terça-feira, 15 de agosto de 2023

Quando os impostos sobre os trabalhadores aumentaram brutalmente

 Na senda da acumulação do capital

Desempregados à espera dos cabazes de natal, 2013 - Bruno Simões Castanheira - http://www.projectotroika.com/

Crónica escrita em tempos da troika e do governo de má-memória de Passos Coelho/Paulo Portas que subiu brutalmente os impostos lançando o povo português na maior das misérias. Agora, o Montenegro diz ter uma arma miraculosa para o bem-estar dos portugueses: "descer os impostos"!....

Os trabalhadores pagaram IRS em 2013 como nunca tinham feito, foram esbulhados pelo estado capitalista em mais 3223 milhões de euros, mais 35,5% do que em 2012, totalizando 12.308 milhões de euros, ou seja, 34% do total das receitas fiscais; enquanto isso, os patrões beneficiaram de perdões fiscais (mais de mil milhões de euros em 2012), viram o IRC aliviado em 2% e, em futuro próximo, o IRC será para diminuir ainda mais para, segundo o jargão, atrair capital estrangeiro e arrancar com o “milagre económico”. E o IRS subir mais um pouco, já que “Portugal tem hoje um número de escalões que não existe em outros países europeus”, diz o secretário de estado. E a hipótese de cortes adicionais nos salários não está descartada porque “não é possível cumprir o objetivo de baixar os impostos em 2015 sem controlar a despesa pública”, diz o ministro.

Esta sangria dos rendimentos do trabalho para o capital parece que não tem fim, a política de austeridade veio para ficar pela simples razão de que o capitalismo não saiu, nem parece sair, da crise onde se atolou pelas sua própria natureza, e os números estão aí. Entre 2008 e 2012, depois do eclodir da crise com o rebentamento da bolha especulativa dos créditos subprimes e da falência do norte-americano Lehman Brothers, os estados europeus apoiaram os bancos nacionais de forma encoberta em cerca de 1,33 biliões de euros, isto é, cerca de 10,3% do Produto Interno Bruto da União Europeia, para além dos apoios directos e oficiais de 634,1 mil milhões de euros, cerca de 5% do PIB; ou seja, no total foram 15,3% da riqueza da Europa que foram entregues ao bandido (bancos).

Mas o saque não ficará por aqui, porque a situação de bancarrota não foi superada, os bancos da Zona Euro ainda precisam de mais 767 mil milhões de euros, o quer dizer que mais de 20% da riqueza produzida na Europa será delapidada pelos bancos. A saída da crise terá forçosamente de passar pelo superar do sistema económico capitalista e a primeira medida inevitavelmente será a nacionalização por cada estado de todo o sistema bancário e financeiro.

Mas para quem ainda tenha dúvidas, os recentes números quanto à grande concentração de riqueza em menos de 1% da população com o concomitante empobrecimento da restante população são mais que esclarecedores. A metade mais pobre da população mundial possui a mesma riqueza que as 85 pessoas mais ricas do mundo, segundo relatório recente da ong Oxfam; cerca de 1% dos mais ricos aumentaram os rendimentos em 24 dos 26 países, para os quais os dados estão disponíveis, entre 1980 e 2012, e que sete em cada dez pessoas vivem em países onde a desigualdade económica aumentou nos últimos 30 anos; entre estes países encontra-se Portugal onde os rendimentos dos 1% dos mais ricos mais do que duplicaram desde 1980. Haverá melhor prova de que o capitalismo é insaciável na sua ânsia pela acumulação e que esta tem sempre no polo oposto a mais absoluta miséria?

A continuação do capitalismo levará à sua implosão e à destruição da própria humanidade pelo interminável empobrecimento de mais de 99% da população, para além da exaustão dos recursos do planeta. Não há que reformar ou instituir regras à exploração do trabalho pelo capital, há sim que quebrar esta cadeia, começando por estoirar com a cadeia imperialista que subjuga Portugal ao domínio da Alemanha, com a saída do euro.

Esta luta contra o sub-imperialismo alemão passa em primeiro lugar pela luta sem tréguas contra as elites nacionais que partilham em menor grau do bolo resultante do saque sobre o povo português. Elites que têm como modo de sobrevivência a corrupção e o compadrio, a mesma Oxfam, no relatório "Governar para as elites: sequestro democrático e desigualdade económica", conclui que a concentração de 46% da riqueza em mãos de uma minoria supõe um nível de desigualdade "sem precedentes" que ameaça "perpetuar as diferenças entre ricos e pobres até as tornar irreversíveis".

Os casos mais recentes de políticos enfiados até aos gorgomilos na corrupção são esclarecedores: o pregador moralista Marques Mendes, cuja empresa mas não a pessoa (note-se a nuance) enganaram o fisco em 773 mil euros com a venda ilegal de acções; e o actual secretário de Estado da Segurança Social, Agostinho Branquinho, que, aquando deputado, pressionou ao licenciamento do hospital privado S. Martinho, de um amigo seu, em que uma denúncia (!) de corrupção foi usada como instrumento de pressão. Gente sem moral que gosta de enviar o produto do saque pessoal para os paraísos fiscais, como agora ficou mais uma vez provado com a divulgação dos dados da investigação internacional sobre o universo dos paraísos fiscais da nova burguesia chinesa, já conhecida por “Chinaleaks”, e onde foram encontrados 18 registos que ligam Portugal.

Enquanto medra a corrupção e sobe o saque (a dívida das empresas públicas subiu 565 milhões de euros desde a chegada da troika, atingindo já os 47 mil milhões de euros, 28,4% do PIB nacional), o povo é mantido no engano para deixar-se roubar, pelo menos é o que se retira dos dados do inquérito feito pela AMI que traça o perfil da pessoa em situação de pobreza: uma mulher desempregada, entre 40 e 59 anos, escolaridade entre o 2º e 3º ciclo do ensino básico, e carências alimentares.

A burguesia e o seu governo celerado contam com a despolitização de largo sector do povo e daquele que sendo pobre não tem consciência do facto, como o universo inquerido pela ong nacional que, por sua vez, recebe muitos milhares de euros do erário público: apesar de 88% dos entrevistados terem um rendimento per capita inferior a 421 euros, apenas 48% consideravam estar em situação de pobreza. Em relação às camadas mais combativas do povo trabalhador lá estão os sindicatos com a UGT à cabeça com a lenga-lenga esfarrapada de “temos o dever de não derreter a esperança dos portugueses”, qual esperança? em quem? e em quê?

Os trabalhadores portugueses há muito que perderam a esperança neste governo e nesta política, contudo, não sabem ainda qual o caminho a seguir porque não vêem alternativa ao actual regime democrático burguês e ao sistema de exploração que por detrás se encontra. Uma das razões desta falha de perspectiva são os actuais partidos, nomeadamente os partidos que se reivindicam da esquerda comunista ou revolucionária que são mais papistas que o papa, teimando em manter a luta no actual quadro institucional. Contudo, não estará longe o dia em que esta barreira será rompida. Nada existe para sempre.

31 de Janeiro de 2014 

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