Gilead Sciences Inc e mais tarde vendido à Roche, permitindo a obtenção de lucros fabulosos com a epidemia de influenza ‘A’, que, então, foi anunciada como a pandemia do século. Falhou a gripe causada pelo vírus H1N1, a denominada “gripe suína”, arranjou-se, dez anos depois, uma outra e para qual o mesmo laboratório criou mais um medicamento ineficaz, tipo banha da cobra, o Remdesivir. Parece que agora a OMS não vai correr o risco de cair no engano, como aconteceu na altura, ao recomendar o pseudo medicamento. Não deixa de ser interessante que o indivíduo que foi presidente da Gilead desde 3 de Dezembro de 1997 até assumir o cargo do Pentágono em 2001, mantendo-se ainda como acionista, o tristemente célebre Donald Rumsfeld, secretário de defesa de Bush e corresponsável pela invasão e destruição do Iraque, tenha juntando os dois negócios mais rentáveis do planeta, o da doença e o da guerra. Costa ao permitir a compra dos 100 mil frascos anunciados pela ministra será mais um comparsa no negócio, na fraude e no morticínio que vier a acontecer.

O Costa e o Marcelo já disseram, e por mais do que uma vez, que estão a considerar decretar de novo o estado de emergência como passo a seguir em caso do número de infecções não diminuir. Ora, como isto não irá acontecer na medida em que se está a testar cada vez mais, o estado de emergência será mais que certo, a exemplo de outros países, nomeadamente a Espanha aqui tão próximo, e, embora não o digam, a mando de Bruxelas, porque estas medidas são concertadas a nível europeu, mas não deixarão de responsabilizar o cidadão português de reprovável negligência. O PS do Costa e o PSD do Marcelo não são responsáveis por nada, no seu oportunista e mediatizado entendimento, não são responsáveis pela degradação do SNS, cujos hospitais tiveram uma diminuição de 3 mil camas no período de 2007 a 2017, segundo dados do INE, ficando com 24.050, enquanto os hospitais privados cresceram de 9134 para 10.903 camas! O PS quer fazer acreditar, com a prestimosa ajuda da imprensa corporativa, de que os hospitais e serviços de cuidados intensivos vão estoirar em breve, com a delambida ministra a anunciar que haverá 444 doentes internados em UCI no próximo dia 4 de Novembro (parece que não esperam grandes resultados da proibição da saída de concelho residência entre os dias 30 de Outubro e 3 de Novembro), numa clara manobra de manipulação dos números e de atemorizar ainda mais o cidadão, como forma de justificar o empurrar dos doentes em listas de espera no SNS para o sector privado, que já esfrega as mãos de contentamento, vindo até a bastonária da Ordem dos Farmacêuticos propor, em entrevista em um dos jornais que mais tem defendido e difundido a política do governo, a medida de integrar as farmácias na rede do SNS para a vacinação em massa contra a gripe e outras situações, alegando a pretensa falta de capacidade do SNS. É o fartar vilanagem de como, a pretexto da pandemia da covid-19, se aumenta os lucros dos negócios que pululam em torno da questão da saúde. O grande capital tem inventado guerras para aumentar a riqueza, a acumulação do capital, agora inventa pandemias para obter os mesmos fins, daí o dizerem que "é uma guerra de trincheiras, com a diferença de que não são bombas, é um vírus". Como se os vírus, bem como outros micro-organismos, não fizessem parte do nosso bioma.

O Costa, com o recolher obrigatório e estado de emergência e com todas as restantes medidas securitárias, tem em vista vários objectivos: esconder que a sua política não é a de defender o SNS e a saúde dos portugueses, saúde que agora é preterida bem como os direitos e liberdades do cidadão pela falsa "salvaguarda da vida", como se esta tivesse algum valor se não for num quadro de bem-estar e liberdade e respeito pela dignidade da pessoa, nenhum elemento do povo almeja vida de escravo, mas promover os negócios da burguesia, seja ela nacional ou estrangeira; e para levar o barco da sua missão a bom porto, há que incutir o medo, fazer o povo dócil para aceitar todas as medidas de austeridade que inevitavelmente virão para que o capitalismo não venha a implodir por forças da sua natureza e contradições internas. Nenhum sistema é eterno e o capitalismo, como os que antecederam, tem fim marcado e à vista. Os orçamentos do estado burguês e também capitalista, bem como a corrupção endémica que espelham e fomentam, vão sendo aprovados com os partidos do regime, incluindo os que se dizem de “esquerda” ou “comunistas” (PCP), porque a continuação do regime de exploração dos trabalhadores é a garantia da sua (deles) própria sobrevivência, são a rémula do tubarão, e tudo o que aparentemente venham a discordar mais não passa de mera encenação, na qual o Costa é mestre, e estes partidos mais não são que os idiotas úteis do regime. Até um dia... porque a velha toupeira não descansa. As medidas de autoritarismo que o governo PS/Costa, sob o alto patrocínio do PR Marcelo e com o apoio de todos os partidos com assento parlamentar, vai decretando contra o povo é a pedra que um dia destes lhe esmagará a cabeça.