terça-feira, 29 de julho de 2025

Portugal arde e a irrelevância ministerial

Os incêndios florestais tomaram mais uma vez conta de Portugal dando uma imagem muito semelhante àquela que acompanhou o início do consulado de António Costa e governos socialistas, uma imensa tragédia mais que conhecida e temida e que ninguém ousa ou tem interesses em evitar. No entanto, a ministra da dita “administração interna” não esconde a irritação pela insistência das perguntas dos jornalistas quanto à falta de meios aéreos para combate aos fogos, considerando-a “irrelevante”, e o outro responsável pela “defesa” formaliza a criação de um “grupo de trabalho” para desenvolver propostas para pedido formal de “assistência financeira”; ou seja, aumentar a dívida pública para adquirir mais material de guerra, não a uma hipotética e futura indústria nacional de defesa, mas aos EUA conforme ficou estipulado pelo recente acordo entre a União Europeia e o Império do outro lado do Atlântico. Vai-se comprar F-35 para a guerra e alugam-se, tarde e a más horas, helicópteros para combate aos incêndios e para o transporte de doentes. Como alguém disse em relação ao pavoroso incêndio a lavrar neste momento em Arouca: “Estamos num inferno quando podíamos estar no paraíso". Portugal a arder é mais do que uma metáfora.

A agenda do grande capital financeiro e da burguesia ultramontana

A política é condicionada pela economia, é a sua expressão a nível da gestão da coisa pública e o governo nunca deixa de ser o comité de negócios da oligarquia. Assim,  não é despiciendo relembrar que a dívida pública está a subir há seis meses seguidos e fixou novo recorde em Maio, é o segundo máximo absoluto consecutivo, graças sobretudo aos títulos de dívida e certificados de aforro – chegou aos 284,5 mil milhões de euros, ou seja, mais 3,7 mil milhões do que no mês anterior. Como também se deve salientar o que os tais “peritos do Bruegel” sugeriram a Bruxelas a criação de um novo imposto para pagar gastos militares. As exportações de bens diminuíram 1,3% no segundo trimestre do ano enquanto as importações subiram 6,4%, resultado do aumento do turismo e da alguma estagnação da produção nacional. O estado português acaba de financiar-se em 1.260 milhões de euros a longo prazo, mas pagando juros mais altos. Perante a situação de crise aguda iminente da economia - que corre sobre a crise crónica que é estrutural -, a elite encarregou o governo Montenegro/PSD/Chega a preparar um pacote de medidas que, logo que sejam passadas as eleições autárquicas e presidenciais, serão impostas a fogo e ferro e que superarão em muito as que foram aplicadas pelo programa de assistência da troika. Até lá, às eleições, alguns rebuçados irão adoçar a boca do eleitorado.

O programa político do governo Montenegro é, sem mínima margem para dúvidas, o programa do grande capital financeiro, representado por Bruxelas, e o do sector mais ultramontano e explorador da oligarquia nacional. Praticamente todos os órgãos da informação mainstream fizeram campanha pela vitória do PSD e, agora governo, é levado ao colo e, sem rebuço, deixaram de falar da empresa familiar do primeiro-ministro. Não é por acaso que o mais reaccionário deles todo lançou de imediato uma campanha de descredibilização do actual governador do Banco de Portugal quando Montenegro aventou a hipóteses de o reconduzir no cargo, a exemplo do que tem acontecido até aqui. A cartilha dos acionistas do “Observador” é exactamente a agenda política do governo. A promoção do ex-ministro “pastel de nata” do governo de Passos coelho para o cargo não é inocente, talvez já ninguém se recorde e a imprensa também não as vai recuperar, as palavras preferidas ainda há pouco tempo por Álvaro Santos Pereira, em entrevista ao “Expresso”: a “proteção dos despedimentos individuais deve sair da Constituição”. Ainda não tinha sido nomeado para governador do banco central e já defendia a realização de “reformas estruturais” e que a “revisão constitucional”, embora não fosse indispensável, iria “dar um impulso à competitividade”. Quanto às intenções deste homem de mão do grande capital financeiro internacional estamos conversados, o papel de agência do BCE por parte do Banco de Portugal sairá reforçado.

Com o governo e os instrumentos financeiros sob inteiro controlo de Bruxelas e da elite parasitária nacional a política não poderá ser outra se não intensificar a extorsão de mais-valia à força de trabalho nacional, onde os trabalhadores imigrantes são uma parte importante. Daí ser necessário reforçar outros instrumentos de controlo e de exploração do trabalho: restringir o direito à greve, ou simplesmente acabar com ele; “reformar” o código do trabalho, a fim de baixar ainda mais os salários reais, a existência de uma enorme mão-de-obra ilegal será um meio importante para baixar os salários em geral, fala-se já em não aumentar tanto o salário mínimo nacional; despedimentos mais baratos e mais fáceis, mais precarização. E se houver insubordinação social, haverá mais repressão e para este fim são necessários mais polícias: o governo acaba de dar posse a mais 439 novos agentes… para garantir “a liberdade e a segurança dos cidadãos”, referindo-se Montenegro mais aos cidadãos da classe que representa e defende do que aos cidadãos comuns, esses que se amanhem ou se matem uns aos outros. O governo joga com as estatísticas e fomenta falsas percepções sobre a questão da segurança, enquanto o número de crimes registados pelas autoridades diminuiu 1,3% nos últimos anos, as notícias sobre a delinquência subiram 130% nas primeiras páginas e noticiários dos media mainstream. Estes, juntamente com o governo, são os maiores fazedores de fake news.

Empobrecer o povo e dividir para reinar

Com o fundo de opinião pública moldado foi fácil ao governo alterar a lei de estrangeiros e a lei da nacionalidade de forma a restringir ainda mais a entrada da horda de bárbaros que tanto atormenta as boas consciências cristãs nacionais, apesar de aparentemente estarem eivadas de inconstitucionalidades. Em relação à primeira, o manhoso do Marcelo resolveu enviá-la para o Tribunal Constitucional e o mesmo deverá fazer em relação à segunda, lavará sim as mãos e o ónus ficará sobre o governo e ninguém o poderá acusar de estar a seguir a agenda da extrema-direita, como acontece de forma indisfarçável com Montenegro. Os responsáveis políticos de alguns dos países da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) não se fizeram esperar nos reparos a estas alterações legislativas e é muito provável caso elas avancem que haja retaliações, devemos lembrar que se há cerca de 60 mil imigrantes angolanos em Portugal, há mais de 120 mil portugueses emigrados em Angola. Se os países onde há emigrantes portugueses, com as suas famílias, fizeram o mesmo, então, serão mais de dois milhões portugueses a fazer adornar a fraca embarcação nacional. Estas leis servirão apenas para engrossar a mão-de-obra ilegal, mais vulnerável e mais explorável e impedir que ela se una aos trabalhadores portugueses em solidariedade internacionalista, o inimigo é comum: a burguesia e o seu sistema de exploração capitalista.

Os portugueses comuns, o povo, estão mais pobres. O número de famílias em dificuldades, muitas já se endividam para conseguir pagar a renda e despesas essenciais como as contas do supermercado, da água, luz e gás, apesar de manterem rendimentos fixos e trabalho a tempo inteiro, e quem lança o alerta é o Gabinete de Proteção Financeira da Deco, que geralmente peca por defeito. No entanto, há quase 250 mil casas vazias em Portugal fora do mercado de venda ou arrendamento, que poderiam ser usadas em termos imediatos para a resolução do grave problema da falta de habitação para a classe trabalhadora e até para parte da classe média. Ao todo são 723 mil casas vagas em Portugal, das quais 485 mil estão em condições de ser habitadas, e só metade deste número estão no mercado com o objectivo de manter a alta dos preços e impedir um abaixamento, o que faria diminuir os lucros exorbitantes arrecadados por toda a sorte de especuladores que pululam nesta área. Por outro lado, vem o actual líder do PS defender que o problema de “falta de habitação” se pode resolver com “construções modulares”, uma solução rápida para habitação no seu limitado entendimento, depois de ter visitado uma fábrica de produção daquele equipamento, escamoteando que o problema é antes do mais político e que basta colocar toda a habitação disponível actualmente no mercado, constituindo-se o estado em agente interventivo, para o problema ser resolvido.

Avanços da extrema direita em Portugal - Thiago Lucas

Os próximos tempos vão ser de luta

O governo Montenegro/PSD/Chega assume-se desde a primeira hora como agente de negócios da burguesia e dos interesses de Bruxelas, a destruição agora acelerada e em modo irreversível do SNS é o melhor exemplo desse papel. Os constantemente encerramentos das urgências pediátricas, obstetrícias e cirúrgicas de hospitais importantes e por fins de semana continuados e já por períodos mais longos revelam à evidência que se está proceder ao desmantelamento dos cuidados públicos de saúde substituindo-os pelos serviços privados, que simultaneamente são financiados pelo Orçamento Geral do Estado, daí as verbas destinadas a este sector serem as mais elevadas de sempre, enquanto que os cidadãos portugueses nunca tiveram tão maus serviços e tantas dificuldades em acedê-los. O que acontece no Hospital de Braga fala por si: ao longo de 15 anos, este hospital celebrou contratos de mais de 27 milhões de euros com uma empresa privada, pertencente ao director do serviço de oftalmologia Fernando Vaz, que, sabendo que o escândalo seria noticiado, pede a demissão dois dias antes. Entretanto o hospital não paga o dinheiro que deve aos médicos radiologistas do quadro por trabalho extraordinário que eles agora se recusam a fazer; e a assistência aos doentes que sofram AVC foi suspensa aos sábados e aos domingos e a partir das 20h nos dias da semana. É o outsourcing que Montenegro prometeu, e que a partir de agora será dominante quanto as despesas do estado. Não basta pedir a a demissão da comissária política da ministra da saúde, terá de ser de todo o governo e de toda a sua política que lhe é “recomendada” por Bruxelas.

A mesma política será seguida em todos os negócios com o estado, as tão famigeradas parecerias público-privadas estão de regresso com a construção das linhas do TGV; o outsourcing será para continuar e estender a quase todos os serviços que ainda são públicos, saúde, educação, escolas, creches e infantários, apoio à terceira idade e cuidados continuados, que já o são através das IPSS e continuarão. O combate aos incêndios florestais também é feita em outsourcing, transformando esta desgraça nacional em chorudo negócio; enquanto houver mata e eucaliptos para arder, drones para atear as chamas (o crime vai-se modernizando), Portugal será o país da Europa com mais área ardida e por incendiarismo. Haverá também mais comissões a circular por debaixo da mesma, daí a pressa da substituição do governo PS/Costa por este mais competente no uso do cacete (pelo menos é o que se espera); golpe presidencial levado a cabo, ao contrário do que muitos militantes do PS pensam, com a colaboração activa e interessada do próprio Costa. 

Ao mesmo tempo, a corrupção irá aumentar, porque é o óleo que lubrifica toda a engrenagem da economia capitalista nacional, coisa que a nossa inefável "esquerda" se esquece frequentemente. A contradição que o povo trabalhador tem de enfrentar não é bem entre a "democracia" e o "fascismo", porque estas duas formas de regime político são apenas duas maneiras distintas de gerir o capitalismo, mas entre capitalismo e socialismo/comunismo, entre poder político nas mãos da oligarquia e o mesmo poder nas mãos de quem trabalha e produz. A velha toupeira é incansável no seu lento e discreto trabalho, e uma nova esquerda terá de se erguer no lugar da velha, que desde há muito perdeu referências e apoio dos de baixo, passando o tempo na conciliação para se alcandorar a pequeno lugar na mesa do banquete da exploração. Os próximos tempos vão ser de luta, e de luta bem dura - o capitalismo terá de ser destruído.

Imagem de destaque: Portugal em chamas - Vasco Gargalo

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sábado, 19 de julho de 2025

O Cônsul

Júlia Nery

No jardim do consulado ressoavam passos vidrosos; seriam talvez os ecos das cardas alemãs pisando as pedras da França, marchando pelo cais de Bordéus. Não, não eram ainda as botas dos soldados, mas a correria dos garotos sobre o saibro a estilhaçar-se nos ouvidos do Cônsul.

O choro e o riso destas crianças das mais variadas nações, que à volta da casa esperavam, faziam-se pancadas de aldraba repetindo nos seus sentidos todos prolongados gritos de socorro.

E dentro, no balancear dos lustres de cristal, gemia o medo dos stukas que haviam de vir rosnar em arreganhos de ameaça sobre a cidade.

Lá fora, mesmo por debaixo da janela da chancelaria, subia um crescendo de sons humanos, de silêncios-súplica, alinhados em bicha frente ao consulado, em chave diante da sua porta.

Nas mãos do Cônsul punham os acasos da História a expectativa de alheias esperanças.

Não estava a dormir. Não eram pesadelos. Não o esperava o alinhamento rotineiro de vogais e consoantes nos pareceres e nos despachos. Tratava-se agora de manejar a palavra-verbo, mais pesada que enxada; para ele mais perigosa que bala ou baioneta. Ah, o poder tremendo da palavra! O esforço que, às vezes, precisamos de fazer para o movimento tão simples de a construir como símbolo mediador entre o homem e o indizível, quando ela se faz acto.

Releu as instruções enviadas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. Não encontrava ponto ou vírgula que encaminhassem o sentido de modo a permitir-lhe conceder vistos, pelo menos aos que maiores perigos corriam com os Alemães. Como fazê-lo sem arriscar a carreira?

Como poderá alguém preso ao mundo das coisas por uma dúzia de bocas que pedem pão, e também pelas cadeias concretíssimas da fartura, do conforto e do êxito, desprender-se delas à força da ideia abstracta do fazer bem sem olhar a quem?

Exactamente agora, quando ele poderia participar na maior das grandes batalhas — de um mortífero orgulho humano contra incontáveis criaturas criadas por Deus à sua imagem, como a todos os homens — ia ter de ficar quieto. A isso o obrigavam as instruções recebidas do Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre os vistos em passaportes; desde a primeira alínea com a proibição absoluta de os dar aos Israelitas sem discriminação de nacionalidade. Lá fora, muitos dos que esperavam obter nos passaportes o carimbo da salvação eram certamente casais mistos que não queriam separar-se: homens, mulheres e crianças, famílias inteiras de religião judaica; seres errantes pela Europa adiante até onde as doutrinas anti-semitas cosidas às almas dos nazis e de outros fanáticos pelo inflamado discurso de Hitler acabariam por atingi-los. Bastar-lhe-ia a ele escrever algumas palavras, e aquela gente seria salva. Mas não podia fazê-lo.

Tinha deveres, compromissos, família. Medo.

Tinha convicções, sentido de justiça, preceitos de fé. Respeito por si próprio.

Não queria pensar, ver ou ouvir. Nem cair na tentação de julgar-se.

Não controlou a fúria que lhe guiou a mão para carimbos e canetas que atirou para a lareira, apagada naquela época do ano.

Não resistiu a espreitar pela janela as pessoas e o burburinho que aumentavam. Atreveu-se a pensar nos caprichos de Deus; permitia milagres em charnecas despovoadas, revelando-se a seres simples e felizes, e recusava-os quando milhares de aflitos os reclamavam.

Olhou o céu que se mostrava propício a acontecimentos divinos, liberto de nuvens no zénite, brilhando tão intensamente o sol, que podia imaginar-se que ele poderia tremer e girar sobre si mesmo como uma roda de fogo-de-artifício, bailando no déu em desafio às leis cósmicas. Mas não havia ali nem azinheira, nem pastorinhos, nem mensagem divina com hora marcada para acontecer. Nem surgiu urna Nossa Senhora a anunciar o fim da guerra.

Ninguém gritaria: Milagre! Milagre!

E este homem sofreu então o pior dos assédios, cercado pelo seu de si.

O Cônsul fechou-se à chave no gabinete de trabalho e correu os pesados cortinados de veludo. Desejaria esconder-se dentro de um enorme cubo estanque. Como se fosse possível ficar imunizado con-tra os sons, o sopro vital, a paciência e a fé de todos os que à sua porta esperavam que ele voltasse a passar vistos para Portugal, o que desde 1936 constava que fazia.

Então, durante três dias e três noites, este homem deixou-se to-mar pela febre, aniquilada a vontade em tremuras e suores gelados que lhe lavavam o corpo da energia necessária ao espírito para o mobilizar, ordenando-lhe que entrasse na luta.

Não se deu conta dos muitos passos e ruídos das várias pessoas que ele próprio mandara instalar em quartos e salas do consulado, por estarem doentes ou com crianças debilitadas. Apenas viria a lembrar--se, muito mais tarde, de ter passado uma das noites a discutir com um rabino sobre as coisas de Deus e dos homens. Mas nem poderia estar certo de que não tinha sido um sonho, uma resposta.

Naquela semi-inconsciência do delírio, ele fazia a espeleologia da sua alma, descobria os limites da sua força. Voltou o pensamento para a vida e para a História que o acaso fazia passar tão próxima de si para que ele pudesse afluir também a esse rio cujas águas não passariam jamais pelas mesmas margens.

Ele acreditou-se, no delírio, o instrumento da Promessa feita ao povo eleito. Esperava que a Palavra que se passeia pelo paraíso e se revelara a Moisés na sarça ardente se lhe revelasse também, mas apenas lhe vinham à memória fragmentos de orações: «E dizei uma só palavra e minha alma será salva». Versículos da Bíblia misturavam-se na sua cabeça, pois enquanto a febre e a inanição o escudavam contra a constatação do que estava a passar-se à sua volta, ele ficara cara a cara com a imagem roxa de um Senhor dos Passos, de olheiras negras e rosto iluminado pelas linhas do suor, curvado sob a cruz, de joelho no chão.

A metáfora da cruz. A alegoria do cada um carregar os pecados em que será supliciado, curvando a espinha, ciliciando o corpo.

Perguntava-se em lágrimas se seria capaz de viver crucificado (cruXificado) em si, pois o que assusta na alegoria não é carregar a sua cruz, mas ter de pregar-se nela, o que certamente lhe aconteceria se, obedecendo-se para poder viver em paz consigo mesmo, desobedecesse às ordens do seu Governo.

O estado febril do Cônsul atrasava qualquer resolução que ele seria obrigado a tomar, defendê-lo-ia, porventura, de agir como quem era e não como tinha de ser. Mas saiu da febre e do delírio para descobrir no lago quieto da sua verdade uma razão para estar em tal lugar em tão má hora. E, clamando aos seus que tinha ficado retido em Bordéus pela Providência porque era preciso salvar toda aquela gente da morte, mandou que lhe dessem a caneta, o selo branco e os carimbos, que se abrissem as portas do consulado e se encaminhassem os requerentes para a chancelaria. Ali ficaria, sem quase comer e dormir, a carimbar e a assinar vistos.

O que pode um indivíduo contra a lógica dos acontecimentos que se armam ratoeira contra si?

Sobre as fronteiras francesas com a Espanha cairá a avalancha de milhares de pessoas em fuga (só da Bélgica eram dois milhões e meio), que atravessaram cidades ao ritmo dos raides e alertas aéreos, sujeitando-se a tudo para lá chegar. O pânico leva-as de roldão e vai deixando algumas centenas aqui e além, como acontecera em Bordéus, mas a grande massa humana desabará, em pressão, nas cidades fronteiriças.

O cônsul português teve uma clara percepção disto, quando a fila de gente diante da porta do consulado diminuiu para escassas dezenas e o movimento na chancelaria começou a abrandar. Pela vista, em acelerado, passou-lhe a imagem do que estaria a acontecer em Bayonne. E ele não estava lá! Esta visão era um chamamento. Era a força da pressão a que estivera sujeito durante muitas horas, uma espécie de alucinação do agir que o impeliria a partir em direcção ao Sul para acabar o que tinha começado.

Pelo caminho, o Cônsul encontrou fugitivos em dificuldades, acompanhou-os até uma fronteira pouco utilizada, onde qualquer notícia chegava com muito atraso e ele era muito conhecido, por ser por ali que sempre viajava com a família, quando vinha a Portugal. Assim conseguiu fazê-los atravessar.

Dirigiu-se depois a Bayonne. A confusão nas imediações do consulado português era indescritível. Não sabendo quem ele era nem ao que vinha, o Cônsul foi avançando movido pelos empurrões, entalado, insultado por pretender passar à frente dos que ali esperavam há muito tempo. Ninguém ouvia as suas razões, mas lá conseguiu atravessar a estreitíssima rua e foi, a bem dizer, içado por um funcionário que ele alcançou a porta. O corrimão da velha escada de madeira, sujeito às marés de tantas mãos ondulava como escaler de navio em direcção à porta do terceiro andar do consulado de Portugal.

Amarrotado pelos encontrões, sem nenhum cansaço apesar dos quilómetros que percorrera em tempo recorde, o Cônsul sentou-se a assinar vistos. Movia a caneta e o carimbo com uma tal energia frenética, que um dos depoentes no processo viria a dizer em sua defesa que ele lhe parecera então fora do seu juízo.

O Cônsul assinou e carimbou até ser impedido por um funcionário do Governo que lhe transmitiu a ordem de regressar imediatamente a Portugal.

Ter, pela primeira vez na vida, assumido frontalmente o seu desacordo com o poder, enfrentando grandes riscos cujos ecos lhe ensurdeceriam o futuro, fazia-o experimentar o apaziguamento de uma liberdade de si nunca antes conhecida. Recuperou a serenidade da expressão. Fora capaz de agir como quem era, em coerência com tudo aquilo em que verdadeiramente acreditava. Precisava disfrutar dessa glória até ao limite.

Na viagem do seu forçado regresso, dizem os que viajaram com ele que tinham estranhado aquele sorriso de irónica satisfação num diplomata que era chamado a apresentar-se ao Governo para responder por grave acto de desobediência, uma atitude que Salazar lhe faria pagar caro. Não sabiam que entre os seus papéis vinham, a salto, manuscritos acusatórios dos nazis de um escritor bem conhecido; que o Cônsul, obrigado a parar de escrever as palavras do seu nome com as quais salvara de sofrimentos irremediáveis tantas pessoas que ele nem tivera tempo de olhar, para reter a imagem, continuava a assumir os perigos da sua insubmissão. Consigo ele passava ideias para as transmitir, livres, nos longes do tempo.

Contaria o Cônsul que em Bayonne, ao passar por um ajuntamento, o reconheceram e o ovacionaram. Talvez. Qual é o homem que não deseja cingir-se em vida com uma coroa de glória, ainda que efémera?

(“O Cônsul”, Júlia Nery. Âncora Editora, 2017)



segunda-feira, 14 de julho de 2025

A guerra como religião

Emmanuel Todd

O niilismo é a matriz de religiões emergentes, como o evangelicalismo delirante e o judaísmo ultraortodoxo. Mas a verdadeira nova religião de massa é o culto à guerra.

A NOVA RELIGIÃO DE MASSA É O CULTO DA GUERRA

Uma sequência de três estágios pode descrever a dissolução da matriz religiosa de nossas sociedades: religião ativa (crença e prática regular), religião zumbi (descrença acompanhada pela sobrevivência de valores morais e sociais) e, finalmente, religião zero (desaparecimento completo).

Inicialmente, apliquei esse esquema ao cristianismo, em todas as suas variantes — católico, protestante e ortodoxo — e depois o estendi aos outros dois grandes monoteísmos, o islamismo e o judaísmo, concentrando-me, no caso do islamismo, no componente xiita.

Assim, para a Escandinávia, por exemplo, podemos descrever uma sequência típica: "protestantismo ativo, protestantismo zumbi, protestantismo zero". Para o Irã: "xiismo ativo, xiismo zumbi", com a possibilidade futura de "xiismo zero". Em Israel, porém, a sequência já parece completa: "judaísmo ativo, judaísmo zumbi, judaísmo zero".

O caso israelense, assim como o dos Estados Unidos, requer uma investigação mais aprofundada: novas religiões surgiram em ambos os países. Nos Estados Unidos, um evangelicalismo delirante; em Israel, um judaísmo ultraortodoxo. Dois fenômenos inquestionavelmente religiosos, mas que representam inovações radicais: o primeiro pós-cristão, o segundo pós-judaico.

Nunca na história do protestantismo existiu um deus tão "legal", um distribuidor de recompensas monetárias sem qualquer referência à moralidade. Nunca na história do judaísmo houve um crescimento tão exponencial de uma classe de preguiçosos vivendo de benefícios estatais e do trabalho de suas esposas, determinados a vagar sem rumo pela Torá.

O que essas duas novas religiões têm em comum é a rejeição da ética do trabalho que era fundamental tanto para o protestantismo quanto para o judaísmo tradicional.

Contudo, estas não são as inovações mais relevantes para a compreensão do fenômeno religioso no mundo pós-cristão e pós-judaico. Como já escrito em " A Derrota do Ocidente" , o vazio deixado pelo cristianismo gera uma deificação do próprio vazio: um niilismo que busca a destruição das coisas, das pessoas e da realidade.

O niilismo é a matriz das religiões emergentes. Mas a verdadeira nova religião de massa é o culto à guerra.

Paradoxalmente, ou talvez logicamente, essa novidade nos remete ao passado, antes do monoteísmo. A história da humanidade está repleta de religiões guerreiras ou deuses da guerra: Ares e Atena para os gregos, Indra para os indo-arianos, Ningirsu na Suméria, Sekhmet no Egito, sem mencionar Tutatis, o deus celta conhecido por Asterix. Nossos ancestrais gauleses eram, afinal, meros caçadores de cabeças.

Durante uma conversa no canal Fréquence Populaire com Diane Lagrange, sobre o mais recente e fracassado ataque conjunto dos EUA e Israel ao Irã, evoquei — de forma um tanto provocativa — o deus asteca da guerra, Huitzilopochtli, como uma possível divindade da nova religião de guerra dos EUA e Israel.

Mas, graças ao Pentágono, podemos fazer melhor. O nome dado à operação para bombardear as instalações nucleares do Irão sem danificá-las, Martelo da Meia-Noite, nos remete à divindade perfeita. O martelo é o instrumento e símbolo de Thor, o deus escandinavo — e, mais amplamente, germânico — da guerra. Um martelo de cabo curto, que retorna à mão de seu dono após o golpe.

Thor é, hoje, o deus favorito dos neonazistas. E sua terra natal, a Escandinávia, tornou-se o epicentro de um impressionante ressurgimento belicista.

Por isso, proponho chamar essa nova religião de guerra, que substitui o monoteísmo e sua moralidade nas sociedades protestantes e judaicas, de "culto a Thor". Para fixar esse conceito na mente, são necessárias imagens.

Por que não substituir as estrelas nas bandeiras americana e israelense pelo martelo de Thor? Cinquenta e um martelos brancos em miniatura, no canto superior esquerdo da bandeira americana; um único martelo azul, no centro da bandeira israelense. Thor é o verdadeiro Deus dos Estados Unidos e de Israel.

Opensubstack.com

Fonte

terça-feira, 8 de julho de 2025

A Demolição do SNS

À beira do abismo (Será mais o SNS do que a ministra)

Ainda estamos bem lembrados da campanha que a imprensa mainstream, com especial destaque para o jornal “Público” (Grupo Sonae) lançou contra a ministra Marta Temido e, por arrasto, contra o próprio SNS, a propósito da morte de recém-nascido no Hospital das Caldas da Rainha, devido ao “encerramento das urgências de obstetrícia por alegada falta de médicos”. Ministra que, pelos sucessivos casos de não atendimento no SNS, acabou por apresentar a demissão “por entender que deixara de ter condições para se manter no cargo “. No governo PSD/Montenegro, a ministra farmacêutica, perante o caso de grávida que perdeu o bebé porque não tinha dinheiro para se deslocar até ao Santa Maria e do INEM não possuir helicópteros para o transporte urgente de doentes, diz-se de "consciência tranquila" e que estará no cargo até o primeiro-ministro manter a confiança… e até à demolição completa do SNS.

A polémica actual sobre o SNS continua sobre a falta já crónica de recursos humanos e de meios, os salários insuficientes dos profissionais e a teimosia da ministra em contrariar a realidade da saúde no país e manter-se agarrada ao cargo. A substituição por outro comissário para o sector não vai por si só alterar o que quer que seja se a política se mantiver, bem como o próprio governo, mas quanto a estas questões a ministra parece estar de pedra e cal, porque é o líder parlamentar do PSD que faz o elogio: "É precisamente pelos resultados que a ministra da Saúde continua", justificando a continuação da dita no novo governo. E, quanto ao governo, este faz contas em levar a legislatura até ao fim. A política delineada desde há muito e prosseguida agora pelo PSD/Montenegro é privatizar a saúde em Portugal. É uma questão de fé e uma missão a cumprir.

A questão de falta de helicópteros e de os utilizados pela Força Aérea serem demasiados grandes para operar na maioria dos heliportos dos hospitais não parece ser, igualmente, preocupação que tire o sono aos responsáveis pela saúde dos portugueses. Em relação ao transporte de doente da Covilhã para os Hospitais da Universidade de Coimbra, que levou mais de cinco horas pela dificuldade atrás apontada, o director executivo do SNS logo veio dizer que a responsabilidade dos transportes não é do SNS mas do INEM. E, ao que parece, também não é do governo nem da ministra porque não acautelaram a tempo os meios aéreos e a dotação de pessoal para o funcionamento normal e adequado daquele serviço. Em vez de mil e quinhentos trabalhadores o INEM possui pouco mais de 800 e a corrupção é mais do que uma suspeita. Ainda na manhã de hoje, a PJ, o Ministério Público e a Procuradoria Europeia realizaram buscas no edifício sede do INEM, em Lisboa, bem como nas Universidades do Porto e de Coimbra, relacionadas com a utilização fraudulenta dos dinheiros do PRR.

Como se pode constatar, os negócios na saúde, assim como em outras áreas, estão frequentemente envoltos em corrupção despudorada e não há freio para os gastos quando se trata de interesses que pouco ou nada têm a ver com a saúde e o bem-estar da maioria dos cidadãos portugueses. Deu escândalo o facto de ter havido um médico dermatologista que arrecadou mais de 400 mil euros em cirurgias adicionais em 10 sábados, o que levou o presidente do Hospital Santa Maria suspender as referidas cirurgias extra e ordenado uma auditoria, que já sabemos antecipadamente ao que vai dar. Logo depois, foi notícia uma médica, igualmente dermatologista e a trabalhar no mesmo hospital, ter recebido 113 mil euros em 7 sábados, embora se encontrasse ao mesmo tempo num congresso em Itália; as cirurgias terão sido feitas por médicos internos em seu nome, ou como os médicos mais novos são usados e explorados. E, já que falámos do Hospital de Santa Maria, este terá gastado mais de 40 milhões de euros em produção adicional desde 2022. É o fartar vilanagem!

Não há dinheiro para aumentar os salários de médicos, enfermeiros e outros técnicos necessários ao bom funcionamento do SNS, mas gasta-se dinheiro para pagar aos médicos que sabotam o trabalho e contratar os serviços adjudicados ao sector privado, em outsourcing desnecessário e redundante. Mesmo que para isso se permita que os médicos, que são funcionários do estado, acumulem com o privado, onde vão enriquecer, e não apenas complementar o rendimento mensal, em regime de empresário em nome individual. E como ninguém tem o dom da ubiquidade, então, haverá que fechar o público para manter em actividade o sector privado. Assim, ainda neste fim de semana estiveram encerradas sete urgências no Sábado, dia 5 de Julho e oito no Domingo, sendo uma de Pediatria e as restantes de Ginecologia e Obstetrícia, nos hospitais do Barreiro, Setúbal, Vila Franca de Xira, Santarém, Aveiro, Leiria e Abrantes. A partir de amanhã. dia 9, a urgência de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital do Barreiro fechará para ambulâncias durante 10 dias. Mais parturientes irão estar em risco de vida, assim como os seus bebés, e outros desastres acontecerão sem que perturbem o descanso e a consciência dos nossos desgovernantes.

Para os privados aumentarem os seus negócios, o SNS terá de emagrecer ficando só pele e osso, e a realidade dos factos mostram à evidência que enquanto se encerram e degradam os serviços públicos, embora se gastem mais uns milhões de euros todos os anos e com perda de eficiência, os lucros dos hospitais privados batem recordes de faturação e de número de cirurgias, ultrapassando os 2,5 mil milhões de euros em 2024. Para o que contribuem, também, o aumento dos seguros de saúde e a procura de cuidados fora do SNS, porque este encerra parcialmente aos fins de semana. Foi uma subida de lucros de 11,6%, considerado um máximo histórico. E diz a ministra, farmacêutica e comissária política, que assumir responsabilidades "significa ficar, resolver, dar a cara de uma maneira empática", reforçando a ideia que o SNS é "chave mestra" para a saúde. O que se compreende, na justa medida em que o SNS funciona como hospedeiro para o vírus do negócio privado da doença, é que se o hospedeiro morre, o vírus não conseguirá sobreviver.

Mais uma outra prova de que o privado para se manter e crescer tem de espoliar os dinheiros públicos é o facto de o primeiro centro de saúde de gestão privada, que estava previsto para o fim de 2024, continuar sem data para abrir. E a ULS de Coimbra já não avançará com USF modelo C graças à contratação de quatro médicos de família. Se o governo contratar médicos, e não só, pagando-lhes bem, não haverá falta e os serviços funcionarão, e funcionarão bem. Mas o governo de Montenegro/PSD insiste em oferecer “incentivos”, em vez de salários dignos, e continuar com o regime ambíguo de “dedicação plena”, no lugar da “dedicação exclusiva”, nem que para isso tivesse de duplicar o salário base. Por um lado, calava os sindicatos e, por outro, tinha ao seu dispor um conjunto de profissionais dedicados e motivados e, inevitavelmente, a qualidade dos cuidados também subiria enormemente. Mas não, a carta branca recentemente enviada de Bruxelas é para gastar, sem restrições, mas com a dita “defesa”, melhor dizendo, com os negócios da guerra. No entanto, há 10 anos que as receitas do SNS não ficavam tão abaixo do previsto no Orçamento de Estado, tendo o défice aumentado 741 milhões de euros para mais de 1,3 mil milhões de euros, um défice também histórico.

Salientar que as tais cirurgias adicionais realizadas no Hospital de Santa Maria foram realizadas maioritariamente no tempo em que a ministra estava à frente daquele hospital público, tendo também trabalhado para o laboratório farmacêutico Gilead. A nomeação de um ex-quadro da Sanofi, Francisco Gonçalves, para a Secretaria de Estado da Gestão da Saúde confirma, segundo a publicação “Páginas UM”, o domínio crescente do lóbi farmacêutico no aparelho do Estado. Não são só os interesses das clínicas privadas que parasitam o SNS, o polvo é enorme e ramificado. Nunca houve um gasto tão grande com os medicamentos no SNS, muitos deles ineficazes ou com eficácia duvidosa e redundantes, como agora, e não será necessário ir buscar o caso das gémeas brasileiras, cuja culpa irá morrer solteira, cuja medicação ficou ao estado português em mais de dois milhões de euros. Relembrar que a actual ministra geriu com o antigo bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, uma conta conjunta e pessoal, pretenso fundo solidário de 1,4 milhões pejado de irregularidades e, segundo a mesma “Páginas UM”, não se sabe onde pára a auditoria prometida. E de negócio em negócio vai-se demolindo o SNS, e os responsáveis pela gestão do moribundo SNS mais não são que os agentes da negociata… até que eles próprios um dia sejam demolidos.

Ver também:

A cruzada para o desmantelamento do SNS e do sector estado em geral

Miguel Guimarães e Ana Paula Martins geriram em conta pessoal fundo solidário de 1,4 milhões pejado de irregularidades. Não se sabe onde pára auditoria prometida.

quarta-feira, 2 de julho de 2025

Os Jogos da Fome de Gaza

Por Chris Hedges

Autilização da fome como arma por parte de Israel é a forma como os genocídios terminam sempre. Abordei os efeitos insidiosos da fome orquestrada nas Terras Altas da Guatemala durante a  campanha genocida  do General Efraín Ríos Montt, a fome no Sul do Sudão que fez 250 mil mortos — passei pelos cadáveres frágeis e esqueléticos de famílias alinhadas nas estradas — e, mais tarde, durante a guerra na Bósnia, quando os sérvios  cortaram  o fornecimento de alimentos a enclaves como  Srebrencia  e  Goražde.

A fome foi  montada  pelo Império Otomano para dizimar os  arménios. Foi utilizada para matar milhões de ucranianos no  Holodomor  em 1932 e 1933. Foi  empregue  pelos nazis contra os judeus nos guetos na Segunda Guerra Mundial. Os soldados alemães  usaram a comida, como faz Israel, como isco. Ofereceram três quilos de pão e um quilo de marmelada para atrair famílias desesperadas no Gueto de Varsóvia para transporte para os campos de extermínio. "Houve alturas em que centenas de pessoas tiveram de esperar na fila durante vários dias para serem 'deportadas'",   escreve Marek Edelman em "The Ghetto Fights". "O número de pessoas ansiosas por obter os três quilos de pão era tal que os transportes, saindo agora duas vezes por dia com 12 mil pessoas, não podiam acomodar toda a gente." E quando as multidões se tornavam indisciplinadas, como em Gaza, as tropas alemãs disparavam saraivadas mortais que rasgavam cascas emaciadas de mulheres, crianças e idosos.

Esta tática é tão antiga como a própria guerra.

A notícia do jornal israelita Haaretz, de que os soldados israelitas recebem  ordens para disparar  sobre multidões de palestinianos nos centros de assistência, resultando em 580  mortos  e 4.216 feridos, não é uma surpresa. É o desfecho previsível do genocídio, a conclusão inevitável de uma campanha de extermínio em massa.

Israel, com os seus assassinatos selectivos de pelo menos 1.400  profissionais de saúde,  centenas  de trabalhadores das Nações Unidas (ONU),  jornalistas,  polícias  e até  poetas  e  académicos, a sua destruição de edifícios de apartamentos de vários andares, eliminando dezenas de famílias, o seu  bombardeamento  de  "zonas humanitárias" designadas  onde os palestinianos se amontoam sob tendas, lonas ou ao ar livre, os seus ataques sistemáticos a  centros de distribuição de alimentos da ONU,  padarias  e  comboios de ajuda  ou os seus sádicos  disparos de atiradores furtivos  que abatem crianças, há muito que ilustrou que os palestinianos são considerados vermes dignos apenas de aniquilação.

O bloqueio de alimentos e de ajuda humanitária, imposto a Gaza desde 2 de Março, está a reduzir os palestinianos a uma dependência abjeta. Para comer, têm de  rastejar  em direção aos seus assassinos e mendigar. Humilhados, aterrorizados, desesperados por alguns restos de comida, são despojados de dignidade, autonomia e autonomia. Isso é  intencional.

Yousef al-Ajouri, de 40 anos,  explicou  ao Middle East Eye a sua viagem de pesadelo até um dos quatro centros de ajuda humanitária criados pela Fundação Humanitária de Gaza (GHF). Os centros não foram concebidos para satisfazer as necessidades dos palestinianos, que  antes dependiam  de 400 pontos de distribuição de ajuda, mas para  os atrair  do norte de Gaza para o sul. Israel, que no domingo  ordenou novamente  aos palestinianos que abandonassem o norte de Gaza, está a expandir constantemente a sua  anexação  da faixa costeira. Os palestinianos são  encurralados  como gado em estreitas calhas de metal em pontos de distribuição supervisionados por mercenários fortemente armados. Recebem, se forem um dos poucos sortudos, uma pequena caixa de comida.

Al-Ajouri, que antes do genocídio era taxista, vive com a mulher, os sete filhos, a mãe e o pai numa tenda em al-Saraya, perto do centro da Cidade de Gaza. Foi a um centro de ajuda humanitária na Rua Salah al-Din, perto do corredor Netzarim, para encontrar comida para os seus filhos, que, segundo ele, choram constantemente "de fome". Seguindo o conselho do seu vizinho na tenda ao lado, vestiu-se com roupas largas "para poder correr e ser ágil". Transportava um saco com alimentos enlatados e embalados porque a aglomeração de pessoas significava que "ninguém conseguia carregar as caixas com a ajuda".

Partiu por volta das 21h00 com mais cinco homens, "incluindo um engenheiro e um professor", e "crianças de 10 e 12 anos". Não seguiram a rota oficial designada pelo exército israelita. A multidão que se aglomerava no ponto de atendimento ao longo do percurso oficial fazia com que a maioria nunca se aproximasse o suficiente para receber comida. Em vez disso, caminharam na escuridão em áreas expostas aos tiros israelitas, tendo muitas vezes de rastejar para não serem vistos.

“Enquanto rastejava, olhei para o lado e, para minha surpresa, vi várias mulheres e idosos a seguir o mesmo caminho perigoso que nós”, explicou. “A certa altura, houve uma saraivada de tiros à minha volta. Escondemo-nos atrás de um edifício destruído. Qualquer pessoa que se movesse ou fizesse um movimento percetível era imediatamente alvejada por atiradores. Ao meu lado estava um jovem alto e de cabelo claro, usando a lanterna do telemóvel para se guiar. Os outros gritaram-lhe para desligar a lanterna. Segundos depois, foi baleado. Caiu no chão e ficou a sangrar, mas ninguém conseguiu ajudá-lo ou movê-lo. Morreu em poucos minutos."

Passou por seis corpos ao longo da rota que foram mortos a tiro por soldados israelitas.

Al-Ajouri chegou ao centro às 2h da manhã, hora marcada para a distribuição de ajuda. Viu um sinal verde à sua frente, sinalizando que a ajuda estava prestes a ser distribuída. Milhares começaram a correr em direção ao sinal, empurrando-se, atropelando-se e atropelando-se uns aos outros. Abriu caminho por entre a multidão até chegar ao local de distribuição.

“Comecei a tactear em busca das caixas de ajuda e peguei num saco que parecia arroz”, contou. “Mas, no mesmo instante, alguém mo arrancou das minhas mãos. Tentei segurar-me, mas ele ameaçou esfaquear-me. A maioria das pessoas ali carregava facas, quer para se defender, quer para roubar os outros. Por fim, consegui tirar quatro latas de feijão, um quilo de bulgur e meio quilo de massa. Em poucos instantes, as caixas estavam vazias. A maioria das pessoas ali, incluindo mulheres, crianças e idosos, não recebeu nada. Alguns imploraram para que outros partilhassem. Mas ninguém se podia dar ao luxo de abdicar do que conseguiu.”

Os empreiteiros americanos e os soldados israelitas que supervisionavam o caos riram e apontaram as armas à multidão. Alguns filmaram com os seus telemóveis.

“Minutos depois, granadas de fumo vermelho foram lançadas para o ar”, recordou. “Alguém me disse que era o sinal para evacuar a área. Depois disso, começaram os tiros pesados. Eu, o Khalil e alguns outros fomos para o Hospital Al-Awda em Nuseirat porque o nosso amigo Wael magoou a mão durante a viagem. Fiquei chocado com o que vi no hospital. Havia pelo menos 35 mártires mortos no chão de um dos quartos. Um médico disse-me que todos tinham sido trazidos nesse mesmo dia. Cada um deles foi baleado na cabeça ou no peito enquanto faziam fila perto do posto. de atendimento. As suas famílias aguardavam-nos para regressar a casa com comida e ingredientes.

A GHF é uma   criação do Ministério da Defesa de Israel, financiada pela Mossad, que tem um contrato com  a UG Solutions e  a Safe Reach Solutions, geridas por antigos membros da  CIA  e  das Forças Especiais dos EUA. A GHF é  liderada pelo  Rev. Johnnie Moore, um sionista cristão de extrema-direita com laços estreitos com Donald Trump e Benjamin Netanyahu. A organização também  contratou  gangues anti-Hamas que traficam drogas para prestar segurança em locais de ajuda humanitária.

Como disse à Al Jazeera Chris Gunness, antigo porta-voz da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA),   o GHF é uma "lavagem de ajuda", uma forma de mascarar a realidade de que "as pessoas estão a ser forçadas à submissão pela fome".

Israel, juntamente com os EUA e os países europeus que fornecem armas para sustentar o genocídio, optaram por desconsiderar a  decisão de Janeiro de 2024  do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), que  exigiu  protecção imediata para os civis em Gaza e uma ampla prestação de assistência humanitária.

O Haaretz, no seu artigo intitulado “‘É um campo de extermínio’: os soldados das FDI recebem ordens para disparar deliberadamente sobre os residentes de Gaza desarmados que aguardam ajuda humanitária”, noticiou que os comandantes israelitas ordenam aos soldados que abram fogo contra multidões para as manter longe dos locais de ajuda ou dispersá-las.

“Os centros de distribuição abrem normalmente apenas durante uma hora todas as manhãs”, escreve o Haaretz. “De acordo com os oficiais e soldados que serviram nas suas áreas, as FDI disparam sobre as pessoas que chegam antes da hora de abertura para as impedir de se aproximarem, ou novamente após o encerramento dos centros, para as dispersar. Como alguns dos tiroteios ocorreram à noite — antes da abertura — é possível que alguns civis não conseguissem ver os limites da área designada”.

“É um campo de extermínio”, disse um soldado ao Haaretz. “Onde eu estava destacado, entre uma e cinco pessoas eram mortas todos os dias. São tratados como uma força hostil — sem medidas de controlo de multidões, sem gás lacrimogéneo — apenas fogo real com tudo o que se possa imaginar: metralhadoras pesadas, lança-granadas, morteiros. Depois, assim que o centro se abre, os tiros param e eles sabem que se podem aproximar. A nossa forma de comunicação é o tiroteio.”

"Abrimos fogo de manhã cedo se alguém tentar entrar na linha a algumas centenas de metros de distância, e às vezes simplesmente atacamos a curta distância. Mas não há perigo para as forças", explicou o militar. "Não tenho conhecimento de um único caso de fogo de retorno. Não há inimigo, nem armas."

Disse que a mobilização nos locais de ajuda é conhecida como "Operação Peixe Salgado", uma referência ao nome israelita para o jogo infantil "Luz vermelha, luz verde". O jogo foi  apresentado  no primeiro episódio do thriller distópico sul-coreano Round 6, no qual pessoas financeiramente desesperadas são mortas enquanto lutam entre si por dinheiro.

Israel  destruiu  as infraestruturas civis e humanitárias em Gaza. Reduziu os palestinianos, meio milhão dos quais enfrentam a fome, a rebanhos desesperados. O objetivo é quebrar os palestinianos, torná-los maleáveis ​​e induzi-los a abandonar Gaza para nunca mais regressarem.

Fala-se, na Casa Branca de Trump, num cessar-fogo. Mas não se deixe enganar. Israel não tem mais nada a destruir. Os seus bombardeamentos de saturação ao longo de 20 meses reduziram Gaza a uma paisagem lunar. Gaza é inabitável, um deserto tóxico onde os palestinianos, vivendo no meio de lajes de betão partidas e poças de esgoto sem tratamento, carecem de alimentos e água potável, combustível, abrigo, electricidade, medicamentos e infra-estruturas para sobreviver. O último obstáculo à anexação de Gaza são os próprios palestinianos. São o alvo principal. A fome é a arma preferida.

IMAGEM: “Famintos de paz” – Mr. Fish

Fonte

quarta-feira, 25 de junho de 2025

Governo extremado e pouco moderado

Imagem: “Sem stress” - Henricartoon

Durante a campanha eleitoral falou-se muito da necessidade de um governo do “centro”, constituído por forças “moderadas”, e o foco propagandístico foi dirigido sobretudo para a classe média, para os filhos família que foram beneficiados com garantias do estado na aquisição de habitação. As promessas estão no programa do governo, menos 500 milhões de euros de IRS para os que mais ganham até ao fim do ano e menos 2 mil milhões até ao fim da legislatura, menos IRC para as empresas, que acabam de ser presenteadas com 315 milhões de euros, ao abrigo do famigerado PRR, com os benefícios fiscais a atingirem mais de 2 mil milhões nestes dois anos de governo, 2024 e 2025. No entanto, são prometidos 2% do PIB para a Defesa já para este ano, ou seja, para a indústria da guerra. Uns “miseráveis” 5,7 mil milhões de euros, que passarão para os “3,5% nos próximos 10 anos”, promessa de Montenegro, ou para os 5% ainda antes da data estabelecida. Política que tem o apoio do PS e dos partidos mais à direita no Parlamento. Este governo, mais extremado do que moderado, apostou lançar o povo português na miséria e na guerra, para salvação dos rendimentos da elite e na obediência servil e torpe perante os ditames da potência imperial e do seu braço armado NATO. Em simultâneo, protege e fomenta disfarçadamente os grupos neonazis na esperança que estes venham a ser a tropa de choque contra os trabalhadores em caso de revolta por esta política celerada.

A política migratória do governo só irá aumentar o número de ilegais

Antes de empoleirar-se no governo pela segunda vez, Montenegro e e a sua associação partidária não incluíram no programa, que então presentearam o eleitorado com a verba que iriam destinar aos negócios da guerra, nem com outras medidas que agora foram enfiadas no projecto governativo. Enganaram mais uma vez o povo português, parece que uma parte dele até nem desgosta, tirando da cartola as já anunciadas mudanças na lei da greve e nas leis laborais, a revisão da Lei de Bases da Saúde, para a privatização mais rápida e segura da saúde em Portugal, e a revisão da Lei da Imigração, em debate neste momento no Parlamento a pedido “urgente” do partido da extrema-direita, mas que já tinha sido prevista e planeada pelo governo e até debatida.

Imigração sim, mas para os especuladores imobiliários, as mafias que vêm lavar dinheiro através dos vistos gold, trabalhadores especializados que porventura tenham a triste ideia de para aqui virem viver, o que é pouco provável. Os próprios migrantes dos palops serão postergados para cidadãos de segunda e com mais dificuldade de adquirir autorização para trabalhar, reunir a família, ou adquirir a nacionalidade portuguesa, cidadãos que até 24 de Abril eram considerados portugueses. O travar da imigração ilegal ficará mais no papel do que na realidade prática, porque irá colidir com as necessidades dos empresários em abundante mão-de-obra barata e facilmente descartável, ou com a concretização de grandes projectos que não avançarão ou terão dificuldade em fazê-lo, como está já a acontecer em Sines, com a Administração do Porto de Sines a precisar de preencher 1800 postos de trabalho, mas com os concursos a ficarem desertos porque simplesmente não há oferta de casas. O capitalismo nacional para não soçobrar precisa urgentemente de escravos.

Ficou-se a saber há pouco tempo que um dos clientes da empresa familiar do primeiro-ministro Spinumviva tinha como sócia, em negócios imobiliários na cidade de Espinho, uma empresária moçambicana que tem sobre si um mandado de captura internacional, por acusação de associação criminosa, financiamento ao terrorismo, fraude fiscal e branqueamento de capitais, dando bem a ideia em que mundo se move a actividade profissional de Montenegro. Que se saiba esta empresária de sucesso não teve dificuldade de entrar no país, ter aqui as suas negociatas e viver sem ter problemas com a justiça.

À semelhança da empresária moçambicana, não consta que a famigerada, mas já esquecida, empresária angolana Isabel dos Santos tenha tido alguma vez problema com o então SEF, como, por exemplo, ser detida para interrogatório como aconteceu com o malogrado trabalhador imigrante ucraniano Ihor Homenyuk. Com a nova Lei da Imigração haverá via verde para os criminosos, clientes ou não da empresa familiar de lavagem de dinheiro, traficantes e afins; entretanto, os migrantes que entram em Portugal continuarão a ser ilegais e mão-de-obra escrava. E o número irá aumentar substancialmente, como afirmou o bispo do Porto, porque simplesmente é impossível impedir os movimentos migratórios.

Aumentar as restrições à entrada de trabalhadores imigrantes e dificultando a aquisição da nacionalidade portuguesa com a argumentação falaciosa de que já existe um grande número de estrangeiros em Portugal, o que poderá provocar maior conflitualidade social, tem sido apresentado, pelos comentadores avençados, como uma habilidade táctica de Montenegro de retirar capital político à extrema-direita. Ora, isto não passa de uma outra habilidade ou falácia, porque Montenegro ao elogiar o canoísta português: “É esta a raça lusitana” apenas deixou falar o coração de indivíduo de extrema-direita, embora disfarçado, e de um retinto reaccionário e racista. Iremos observar, ao longo da legislatura, o esbater das diferenças qua ainda possam haver entre o chefe do governo e o auto-intitulado chefete da oposição.

O racismo serve como instrumento para aumentar a divisão entre trabalhadores e intensificar a sua exploração, possui uma função económica, para além de constituir uma crença sem qualquer fundamento científico. No género Homo só existe uma linhagem ou raça que é o Homo Sapiens Sapiens, que saiu de África há cerca de 250 mil anos, e o povo português é o resultado de uma miscigenação ao longo dos séculos, onde os genes subsarianos, árabes e magrebinos são abundantes, atingindo os 20% no total. Os próprios europeus não passam de híbridos, como cerca de 3% de genes de neandertais, enquanto os “puros” sapiens são os !Kung San, um povo tradicional do deserto do Kalahari. Para quem não saiba, a heterozigotia é sinónimo de mais saúde, de ausência de doenças genéticas, ao contrário da “pureza da raça”, ou seja, da homozigotia. A família dos Habsburgos, que casavam entre si, são o bom exemplo das anomalias físicas e da extinção. Mas, não há nada a fazer, os políticos ignorantes são geneticamente racistas.

Canhões em vez de manteiga é a política típica dos partidos da guerra

A retirada do RASI (Relatório Anual de Segurança Interna) da informação sobre o perigo da actividade dos grupos neo-nazis em Portugal, não se deveu, como alguém do governo quis dar a entender, a ministra da Administração Interna se não estamos em erro, à actuação de vigilância sobre um desses grupos, mas a uma displicência sobre o assunto, é que estes grupos geralmente fazem o trabalho sujo das polícias e sempre foram monitorizados quando não protegidos pelos comandos policiais.

Não há motivo para qualquer admiração quando se soube que à frente do grupo Movimento Armilar Lusitano se encontrava um chefe da PSP, não deixando de ser interessante que a maior parte da imprensa de referência tenha escondido no início o posto do referido polícia, de possuir ramificações dentro da GNR a da Marinha. Em vez de ser a polícia a reprimir os trabalhadores imigrantes, são estes bandos de rufias e de jagunços, constituídos maioritariamente por lúmpenes, que executam as tarefas que repugnam às autoridades do establishment. E quanto à actuação destas imitações das Sturmabteilung sem farda, os trabalhadores emigrantes portugueses, nomeadamente na Alemanha, possuem alguma experiência bem sofrida na pele, incluindo mortes.

A par da repressão sobre os trabalhadores mais vulneráveis, para já, porque a “limitação” do direito à greve dos trabalhadores, maior controlo dos trabalhadores do sector estado, depressa a repressão se globalizará sobre todo o mundo do trabalho. O governo vai-se rebaixando perante os ditames de Bruxelas e das imposições do imperialismo norte-americano, através da sua máquina de guerra NATO. Fica bem à vista a natureza de um governo que aceita caninamente ultrapassar a despesa de 2% do PIB com a dita “Defesa”, rapidamente aumentada para 3,5% e de seguida para os 5%, quando desinveste na Saúde, na Educação, admite privatizar a Segurança Social e o resto dos transportes ferroviários, não resolve o problema da habitação para as famílias dos trabalhadores, deixando que se tenha regressado a situação muito semelhante à que existia durante o Estado Novo; só na Grande Lisboa já se contabilizam mais de 27 bairros de barracas ainda mais miseráveis que as de outrora. Vai-se gastar milhões em armas e soldados, mas não se contratam médicos, enfermeiros ou professores com salários dignos.

O governo foi interpelado pelos partidos da oposição de esquerda quanto à utilização da base das Lajes nos Açores e pelo embaixador do Irão em Lisboa "se alguém participa numa guerra, é parte dessa agressão". Em relação à primeira, demorou e não satisfez na resposta, apresentou a utilização como uma inevitabilidade do pseudo-contrato feito com os EUA, “pseudo” porque o Império nada paga pela ocupação de uma parcela do território nacional; em relação à segunda interpelação, o governo pouco ou nada terá dito refugiando-se no colo do Trump, à semelhança do que tem feito em relação à guerra da Ucrânia. Este governo mais não é que uma peça menor da estratégia belicista norte-americana e europeia. Tal como o governo PS, o governo PSD é arrogante com os fracos e subserviente perante os fortes, próprio de invertebrados e geneticamente lacaios. Desde há muito que o povo português reclama a saída de Portugal da NATO e a expulsão das tropas norte-americanas do território nacional. Não queremos ser nem protetorado nem colónia de ninguém, queremos ser soberanos.

Os quarenta anos de länder da Europa e a crise crónica da economia

Montenegro esteve na cerimónia dos 40 anos da assinatura do Tratado de Adesão à CEE, nos Jerónimos, tomando o lugar de Mário Soares, o homem de mão da Alemanha em Portugal, de quem recebeu um partido financiado pela social-democracia germânica. Ambos criados de libré, faltou-lhes o casaco branco e a toalha dobrada no braço. Ambos, como todos os primeiros-ministros que se sucederam entre os dois, são responsáveis pela degradação do aparelho produtivo do país, da nossa inaudita dependência económica e política, e pela criação de uma elite parasitária, de novos ricos, uma burguesia rentista, que terá custado “mais de 160 mil milhões de euros”, que são exactamente os fundos de “apoio europeu”, de que o povo não beneficiou mas que tem pagado durante este tempo todo com língua de palmo.

São as manchetes da imprensa mainstream que revelam a pobreza: endividamento da economia, empresas, famílias e estado, cresce para 829,5 mil milhões de euros, a maior de sempre; recuo nas exportações de bens em Abril agravando o défice da balança comercial; volume de negócios na indústria recua 3,4% em Abril; PIB português teve o terceiro pior desempenho da Zona Euro no primeiro trimestre; Cruz Vermelha apela à mobilização nacional para combater pobreza e solidão; 660 mil pessoas em Portugal vivem preocupadas por não terem comida suficiente, principalmente aquelas que têm crianças a cargo; turismo é o setor com mais trabalhadores pobres, mais de um quinto daqueles que trabalham no alojamento ou na restauração vivem na pobreza, a realidade na agricultura é também muito próxima, assim como na construção civil; quase um terço do país vive na pobreza ou perto disso, número de pobres e excluídos teima em rondar os dois milhões, mas, pouco acima do limiar da pobreza, há mais um milhão vulnerável; privações estão a subir entre os não pobres, incluindo na habitação e saúde; ranking anual do CWUR mostra uma degradação do panorama global das instituições de ensino superior portuguesas, entre as 13 representadas, só três sobem face a 2024.

Bruxelas não deixa margem para dúvidas na “recomendação”: a Comissão Europeia exige que Portugal “reforce as despesas globais com a defesa e a prontidão em consonância com as conclusões do Conselho Europeu de 6 de Março de 2025″, que classificou a guerra na Ucrânia como “um desafio existencial para a União Europeia”; e a englobar nos 5% do PIB impostos pela NATO/Trump. Mas, para continuar a enganar o eleitorado, o novo/velho governo PSD/Montenegro veio com as “10 medidas para mudar o país” para, diz ele, “valorizar o trabalho e a poupança, o mérito e a Justiça Social”, apontando para um salário mínimo de 1.100 euros, salário médio 2.000 euros, e nenhum pensionista terá rendimento abaixo de 870 euros durante a legislatura. Ora, não passam de rematadas mentiras que, por outro lado, têm como objectivo retirar as bandeiras aos partidos de esquerda. Em suma, apresentar-se perante a classe média como o salvador da pátria. Mas será mais o salvador dos empresários parasitas e do capitalismo nacional meio falido; contudo, sempre à custa de uma maior exploração do povo trabalhador e do empobrecimento do cidadão comum em geral.

Este governo é um governo de guerra contra o povo e de nós todos apenas merece o maior repúdio e combate.

quinta-feira, 19 de junho de 2025

O Estado e a Guerra

 

Por Giorgio Agamben

Aquilo a que chamamos Estado é, em última análise, uma máquina de fazer a guerra, e mais cedo ou mais tarde esta vocação constitutiva acaba por emergir para além de todos os propósitos mais ou menos edificantes que ela possa dar para justificar a sua existência. Isto é particularmente evidente hoje. Netanyahu, Zelenskiy, os governos europeus perseguem a todo o custo uma política de guerra para a qual se podem certamente identificar propósitos e justificações, mas cujo motivo último é inconsciente e assenta na própria natureza do Estado como máquina de guerra. Isto explica porque é que a guerra, como é evidente para Zelenskiy e para a Europa, mas também no caso de Israel, é travada mesmo à custa de enfrentar a sua própria possível autodestruição. E é vão esperar que uma máquina de guerra possa parar perante este risco. Continuará até ao fim, seja qual for o preço que tiver de pagar.

14 de junho de 2025

Quodlibet

Ucrânia: O gigante russo acordou! - Carlos Latuff

Fim da Ucrânia

A guerra na Ucrânia aproxima-se do seu fim, que, seja como for, coincidirá inevitavelmente com o colapso da "antiga República Socialista Soviética da Ucrânia" (antes da qual nunca existiu um Estado ucraniano, e convém lembrar que a Crimeia, que Zelensky insiste em afirmar, só foi unida à República Soviética da Ucrânia em 1954 por Khrushchev e, segundo o censo desse ano, era povoada por 72% de russos). Como a classe dirigente europeia tem repetido incansavelmente: estaremos com a Ucrânia até ao fim. Mas este fim envolverá inevitavelmente também o destino da Europa. O que fará e o que dirá a Europa quando o fim da Ucrânia, que ajudou a tornar catastrófico, for um facto consumado? De acordo com as previsões dos observadores políticos mais astutos, é provável que até a identidade da actual comunidade europeia, que não tem outra realidade jurídica que não seja a de um acordo internacional entre Estados, seja revogada e posta em causa. E esta é a única consequência positiva que podemos esperar da guerra na Ucrânia, caso contrário, como todas as guerras, é desastrosa.

13 de junho de 2025

Quodlibet

Imagem de destaque: Descobrindo a verdade - José Alberto Rodríguez Avila

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Gente muito pouco patriótica na colónia à beira-mar plantada

 

Crónica republicada de 2016 sobre a subserviência da elite nacional ("nacional" somente no nome) e a situação de pobreza crescente do povo resultante da entrada de Portugal na então CEE, que na prática terá sido mais a anexação do País pela potência dominante, Alemanha. A partir de 1 de Janeiro de 1986, Portugal passou a ser uma colónia ou região (länder) europeia, no entanto, a elite enriqueceu, formando-se uma nova oligarquia, que neste momento aposta abertamente numa solução política de extrema-direita para melhor garantir os dividendos e privilégios.

Gente muito pouco patriótica

Marcelo foi a Roma ver o Papa e beijou-lhe o anel, segurando-lhe na mão sem se ajoelhar, como era costume antigo, convidando-o a visitar o país (cuja resposta ficou no segredo divino e presidencial) e de regresso visitou o rei Filipe VI de Espanha e VII de Portugal, a quem transmitiu a preocupação pelo domínio cada vez maior da banca nacional pela espanhola; foi a primeira saída ao estrangeiro do 20º, ou 19º se não contarmos Bernardino Machado duas vezes. O homem é católico e Espanha está aqui mesmo ao lado e há que velar pelas boas relações com os nuestros hermanos, já que eles são o principal parceiro económico, nas exportações e nas importações. Contudo, a viagem pode ser, e é na realidade, uma manifestação de subserviência, embora manhosa, como é habitual entre a nossa elite visceralmente provinciana.

Relacionado com esta visita de vassalagem e de validação externa, já antecipadamente efectuada por Bruxelas/Juncker, do cargo da personagem, ocorreram as manifestações dos produtores nacionais de leite e de carne de porco contra as também cada vez maiores importações daqueles produtos de países terceiros, à frente dos quais se encontra, outra coisa não seria de esperar, os produtores a vizinha Espanha. As reivindicações são elementares, a reposição do sistema de quotas leiteiras, favorecimento da distribuição da produção nacional por parte das grandes superfícies comerciais, etiquetagem dos produtores estrangeiros, benefícios fiscais por parte do governo e da segurança social, ou seja, proteccionismo contra a concorrência externa, em contradição aberta com as regras da UE, sem contudo colocarem em causa a permanência de Portugal nesta comunidade económica e política ou na zona euro.

Esperar que o ministro da agricultura, já experiente nestas andanças, e o governo de que faz parte façam alguma coisa de concreto para salvaguardar a produção nacional é qualquer coisa como ficar à espera de Godot, ou seja, esperem sentados, porque as medidas que aí virão serão medidas impostas por Bruxelas para proteger os grandes produtores europeus, franceses e alemães à cabeça, onde se enquadra a intenção de baixar a produção para teoricamente aumentar o preço, o que levará à aniquilação mais rápida das produções da periferia europeia. A entrada de Portugal para a então CEE teve exactamente esse pressuposto, o país deixaria de produzir para passar a comprar aos países do centro da Europa, e Bruxelas foi benevolente enviando milhões de marcos, e mais tarde milhões de euros (a mesma moeda com outro nome), a fim de indemnizar a burguesia nacional e comprar apoios internos; passados 30 anos, o resultado está à vista, mas se não tivesse acontecido essa dita "adesão", o resultado seria semelhante embora em tempo mais dilatado e sem o bónus das comissões. Temos de reconhecer que a burguesia nacional foi esperta, a nossa classe média é que não teve vistas largas e deixou-se enganar, agora é tarde.

Ora, a grande distribuição está-se nas tintas para o facto de "os agricultores estão a morrer no campo" e preferem comprar ao estrangeiro mais barato, com a subsequente maximização da margem do lucro, do que comprometer-se "a comprar a produção portuguesa". O chefe do grupo Pingo Doce/Jerónimo Martins é suficientemente claro ao afirmar, aquando da sua recente visita ao país do narcotráfico da América Latina, que o "peso do sector público em Portugal está a matar lentamente o peso do sector privado", o quer dizer que o governo deve baixar os impostos às empresas e fazer tudo o mais que estiver ao seu alcance para que os patrões nacionais aumentem o mais possível os seus lucros na competição que enfrentam com os restantes; ter a sede das empresas na Holanda, onde pagam metade dos impostos do que pagariam se estivessem em território nacional, não parece ser suficiente, quer mais, não deixando de frisar que "as empresas que não ganhem dinheiro são empresas sem futuro".

A partir da data de adesão à CEE/UE formou-se uma oligarquia rentista

Como se pode constatar, mais uma vez, os casos que o comprovam são muitos, se há uma classe média ou pequena parte da classe possidente em Portugal que aposta no proteccionismo, uma outra, que predomina, aposta numa maior liberalização e aposta na internacionalização dos seus negócios em mercados em ainda abertos do que o nosso e dirigidos por elites ainda mais corruptas. Contudo, não deixa de ser interessante ouvir da boca do Presidente da Associação Comercial de Lisboa – Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, um dos que faz negócio à custa do estado em termos de monopólio (foram claras as suas intenções em querer transformar os estivadores em escravos, aquando das últimas greves), defender que os capitalistas nacionais devem “comprar ou criar um banco” a fim de fazer frente à espanholização da banca portuguesa. Opinião que não parece ser compartilhada pelos seus comparsas da indústria do calçado, o tal sector da indústria nacional tão incensado pelos propagandistas do capital nacionais, que após investigação da polícia judiciária acabam de ser acusados pelo Ministério Público de lavagem de dinheiro e de terem escondido 2,6 milhões em off-shores, Ilhas Caimão e Reino Unido, defraudando assim o fisco e as contas públicas, o que nem sequer constituirá ponta de iceberg da verdadeira dimensão do patriotismo da nossa tão estimada e nacionalista burguesia.

Portugal é dominado por uma burguesia compradora e inútil, verdadeira oligarquia, que vai sobrevivendo do parasitismo dos recursos públicos e do estado, que é também o seu instrumento de repressão sobe os trabalhadores, que defende o proteccionismo quando isso lhe interessa e o seu contrário, o ultra-liberalismo, sendo então mais papista que o Papa se isso lhe trouxer algumas vantagens. Uma classe com fim historicamente anunciado para breve, apesar de não ter morte datada, contorcendo-se por entre o processo de acumulação e concentração capitalistas, temendo menos a concorrência brutal e desapiedada, que está na alma do capitalismo, do que a eventualidade, mais do que certa, de uma nova forma de organização da economia e da sociedade a que podemos dar o nome de socialismo.

Os pequenos agricultores nacionais para sobreviver terão de se organizar e o socialismo é a saída

Mais do que ser "indispensável a regulação legislativa e a fiscalização da actividade dos hipermercados", como reclamam os suinicultores e os produtores de leite, cada vez se torna necessário, não havendo outro caminho, o controlo da grande distribuição pelo próprio estado, o único capaz de exercer um controlo severo e eficaz sobre as importações, venham elas de Espanha ou de outro país; mas, para se atingir este objectivo, o país terá de sair do euro e da União Europeia, mesmo que ainda durante algum tempo e para as trocas comerciais com o exterior venha a manter o euro.

Será com o apoio do estado que os produtores se poderão organizar para fazer frente à concorrência estrangeira e não "morrerem" de forma violenta, como acontecerá com a UE capitalista; o socialismo será também a única alternativa. Para os nossos propagandistas e partidos do poder, só é problema se houver mais estado na economia se for português, porque se for chinês não parece haver qualquer problema atendendo às chorudas comissões pela venda dos activos públicos e, com alguma sorte, para gestão dos mesmos já sob propriedade estrangeira: "Estado chinês ganha quase 400 mil euros por dia na EDP" (é título na imprensa/propaganda nacional, tal como "Aumento do salário do presidente da EDP para 6.800 euros por dia...").

A pobreza é o indicador que mais se desenvolveu após a adesão à União

Enquanto tudo isso, ficamos a saber que: uma em cada 14 famílias portuguesas salta refeições por não ter dinheiro, ou seja, sofre de "insegurança alimentar grave", um eufemismo elegante para designar simplesmente "fome sem disfarces”; o governo PS/Costa fez as contas e entendeu que atribuir os extintos passes "4-18" e "sub 23" a todos os jovens portugueses, independentemente das respectivas condições socioeconómicas, "custaria 20 milhões de euros"; no entanto, vai dar 17 milhões de euros aos taxistas, mas que pode ir até ao 22 milhões, para se calarem e aceitarem a concorrência da Uber, que o governo conta em legalizar dentro em breve (mais um sector tradicional condenado a desaparecer, mas, diga-se em abono de verdade, os próprios nada têm feito para o evitar, bem pelo contrário).

No seu conjunto, a dita "economia nacional" não dá sinais de reanimação, se as importações tiveram uma ligeira diminuição em Janeiro, menos 1% em relação a Janeiro do ano passado, as exportações para os mercados extra-comunitários tiveram uma queda a pique, de 18,8% face ao mesmo mês de 2015 (e de 25,2% na comparação com Dezembro), não sendo compensadas com a ligeira subida para os países da União Europeia, apenas 4,5%. Claro que as explicações oficiais não se fizeram esperar: é devido à "volatilidade nos mercados financeiros" e à crise de alguns países como Angola dependentes do preço do petróleo; mas não à crise capitalista global de superprodução, da qual a Europa do Centro, rica e desenvolvida, não conseguiu ultrapassar, levando a OCDE e o FMI a reverem em baixa as previsões de crescimento mundial para este ano de 2016.

Não se deve igualmente ocultar que só 6,1% das empresas a operar no mercado português são exportadoras, e dizemos a "operar" porque muitas delas são empresas de capital estrangeiro, ou seja, não são portuguesas. E outra realidade, ainda mais importante e que também não deve ser minimizada ou iludida: nos primeiros dois meses do ano, 1.064 pessoas perderam o seu posto de trabalho na sequência de despedimentos colectivos, um aumento de 35,5% face ao mesmo período do ano passado (os dados são da Direcção Geral do Emprego e das Relações do Trabalho). Mais uma vez se constata que crescimento económico não é sinónimo de mais emprego, bem pelo contrário, nem de salários mais elevados, pela simples razão de que a economia de que se trata é a economia capitalista, a que não se pode mudar a natureza.

PS e PSD os dois agentes ao serviço de Bruxelas e do grande capital europeu

O mesmo se pode dizer em relação ao governo do Costa/PS, assim se compreende o que o Costa diz, e o Costa diz que banca precisa de "capital estrangeiro, seja ele espanhol, angolano, alemão ou americano”, isto é, ter um sistema financeiro “estabilizado e devidamente capitalizado”, salientando que Portugal é “uma economia aberta”. Costa vai reunir com a dita "empresária" angolana, filha do presidente do estado/máfia/corrupção de Angola, a fim de ultrapassar o também dito "impasse" no BPI, mais propriamente como entregar este banco, que já foi ex-libris da burguesia nacional do norte, à catalã La Caixa; acontecimento que parece ter agastado o Coelho da "Social-democracia, sempre!". É para se perguntar: qual será a comissão?

PS e PSD funcionam como dois partidos de angariação de emprego para a clientela e recebimento das comissões, para além, como é óbvio, de bem gerir os negócios do capital, independentemente da cor nacional; o PSD e PS chegam a aldrabar a inscrição de militantes na disputa entre caciques a ver quem alcança o pote: dirigentes do PS são condenados por falsificação de documentos no preenchimento de fichas de adesão ao partido; no PSD de Aveiro, secção de Ovar, num mês foram inscritos 418 novos militantes, 217 da freguesia de Esmoriz, dos quais 80 viviam na mesma rua e 17 na exacta mesma morada; são as peripécias dos partidos que vivem metendo a mão na massa, ao mesmo tempo que se desacreditam, desacreditam o próprio regime democrático burguês.

Em última hora, um acontecimento que bem revela que o PR Marcelo e o primeiro Costa estão, por enquanto, em sintonia na gestão dos interesses do capitalismo, foi o presidencial puxar de orelhas ao Coelho por este criticar a intervenção do governo nos negócios do BPI. Marcelo considera que está de acordo com a Constituição "a submissão do poder económico ao poder político", na prestidigitação de inverter a realidade e continuar a enganar os trabalhadores portugueses, simultaneamente chama a atenção para o facto de que não passa cheques em branco; se, por um lado, quer estar em sintonia com o governo no que concerne à política externa, e nesse sentido se deve entender a sua visita ao estrangeiro, e apoia algumas das suas diligências para a boa gestão dos negócios dos senhores do capital, não quer dizer que isso vá durar para sempre. O governo do Costa manterá por algum tempo o estado de graça… até ao dia que o povo e os trabalhadores portugueses percam a paciência.

23 de Março 2016