terça-feira, 1 de agosto de 2023

SUBTERRÂNEOS DA HISTÓRIA

 

por Manuel António Pina

Talvez a verdade não venha sempre ao de cima (não vem de certeza), mas às vezes lá vai emergindo, aqui e ali. Dessa, a que tem chegado nos últimos tempos aos jornais é suficiente para termos perdido as últimas réstias de confiança, os que ainda tínhamos alguma, na boa fé dos governos cuja propaganda constantemente nos fala de valores (a “democracia”, a "civilização ocidental", os "direitos humanos", a "liberdade"...). Os relatórios da Amnistia Internacional e da Human Rights Watch sobre as políticas de tortura sistemática adoptadas por EUA e Reino Unido na "guerra suja " contra o terrorismo são a ponta do "iceberg" de uma realidade que não é, infelizmente, de hoje.

Sabe-se agora que, enquanto, em Nuremberg, julgavam os nazis, ingleses e americanos tinham, ali ao lado, os seus próprios e secretos "Auschwitzs". O do Reino Unido, revela o "Guardian", era em Bad Nenndorf (perto de Hanover). Aí eram presos e sujeitos a tortura homens e mulheres suspeitos de "simpatias comunistas" e as chocantes fotografias desses prisioneiros que o "Guardian " publica não são diferentes das dos "esqueletos vivos" dos campos de concentração nazis ou do “gulag” soviético. A diferença é que os nazis perderam a guerra e eles é que foram julgados...

(in JN, 05/04/2006)

A Grã-Bretanha possuía programa secreto de tortura de presumíveis comunistas durante a Guerra Fria

 O jornal The Guardian publicou as fotos de cidadãos vítimas de um programa secreto de interrogatórios e de torturas levado a cabo pelo governo britânico em território da Alemanha ocupada, nos primeiros tempos da Guerra Fria.

Segundo o mesmo jornal diário, as fotos mostram homens torturados, privados durante vários dias do sono e de alimentos, submetidos a espancamentos e a temperaturas extremas em centros de detenção do ministério da Guerra britânico.

Alguns destes cidadãos acusados de “actividades e simpatias comunistas” morreram de inanição e vítimas de maus tratos e de tortura; esta praticada por instrumentos que tinham sido encontrados em prisões pertencentes à Gestapo nazi.

Os indivíduos que aparecem nestas fotografias eram supostos comunistas, detidos em 1946, e manifestando simpatia pela União Soviética, que, pouco tempo antes, era aliada da Grã-Bretanha na luta contra o III Reich. O governo britânico de então (e não só) acreditava na inevitabilidade de uma guerra com o bloco soviético, o que justificava o uso de todos e quaisquer métodos para a obtenção de informações sobre o outro lado.

Os militares britânicos torturaram também dezenas de mulheres, bem como agentes soviéticos e alguns cidadãos suspeitos de simpatias nazis. Foi tudo metido no mesmo saco. Afinal, a tortura não é de agora e não são só os americanos que torturam, os súbditos de Sua Majestade Britânica possuem também as mãos sujas de sangue.

Logo que a notícia foi publicada, o porta-voz do Partido Liberal para os assuntos militares, Nick Harvey, na oposição, insistiu que o Ministério da Defesa reconheça o ocorrido, não deixando de dizer, ao mesmo tempo, que “ainda que seja demasiado tarde para se exigir responsabilidades concretas”. No entanto, Sherman Carroll, da Fundação Médica para o Cuidado das Vítimas da Tortura, pediu às autoridades britânicas que apresentem as devidas desculpas e recompensem financeiramente os sobreviventes.

As fotos foram tiradas em Fevereiro de 1947 por um oficial da Marinha Britânica, desejoso que o governo britânico pusesse fim ao programa secreto de torturas. Só agora as fotos foram tornadas públicas porque se quis fazer tarde (dar conhecimento público) o que nunca deveria ter acontecido.


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