Crónica republicada de 2016 sobre a subserviência da elite nacional ("nacional" somente no nome) e a situação de pobreza crescente do povo resultante da entrada de Portugal na então CEE, que na prática terá sido mais a anexação do País pela potência dominante, Alemanha. A partir de 1 de Janeiro de 1986, Portugal passou a ser uma colónia ou região (länder) europeia, no entanto, a elite enriqueceu, formando-se uma nova oligarquia, que neste momento aposta abertamente numa solução política de extrema-direita para melhor garantir os dividendos e privilégios.
Gente muito pouco patriótica
Marcelo foi a Roma ver o Papa e beijou-lhe o anel, segurando-lhe na mão sem se ajoelhar, como era costume antigo, convidando-o a visitar o país (cuja resposta ficou no segredo divino e presidencial) e de regresso visitou o rei Filipe VI de Espanha e VII de Portugal, a quem transmitiu a preocupação pelo domínio cada vez maior da banca nacional pela espanhola; foi a primeira saída ao estrangeiro do 20º, ou 19º se não contarmos Bernardino Machado duas vezes. O homem é católico e Espanha está aqui mesmo ao lado e há que velar pelas boas relações com os nuestros hermanos, já que eles são o principal parceiro económico, nas exportações e nas importações. Contudo, a viagem pode ser, e é na realidade, uma manifestação de subserviência, embora manhosa, como é habitual entre a nossa elite visceralmente provinciana.
Relacionado com esta visita de vassalagem e de
validação externa, já antecipadamente efectuada por Bruxelas/Juncker, do cargo
da personagem, ocorreram as manifestações dos produtores nacionais de leite e
de carne de porco contra as também cada vez maiores importações daqueles
produtos de países terceiros, à frente dos quais se encontra, outra coisa não
seria de esperar, os produtores a vizinha Espanha. As reivindicações são
elementares, a reposição do sistema de quotas leiteiras, favorecimento da
distribuição da produção nacional por parte das grandes superfícies comerciais,
etiquetagem dos produtores estrangeiros, benefícios fiscais por parte do
governo e da segurança social, ou seja, proteccionismo contra a concorrência
externa, em contradição aberta com as regras da UE, sem contudo colocarem em
causa a permanência de Portugal nesta comunidade económica e política ou na zona
euro.
Esperar que o ministro da agricultura, já
experiente nestas andanças, e o governo de que faz parte façam alguma coisa de
concreto para salvaguardar a produção nacional é qualquer coisa como ficar à
espera de Godot, ou seja, esperem sentados, porque as medidas que aí virão
serão medidas impostas por Bruxelas para proteger os grandes produtores
europeus, franceses e alemães à cabeça, onde se enquadra a intenção de baixar a
produção para teoricamente aumentar o preço, o que levará à aniquilação mais
rápida das produções da periferia europeia. A entrada de Portugal para a então
CEE teve exactamente esse pressuposto, o país deixaria de produzir para passar
a comprar aos países do centro da Europa, e Bruxelas foi benevolente enviando
milhões de marcos, e mais tarde milhões de euros (a mesma moeda com outro
nome), a fim de indemnizar a burguesia nacional e comprar apoios internos;
passados 30 anos, o resultado está à vista, mas se não tivesse acontecido essa
dita "adesão", o resultado seria semelhante embora em tempo mais
dilatado e sem o bónus das comissões. Temos de reconhecer que a burguesia
nacional foi esperta, a nossa classe média é que não teve vistas largas e
deixou-se enganar, agora é tarde.
Ora, a grande distribuição está-se nas tintas
para o facto de "os agricultores estão a morrer no campo" e preferem
comprar ao estrangeiro mais barato, com a subsequente maximização da margem do
lucro, do que comprometer-se "a comprar a produção portuguesa". O
chefe do grupo Pingo Doce/Jerónimo Martins é suficientemente claro ao afirmar,
aquando da sua recente visita ao país do narcotráfico da América Latina, que o
"peso do sector público em Portugal está a matar lentamente o peso do
sector privado", o quer dizer que o governo deve baixar os impostos às
empresas e fazer tudo o mais que estiver ao seu alcance para que os patrões
nacionais aumentem o mais possível os seus lucros na competição que enfrentam
com os restantes; ter a sede das empresas na Holanda, onde pagam metade dos
impostos do que pagariam se estivessem em território nacional, não parece ser
suficiente, quer mais, não deixando de frisar que "as empresas que não
ganhem dinheiro são empresas sem futuro".
A partir da data de adesão à CEE/UE formou-se
uma oligarquia rentista
Como se pode constatar, mais uma vez, os casos
que o comprovam são muitos, se há uma classe média ou pequena parte da classe
possidente em Portugal que aposta no proteccionismo, uma outra, que predomina,
aposta numa maior liberalização e aposta na internacionalização dos seus
negócios em mercados em ainda abertos do que o nosso e dirigidos por elites
ainda mais corruptas. Contudo, não deixa de ser interessante ouvir da boca do
Presidente da Associação Comercial de Lisboa – Câmara de Comércio e Indústria
Portuguesa, um dos que faz negócio à custa do estado em termos de monopólio
(foram claras as suas intenções em querer transformar os estivadores em
escravos, aquando das últimas greves), defender que os capitalistas nacionais
devem “comprar ou criar um banco” a fim de fazer frente à espanholização da
banca portuguesa. Opinião que não parece ser compartilhada pelos seus comparsas
da indústria do calçado, o tal sector da indústria nacional tão incensado pelos
propagandistas do capital nacionais, que após investigação da polícia
judiciária acabam de ser acusados pelo Ministério Público de lavagem de
dinheiro e de terem escondido 2,6 milhões em off-shores, Ilhas Caimão e Reino
Unido, defraudando assim o fisco e as contas públicas, o que nem sequer
constituirá ponta de iceberg da verdadeira dimensão do patriotismo da nossa tão
estimada e nacionalista burguesia.
Portugal é dominado por uma burguesia compradora e inútil, verdadeira oligarquia, que vai sobrevivendo do parasitismo dos recursos públicos e do estado, que é também o seu instrumento de repressão sobe os trabalhadores, que defende o proteccionismo quando isso lhe interessa e o seu contrário, o ultra-liberalismo, sendo então mais papista que o Papa se isso lhe trouxer algumas vantagens. Uma classe com fim historicamente anunciado para breve, apesar de não ter morte datada, contorcendo-se por entre o processo de acumulação e concentração capitalistas, temendo menos a concorrência brutal e desapiedada, que está na alma do capitalismo, do que a eventualidade, mais do que certa, de uma nova forma de organização da economia e da sociedade a que podemos dar o nome de socialismo.
Os pequenos agricultores nacionais para sobreviver terão de se organizar e o socialismo é a saída
Mais do que ser "indispensável a
regulação legislativa e a fiscalização da actividade dos hipermercados",
como reclamam os suinicultores e os produtores de leite, cada vez se torna
necessário, não havendo outro caminho, o controlo da grande distribuição pelo
próprio estado, o único capaz de exercer um controlo severo e eficaz sobre as
importações, venham elas de Espanha ou de outro país; mas, para se atingir este
objectivo, o país terá de sair do euro e da União Europeia, mesmo que ainda
durante algum tempo e para as trocas comerciais com o exterior venha a manter o
euro.
Será com o apoio do estado que os produtores
se poderão organizar para fazer frente à concorrência estrangeira e não
"morrerem" de forma violenta, como acontecerá com a UE capitalista; o
socialismo será também a única alternativa. Para os nossos propagandistas e
partidos do poder, só é problema se houver mais estado na economia se for
português, porque se for chinês não parece haver qualquer problema atendendo às
chorudas comissões pela venda dos activos públicos e, com alguma sorte, para
gestão dos mesmos já sob propriedade estrangeira: "Estado chinês ganha
quase 400 mil euros por dia na EDP" (é título na imprensa/propaganda
nacional, tal como "Aumento do salário do presidente da EDP para 6.800
euros por dia...").
A pobreza é o indicador que mais se
desenvolveu após a adesão à União
Enquanto tudo isso, ficamos a saber que: uma
em cada 14 famílias portuguesas salta refeições por não ter dinheiro, ou seja,
sofre de "insegurança alimentar grave", um eufemismo elegante para
designar simplesmente "fome sem disfarces”; o governo PS/Costa fez as
contas e entendeu que atribuir os extintos passes "4-18" e "sub
23" a todos os jovens portugueses, independentemente das respectivas
condições socioeconómicas, "custaria 20 milhões de euros"; no entanto,
vai dar 17 milhões de euros aos taxistas, mas que pode ir até ao 22 milhões,
para se calarem e aceitarem a concorrência da Uber, que o governo conta em
legalizar dentro em breve (mais um sector tradicional condenado a desaparecer,
mas, diga-se em abono de verdade, os próprios nada têm feito para o evitar, bem
pelo contrário).
No seu conjunto, a dita "economia
nacional" não dá sinais de reanimação, se as importações tiveram uma
ligeira diminuição em Janeiro, menos 1% em relação a Janeiro do ano passado, as
exportações para os mercados extra-comunitários tiveram uma queda a pique, de
18,8% face ao mesmo mês de 2015 (e de 25,2% na comparação com Dezembro), não
sendo compensadas com a ligeira subida para os países da União Europeia, apenas
4,5%. Claro que as explicações oficiais não se fizeram esperar: é devido à "volatilidade
nos mercados financeiros" e à crise de alguns países como Angola
dependentes do preço do petróleo; mas não à crise capitalista global de
superprodução, da qual a Europa do Centro, rica e desenvolvida, não conseguiu
ultrapassar, levando a OCDE e o FMI a reverem em baixa as previsões de
crescimento mundial para este ano de 2016.
Não se deve igualmente ocultar que só 6,1% das
empresas a operar no mercado português são exportadoras, e dizemos a
"operar" porque muitas delas são empresas de capital estrangeiro, ou
seja, não são portuguesas. E outra realidade, ainda mais importante e que
também não deve ser minimizada ou iludida: nos primeiros dois meses do ano,
1.064 pessoas perderam o seu posto de trabalho na sequência de despedimentos
colectivos, um aumento de 35,5% face ao mesmo período do ano passado (os dados
são da Direcção Geral do Emprego e das Relações do Trabalho). Mais uma vez se
constata que crescimento económico não é sinónimo de mais emprego, bem pelo
contrário, nem de salários mais elevados, pela simples razão de que a economia
de que se trata é a economia capitalista, a que não se pode mudar a natureza.
PS e PSD os dois agentes ao serviço de
Bruxelas e do grande capital europeu
O mesmo se pode dizer em relação ao governo do
Costa/PS, assim se compreende o que o Costa diz, e o Costa diz que banca
precisa de "capital estrangeiro, seja ele espanhol, angolano, alemão ou
americano”, isto é, ter um sistema financeiro “estabilizado e devidamente
capitalizado”, salientando que Portugal é “uma economia aberta”. Costa vai
reunir com a dita "empresária" angolana, filha do presidente do
estado/máfia/corrupção de Angola, a fim de ultrapassar o também dito
"impasse" no BPI, mais propriamente como entregar este banco, que já
foi ex-libris da burguesia nacional do norte, à catalã La Caixa; acontecimento
que parece ter agastado o Coelho da "Social-democracia, sempre!". É
para se perguntar: qual será a comissão?
PS e PSD funcionam como dois partidos de
angariação de emprego para a clientela e recebimento das comissões, para além,
como é óbvio, de bem gerir os negócios do capital, independentemente da cor
nacional; o PSD e PS chegam a aldrabar a inscrição de militantes na disputa
entre caciques a ver quem alcança o pote: dirigentes do PS são condenados por
falsificação de documentos no preenchimento de fichas de adesão ao partido; no
PSD de Aveiro, secção de Ovar, num mês foram inscritos 418 novos militantes, 217
da freguesia de Esmoriz, dos quais 80 viviam na mesma rua e 17 na exacta mesma
morada; são as peripécias dos partidos que vivem metendo a mão na massa, ao
mesmo tempo que se desacreditam, desacreditam o próprio regime democrático
burguês.
Em última hora, um acontecimento que bem
revela que o PR Marcelo e o primeiro Costa estão, por enquanto, em sintonia na
gestão dos interesses do capitalismo, foi o presidencial puxar de orelhas ao
Coelho por este criticar a intervenção do governo nos negócios do BPI. Marcelo
considera que está de acordo com a Constituição "a submissão do poder
económico ao poder político", na prestidigitação de inverter a realidade e
continuar a enganar os trabalhadores portugueses, simultaneamente chama a atenção
para o facto de que não passa cheques em branco; se, por um lado, quer estar em
sintonia com o governo no que concerne à política externa, e nesse sentido se
deve entender a sua visita ao estrangeiro, e apoia algumas das suas diligências
para a boa gestão dos negócios dos senhores do capital, não quer dizer que isso
vá durar para sempre. O governo do Costa manterá por algum tempo o estado de
graça… até ao dia que o povo e os trabalhadores portugueses percam a paciência.
23 de Março 2016