Dez anos depois das grandes manifestações, as maiores que se realizaram depois do 25 de Abril, superando as manifestações do 1º de Maio de 1974, que juntaram, segundo a imprensa, mais de 2 milhões de pessoas e que prenunciaram o fim do governo de Passos Coelho/PSD/PP, o governo do PS, chefiado por António Costa, dá mostras de que vai seguir as mesmas pisadas para enfrentar a crise da economia capitalista nacional e, com certeza, irá provocar as mesmas ou mais tormentosas reacções por parte do povo português. E, muito provavelmente, marcarão o fim não só do governo socialista como do próprio partido, à semelhança do que aconteceu com o PS francês e o PS grego.
Antes de se conhecer o já badalado “Acordo de
Rendimentos e Competitividade” fácil será imaginar o que sairá do ventre da
aventesma: diminuição do IRC compensado com aumento dos impostos para quem
trabalha (IRS), situação que não será muito diferente da tentativa da descida
da TSU por parte do governo PSD/PP; recapitalização das empresas com dinheiros públicos
a pretexto da mal amanhada “crise energética” – que, por sua vez, mais não é
que a crise da economia capitalista – e na linha da “crise pandémica”. Para
fazer adormecer o trabalhador desatento e o cidadão comum incauto, o governo
irá remendar com mais um subsídio de “125 euros” e mais um 50% de um mês de
pensão que não chegará para cobrir metade da inflação. Em relação aos salários,
os patrões não comeram as palavras: só admitem aumentos de 2,8% em 2023.
Portugal país mais desigual
Neste país cada vez mais desigual: Portugal
tem o maior agravamento da pobreza em 2021 e passa a oitavo pior da UE, com 2,3
milhões de pobres; entre os 62 milhões de milionários em todo mundo, 159 mil
são portugueses, com a riqueza global a somar, no final de 2021, 465 biliões de
euros. Destes, 45,6% eram propriedade de 1% das pessoas, o que representa mais
1,7% do que em 2020. Não fugindo à regra, a acumulação e concentração de
riqueza faz-se na mesma proporção entre nós, basta olhar para o aumento dos lucros
das principias empresas portugueses, embora algumas tenham a sede em paraísos
fiscais, e para o aumento dos rendimentos de quem trabalha. Prevê-se que os funcionários
públicos possam perder, em média, até 284 euros por mês, contando com o aumento
de 2% para 2023, muito abaixo da inflação que será este ano de 7,4% (?); aumentos
estes que são sempre uma referência para o sector privado.
Não é preciso ter um mestrado ou doutoramento
em economia para se perceber, qualquer merceeiro ou dona de casa o sabe por
experiência de vida, que, baixando os custos, no caso os do trabalho, e
aumentando as receitas com o aumento descontrolado do preço das mercadorias,
qualquer empresa terá garantido não só os lucros como o aumento dos mesmos.
Esta é a dinâmica, e faz parte da sua essência, da economia dos capitalistas, e
para assegurar este objectivo que o governo dito “socialista” e o seu chefete
se desdobram em malabarismo para sossegar as hostes dos “empresários de
sucesso” nacionais, conciliar estes interesses com os ditames de Bruxelas e
comprar a paz social. Diga-se de passagem que se trata de uma tarefa assaz
difícil e com a agravante de estarmos perante uma elite gananciosa e
insaciável.
As grandes empresas estão em primeiro lugar
Depois da promessa da linha de crédito
bonificado de 600 milhões de euros e de os 1,4 mil milhões de apoio terem sido
considerados como insuficientes e virem tarde, os nossos empreendedores, na sua
maioria (89%), clamam por mais. E a descida “transversal” do IRC, como o outro
Costa (ministro da Economia) prometeu, não chega, reivindicam agora que o “excedente
orçamental” (6,8 mil milhões, proveniente do aumento da colecta devido à
inflação) lhes seja enfiado nos bolsos. Como o ramo é verde há que carregar, o capitalista
frustrado chefe da CIP considera como certa a descida de 21 para 19% do IRC,
apesar de esta medida não constar nem do programa eleitoral do PS nem do
programa do governo aprovado no Parlamento. Só que Costa, industriado por
Bruxelas, já foi explícito: as medidas de apoio foram até ao máximo permitido
por Bruxelas; uma restrição que, segundo o nosso-primeiro, não é política nem
financeira, mas “legal”. Parece que ainda há boa gente que não percebeu o que
move realmente o governo e o chefe da comandita: as grandes empresas estão em
primeiro, a saúde e a segurança social, por exemplo, serão privatizadas mas a
favor dos grandes interesses financeiros, de preferência, internacionais.
Costa, sempre o Costa, diz que Portugal
apoiará a proposta de Bruxelas para taxar em 33% os lucros excessivos das
empresas de combustíveis fósseis, mas di-lo, e irá fazê-lo, a contra-gosto, porque
o seu coração está do lado das grandes empresas e não das pequenas ou médias
nacionais. E a razão é simples: para as grandes poderem continuar a crescer, e
a crescer de forma infinita na lógica do capitalismo, as restantes terão de ser
devoradas. Nenhum pequeno ou até médio empresário nacional se iluda porque a
descida o IRC irá ser pouco “transversal”, e o secretário dos Assuntos Fiscais
já se apressou de anunciar que o “choque fiscal não é a panaceia para resolver
os nossos problemas”, contradizendo, assim, o ministro da Economia e do (tão
cobiçado) PRR. Não será só a ganância que faz mexer os dirigentes das
associações patronais, nomeadamente da CIP e da AEP, mas a incerteza do quinhão
que lhes será destinado. É a União Europeia, que tanto desejaram e ainda
defendem, lhes deitará a pazada de terra em cima do caixão.
Crise com destino imprevisível
E o futuro não se mostra lá muito risonho para
as nossas elites compradoras e parasitas: “A economia portuguesa deverá
contrair 0,3% em 2023, segundo a estimativa feita por especialistas da Allianz
Trade, acionista da Companhia de Seguro de Créditos (COSEC)”. Por sua vez, o Eurostat
confirma inflação de 9,1%, na Zona Euro, e de 10,1%, na UE, no mês de Agosto, e
Portugal acima da média com 9,4%, inflação homóloga, pelo terceiro mês
consecutivo. Lagarde admite inflação acima da meta por mais tempo. Parece ser
uma recessão oportuna, porque se isto é benéfico para as grandes empresas, não
o será para as pequenas, cuja produção se dirige maioritariamente para o
mercado interno, na medida que haverá uma redução enorme do mercado por força
da forte diminuição do poder de compra dos trabalhadores e dos comuns cidadãos
nacionais. As falências em catadupa não se farão esperar nos próximos dois
anos; 2023 será mau e 2024 será péssimo.
Por outro lado, as grandes empresas poderão ficar descansadas no que diz
respeito aos apoios do estado: “Elétricas com falta de liquidez nos mercados
futuros terão auxílio estatal” ou “Ministro das Finanças assume que litígios
com Lone Star podem obrigar a mais dinheiro no Novo Banco”.
Outro guru do capitalismo reconhece que recessão
será "longa e feia", quase que dando a entender que a recessão terá
sido insuflada à medida, o sistema já aprendeu a tirar proveito das suas próprias
e inevitáveis crises. No quadro de afundamento generalizado das economias
europeias (défice na balança comercial da Zona Euro bate 34 mil milhões de
euros em Julho), com as dos países mais ricos à cabeça, causado pela própria
dinâmica do capitalismo, mas também agravado pelo política dos Estados Unidos
de lançar a União Europeia na guerra da Ucrânia, que se verá sem o acesso à
energia barata fornecida pela Rússia e sem o apoio das próprias empresas
norte-americanas. Nestas questões não há solidariedade, mas somente interesses
(negócios): “Barões do petróleo e gás dos EUA recusam apoio extra à Europa”. A
Velha Europa encontra-se em maus lençóis, de nada lhe valendo o mantra dos
direitos humanos e da tradição judaico-cristã; não haverá Nossa Senhora de
Fátima nem santo que a socorra. A sua implosão é incontornável e estará por
momentos.
A revolução proletária reentra na ordem do dia
As burguesias europeias temem a velha
toupeira, que vem fazendo silenciosamente o seu trabalho, com a corrida aos
armamentos que servirão não só para a guerra inter-imperialista mas para
reprimir internamente as revoltas operárias e populares que inevitavelmente
irão ocorrer e que já se fizeram anunciar. Guterres acaba de alertar para o
perigo do “Inverno de descontentamento global”, a revolução mundial preocupa o imperialismo.
“Descontentamento global” que poderá ser bem maior e mais ameaçador que as
manifestações e os pretensos “dias de luta” já publicitados pelas principais
centrais sindicais europeias para a primeira metade do próximo mês de Outubro.
A manobra, apressada e tosca, de “desdiabolizar” os partidos neo-nazis e
catapultá-los para o governo como “democráticos” e “civilizados, como garantia
da preservação do domínio burguês e capitalista, já aconteceu na Suécia, e irá
acontecer na Itália fazendo fé nas sondagens, e não deixa de revelar uma situação
de pânico por parte das elites. Será em modo mais soft do que aconteceu na
Ucrânia, o primeiro país da Europa onde os neo-nazis ocuparam lugares
governamentais.
Em Portugal, com a constante promoção e
regozijo de toda a imprensa mainstream nacional, somos matraqueados com o
caudilho dos fascistas indígenas a declarar que ainda será o primeiro-ministro
de Portugal, e, em caso de desespero e de último recurso, tudo se pode esperar
da nossa inútil elite. Ao acontecer a revolta, esta será reprimida, mas não abafada,
irá escalar para a revolução. O preço a pagar é que poderá ser elevado, no
entanto, será o resultado inevitável de se ter feito uma revolução castrada,
uma revolução com flores. A roda da história não pára e em tempo de guerra
inter-imperialista a revolução proletária e comunista reentra na ordem do dia!
Nenhum comentário:
Postar um comentário