Nos próximos 4 anos iremos ter um governo de
maioria absoluta de cor “rosa”. Era um governo deste género, que garanta a
estabilidade política, o Santo Graal da gestão capitalista do estado e da
economia, que era desejado pelas nossas elites, e por Bruxelas. Como pouca
gente acreditava numa maioria socialista, e muito menos laranja, os desejos que
se manifestavam eram, e em falta de melhor, o de um governo de bloco central,
como aliás tem acontecido desde sempre até aqui, na prática e na maior parte do
tempo. Nos últimos dois anos e sem geringonça formal a maior parte das leis
aprovadas na Assembleia da República foi graças aos votos conjuntos de PS e PSD
e contra os parceiros geringonços PCP e BE. O governo maioritário do
PS&Costa passou de facto a jure, nada mais. E com o andar da carroça, em
situação de agravamento profundo da crise da economia capitalista e subsequente
revolta social, será o PS a exercer o fascismo e Costa o novo
"racha-sindicalistas", parecido com o outro Costa da Primeira República
e que ditou o fim da dita.
Costa pode agradecer aos patetas do regime
Costa arriscou, seria agora ou nunca, e a
coisa até correu bem: será o senhor absoluto até 2026. E não se sentirá grande
diferença porque temos assistido a uma governação por decreto do governo PS em
todos os domínios, desde as medidas económicas, processo da concessão da
exploração do lítio, por exemplo, até aos confinamentos e ajustes directos das
aquisições de testes e vacinas, estas impostas por Bruxelas, a pretexto do
combate à pandemia. A repressão sobre os cidadãos com as restrições de
deslocação ou de frequência de locais públicos, com aberta e ostensiva
limitação dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, em flagrante
violação da Constituição da República, contando com o aval cego do Parlamento
ou a arrepio do mesmo, mostra que o governo socialista já era um governo de
maioria absoluta de facto. E com a colaboração de todos os partidos do regime
que não atacaram a política já intrinsecamente fascista, a pretexto, do combate
à pandemia, e, tal como o PS, se arvoraram em defensores do grande capital:
caricato, no mínimo, ver o PCP e o BE (os arautos da esquerda) a defender os
interesses da Big Pharma, pugnando pela vacinação em massa dos portugueses.
Os partidos da putativa “oposição”, tanto à
esquerda como à direita, só se podem queixar deles próprios, estenderam a
passadeira ao PS e ao Costa, devido ao seu oportunismo político, como, se lá
estivessem no governo, também fariam o mesmo, porque sabem que é condição sine
qua non para ter a mão no pote terem de aceitar caninamente as imposições do
regime e de Bruxelas. Quando, por alguma razão, não houver partidos de coluna
gelatinosa, então, não haverá eleições sequer. O que não acontecerá porque
candidatos a lacaios ou funcionários zelosos nunca faltarão, na medida em que,
neste país, sempre houve, e haverá, gente que vende a alma ao diabo por pouco
dinheiro. Basta olhar para a História nos momentos mais decisivos, em que o
país perdeu a independência ou teve que lutar para a não perder, séculos XIV,
XVI, XVII e XIX e actualmente com a entrada na CEE/UE. O medo incutido nas
pessoas a propósito da pandemia como que adormeceu muitos cidadãos das classes
médias mais temerosos e foi fácil ao Costa, aproveitando esse estado de alguma
apatia, surgir como um slavador da pátria. no entanto, o efeito será o oposto.
Vêm agora os analistas encartados e os media
mainstream tentar justificar a vitória do PS pela indecisão de um grande número
de cidadãos que só resolveu votar, e pelo candidato que achou melhor, à última
da hora, o que terá baralhado as sondagens. Não se diz, contudo, que as
sondagens são sempre manipuladoras, para induzir o voto no sentido do partido
que no momento melhor condições reúne para defender os interesses do
capitalismo nacional e de Bruxelas. Ou então encontrar explicação virada pelo
avesso, diabolizando os patetas dos parceiros da geringonça que reprovaram o
Orçamento, quando todos os partidos, incluindo o PSD, tomaram a mesma posição.
Nestas ocasiões há sempre quem se ponha a jeito para bombo da festa. Durante a
campanha eleitoral, principalmente durante os debates televisivos, Costa não
encontrou oposição, parecendo que todos os noves partidos do regime se
encontravam de acordo no que concerne ao essencial das políticas seguidas.
Quanto aos que levaram ao colo o PS à maioria
absoluta, talvez valha a pena fazer o balanço: em, 2015, quando se formou a
“geringonça”, o BE tinha 19 deputados e 550.892 (10,19%) votos e o PCP/PEV 17
deputados e 445.980 (8,25%) votos, enquanto o PS tinha 86 deputados e 1.747.685
(32,31%) votos, não tendo ganho sequer as eleições. O PCP, mais o seu anexo
PEV, e o BE entenderam por bem viabilizar um governo PS, pensando que, com esta
Santa Aliança de Esquerda, iriam resolver os problemas do país, ou aquilo que
entendem por “país”, e, eventualmente, ter acesso ao pote. As concessões que
receberam foram umas parcas migalhas, reposição dos dois meses de salários
retirados pelo governo anterior do PSD/PP/CDS aos trabalhadores do estado,
ligeira subida das pensões e reformas, e pouco mais. O governo entendeu não
reverter as alterações das leis laborais e, inclusivamente, ainda as piorou a
contento dos patrões.
No governo, o PS foi comprando os votos
O governo PS/Costa passou o tempo todo a
agitar a bandeira da subida do salário mínimo nacional enquanto os restantes
salários iam encolhendo por efeito da inflação, com o perigo de um dia destes a
maior parte dos trabalhadores vir a auferir o SMN. Costa prometeu acabar com a
precariedade do emprego e os salários miseráveis, muitas das vezes inferiores
ao salário mínimo, mas foi quem mais promoveu essa precariedade dentro do
estado, dando o exemplo pela negativa aos patrões. O sector onde mais
trabalhadores a prazo foram contratados foi na SNS, devido à pandemia covid-19,
precisamente aquele que foi mais degradado (intencionalmente), com o claro
intuito de acelerar a sua privatização, tendo agora um excelente pretexto: a
pandemia. BE e PCP sempre apararam o jogo, oferecendo a paz social a troco de
nada. Durante o governo da geringonça, entre 2015 a 2019, nunca houve tão
poucas greves e aquelas que aconteceram, por terem fugido ao controlo da
CGTP/PCP, levaram com a requisição civil em cima, fazendo corar de inveja
Marcelo Caetano ou até Salazar, estivadores, enfermeiros e motoristas de
matéria perigosa. Assim se explica que em 2019, o BE tenha perdido 50.875
votos, embora mantenha o mesmo número de deputados, e o PCP 113.507 votos e 5
deputados, enquanto o PS tenha ficado com 1.908.036 votos e 108 deputados,
podendo fazer um governo sem geringonços.
Não tendo nada aprendido, BE e PCP continuaram
a apoiar o governo, deixando passar os Orçamentos, ou com abstenção ou com voto
contra, sabendo de antemão que não seriam inviabilizados; ou seja, mantiveram o
oportunismo político que lhes é habitual. O PCP parece que tem medo de ser
ilegalizado algum dia, não ganhou para o susto em 1975 aquando do golpe de 25
de Novembro, que obrigou o secretário-geral Cunhal a refugiar-se na embaixada
da então Checoslováquia. E o BE continua a sonhar num futuro, que parece cada
vez menos próximo, vir substituir o PS na governação quando ele desaparecer, à
semelhança do que aconteceu com o PASOK. Mas as coisas não têm acontecido como
este partido esperava porque o PS ainda se vai aguentando, devido à habilidade
do Costa (temos de reconhecer) e à fé que a Alemanha ainda vai mantendo no
partido que ajudou a criar em 1973, através da Fundação Friedrich Ebert da
social democracia de Willy Brandt, o reconhecido informador encartado da CIA.
Soares e PS desempenharam um papel crucial na derrota da revolução de 75 ao
serviço não só da Alemanha, mas dos Estados Unidos, como bem atestou Frank
Carlucci, embaixador em Lisboa nos tempos quentes do dito PREC. Roma ainda vai
pagando aos traidores.
Depois de seis anos de historial de
oportunismo e traição, de que se queixam BE e PCP, para falar agora só destes?
De ingratidão, de pouca sorte, de falta de reconhecimento do povo e dos
trabalhadores pela bondade das medidas que, embora decretadas pelo PS, eram da
sua autoria? Pois é, o povo é burro e atrasado! Os resultados não poderiam ser
outros, dois anos depois: o PS subiu para 2.246.637 (41,68 %) votos e 117
mandatos, e os três patetas da política, ou idiotas úteis do regime, ficaram
apenas com 240.265 (4,46%) votos e 5 mandatos, e 236.635 (4,39%) votos e 6
mandatos, respectivamente; no total “deram” ao PS 25 deputados e 519.972 votos.
É o resultado da política calculista, em benefício exclusivo dos seus
interesses particulares, e o espelho da natureza de partidos da pequena
burguesia. Não ousam enfrentar a burguesia e o capitalismo, preferem
lamber-lhes a sola dos pés e ficar com as migalhas. Mas em tempos de crise
crónica e profunda do capitalismo, correm o sério risco de desaparecerem,
porque imprestáveis.
Costa já não precisa das muletas porque soube
comprar os votos e deixar em seco o seu principal rival que é o PSD, ainda o
partido por excelência da nossa burguesia conservadora e ainda com laivos de
nacionalismo e saudosismos coloniais. Comprou o voto de muitos patrões e de
alguns trabalhadores com a história dos layoffs, ao todo foram 7.744 milhões de
euros, o que dizem ter “a pandemia custado ao estado em 2021”; as empresas
ainda vão receber “compensação” pelo aumento do salário mínimo, isto é, este
vai ser subsidiado com os impostos e descontos dos trabalhadores; já foram
disponibilizados 650 milhões para capitalizar empresas, no âmbito do PRR; com o
Fundo de Capitalização e Resiliência a arrancar com 50% da dotação global para
recapitalizar empresas “de interesse estratégico nacional”, que já sabemos são
as grandes e/ou de capital estrangeiro. Mas, como se sói dizer, “quem não chora
não mama”, um dos incontornáveis pedintes dos dinheiros dos outros
(contribuintes) já veio fazer saber, e talvez com alguma razão, que "O
comércio é claramente menosprezado na proposta do PRR".
Costa comprou à direita e à esquerda, parece
que foram os idosos e pensionistas (temerosos da pandemia!?) que, à última da
hora, resolveram votar e a favor do PS, isto é, naquele que está e dá
segurança, porque se não dá muito, também não tira: 10 euros para as reformas
mínimas e em Maio, no quadro do futuro Orçamento, haverá um aumento
extraordinário. Só que agora haverá uma ressalva: não será preciso tirar, basta
não aumentar as pensões ou os salários em taxa igual à da inflação. A inflação
irá funcionar como o governo troikiano de Passos/Portas, e tudo indica que a
inflação em Portugal irá ultrapassar facilmente os 5% já atingidos em média na
União Europeia, visto que em Janeiro chegou aos 3,3%. Em 2026, no final do
mandato do governo absoluto do PS/Costa (e se chegar ao fim!), as pensões e os
salários serão ainda mais miseráveis do que agora.
Os tempos que se aproximam serão de
austeridade e de revolta
Os tempos que aí vêm são mais que sombrios:
Lagarde admite “preocupação unânime” no BCE sobre inflação e pistas sobre juros
só em Março. E estas pistas para a adivinhação facilmente se encontram nas
palavras do vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis e do
comissário para a Economia Paolo Gentiloni: o cenário de suspensão da
disciplina orçamental europeia além deste ano só ocorrerá em caso de um novo
“choque brutal”. Inflação elevada e por tempo indeterminado, subida das taxas
de juro em dimensão ainda desconhecida, que farão disparar enormemente os
custos das dívidas pública e privada, obrigatoriedade de se respeitar as regras
de disciplina orçamental, nada de bom será para os nossos reformados,
trabalhadores e povo em geral, porque somos nós que, em última estância,
pagamos a dívida contraída pelos capitalistas e recapitalizamos as suas
empresas. No entanto, em 2026, teremos mais desemprego e mais pequenos
empresários arruinados.
Costa agitou o espantalho do fascismo, na
pessoa de André Ventura e do seu agrupamento de jagunços e fascistas que
ousaram sair do armário do PSD e CDS, para meter medo à pequena burguesia
medrosa: ou votam em nós ou vem aí o fascismo! Esta tem sido a receita usada em
países como a França com a FN e a família Le Pen, que chegaram à final de uma
eleição presidencial em que o candidato politicamente correcto afinal defendia
os mesmos interesses e as mesmas elites do que os apontados como “tenebrosos
fascistas”. Em Portugal parece que querem replicar a estratégia e, para melhor
compreensão do fenómeno, seria bom conhecer não apenas quem financia o Ventura
mas quem afinal também financia o Costa, e ver que entre os dois não há
diferenças de monta quanto a interesses económicos ou de classes possidentes a
quem servem. Ambos defendem o capitalismo, em particular o grande capital
financeiro (os bancos, que estão no fim da linha do capitalismo), Bruxelas
(Alemanha) e, com maior proximidade, a nossa inútil e rentista burguesia. As
diferenças, como já referimos anteriormente e em ralação ao PSD, está apenas no
modo e no tempo. Daqui para a frente, repetir-se-á a estratégia, mas como a
História demonstrou: com o povo em luta, o fascismo é um tigre de papel, apesar
de acarretar custos enormes. Matar o capitalismo é matar o fascismo, não o
contrário, é cortar a cabeça à serpente.
O dirigente sindical amarelo e filho querido
dos capitalistas não se coibiu de afirmar, pouco tempo antes do dia das
eleições, que: "A maioria absoluta é um cenário que não rejeito". Querendo
dar a entender que o sector dos trabalhadores que ele pretende representar até
veria com bons olhos um governo de maioria, não seria um mal vindo ao mundo,
bem pelo contrário. E logo que se soube da vitória absoluta do PS, as agências
de anotação financeira vieram logo a terreiro, com a Fitch: “resultados eleitorais
trazem estabilidade e diminuem risco político”, e com “Eleições pintam Bolsa de
Lisboa a verde. CTT disparam 4,46%”. O capital financeiro rejubila e Bruxelas
mantem a confiança num partido e num governo capazes de impor os ditames para a
recapitalização das grandes empresas e bancos, mesmo que isso custe aos
trabalhadores e aos pequenos patrões nacionais muitos sacrifícios, incluindo a
sobrevivência. Se o governo de maioria absoluta, com o Costa a afirmar que
“"Uma maioria absoluta não é o poder absoluto", é capaz ou não de
fazer frente e dobrar a contestação social será uma coisa ainda para se ver,
assim como o PCP e o BE ainda estarão na disposição de colaborar nessa infame e
ingrata missão, como tem acontecido até agora.
Os partidos saídos do 25 de Abril perecerão
com o regime
Mas como já disséramos, em artigo anterior, os
partidos vão e vêm conforme as circunstâncias políticas e a necessidade da
classe ou estrato de classe que pretendem representar. Os partidos que nasceram
após o 25 de Abril, fruto das suas circunstâncias, irão de vela quando essas
mesmas circunstâncias desaparecerem ou forem alteradas profundamente.
Percebendo-se assim que o CDS está em vias de desaparecimento porque há muito
que esgotou a sua missão, que lhe foi entregue pelo governo de Vasco Gonçalves
de reter e controlar os fascistas do regime recém deposto; mais tarde e já em
plena decadência foi aproveitado por Portas para enriquecimento pessoal. PSD,
fundado por Sá Carneiro, simbólico representante da nossa velha burguesia, agora
com perda acentuada da sua tradicional base social de apoio e dominado por toda
a sorte de caciques, dá todos os indícios de fragmentação; iremos ver se terá
capacidade de regeneração ou será substituído pelo IL ou outros que se acharem
por mais conveniente. Costa teve a perspicácia de, caso se tivesse aliado ao
PSD em 2015 ou em 2019, teria sido ele a sofrer com o abraço do urso, assim
foram os trouxas do BE e do PCP; aprendeu com o que aconteceu com o PASOK que
desapareceu por se ter aliado ao partido de direita Nova Democracia.
Quanto ao BE e PCP, são dois partidos da
pequena burguesia, o primeiro da pequena burguesia urbana e com formação
académica mais elevada, o segundo de uma pequena burguesia menos escolarizada e
até rural, e a sua base proletária é cada vez mais minguada. O PCP já nem chega
a ser o tradicional partido revisionista, o dito partido burguês (pela
ideologia) para (consumo) operários. São ambos partidos que abraçaram a
social-democracia, rendidos às delícias do capitalismo e que a troco de algumas
benesses e sinecuras institucionais não lhes repugna ir enganando as massas
operárias e populares. Mas, caso a sua influência se verifique diminuta, e isso
mede-se em parte pelos resultados eleitorais, serão imediatamente descartáveis.
E jamais para lugares da governação, é que tudo que tenha o rótulo de
“esquerda” ou de “comunista” é repelido pela nossa ignorante burguesia e mesmo
por Bruxelas, tal é a fobia do comunismo. O desaparecimento de um PCP, que pode
ser uma coisa mais provável do que se possa pensar, mesmo que substituam o
bronco secretário geral, cujo mundo já desapareceu há muito, será sempre uma
coisa boa, deixa campo aberto para o surgimento de alternativas
revolucionárias.
Contra o governo de maioria absoluta, só
poderá haver luta absoluta.
03 de Fevereiro 2022
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