terça-feira, 28 de abril de 2020

Há muito que os cravos estão murchos e o capitalismo moribundo

Capitalism and Covid 19 - Stephff

As celebrações do 25 de Abril (agora com “a” minúsculo) foram, este ano de 2020, menos que murchas, levadas a cabo por gente sofrendo de impotência e de obsessão compulsiva para a mentira e demagogia; um pouco pior do que no ano passado que foram simplesmente bafientas e deprimentes, denunciando a decrepitude irreversível, este ano foi o fim. Diz a imprensa corporativa que o PR Marcelo “deu o peito às balas”, defendendo a realização da cerimónia comemorativa na “casa da democracia”, contrariando a posição de ala mais à direita do seu partido e de outra opiniões (Cavaco, CDS, Chega, etc.) que acham que, sob o manto da pandemia, nada haveria a comemorar; não deixou de ser caricato ver o CDS a ser ultrapassado pela esquerda pelo chefe da ICAR portuguesa. Pudera! Marcelo já se encontra em campanha eleitoral para a reeleição, embora porfie em não pôr o cravo ao peito. E a figura patética do presidente da Assembleia da República não conseguiu conter-se e mandou mais uma patacoada, com já vem sendo habitual nos últimos tempos: “Portugal e os Portugueses estão vacinados contra a austeridade... Resta saber se a vacina tem 100% de eficácia..." Mesmo assim, o homem duvida.

Ora, a austeridade nunca deixou de estar presente entre os trabalhadores portugueses, desde a não restituição integral do que foi retirado desde o início da crise de 2008 até às alterações da Lei do Trabalho, feitas no sentido de extorquir maiores mais-valias aos trabalhadores, que não foram revogadas pelo governo do PS. E, agora, com o pretexto da pandemia pelo Sars-Cov-02, impôs-se o estado de emergência não para defender a saúde do povo português, mas para suspender as liberdades e os direitos dos trabalhadores a fim de lhes impôr também o estado de austeridade agravada, os números estão aí e não desmentem: quase 60% da população activa sofre uma redução de rendimentos “devido a perda de emprego ou à diminuição do trabalho como consequência da pandemia covid-19”. Quem o diz é a DECO, resultado obtido através de inquérito que, podendo sofrer de alguma margem de erro, não estará a dar uma imagem muito diferente da realidade. Mais concretamente: “35% dos trabalhadores mantêm o seu horário de trabalho, 30% estão temporariamente inactivos, por exemplo, em ‘lay-off’ (suspensão do contrato), enquanto 19% viram o seu horário reduzir-se, 9% perderam o emprego e apenas 7% estão a trabalhar mais horas”, e “dos que continuam a trabalhar, três em cada 10 fazem-no sempre a partir de casa, em teletrabalho, e cerca de um quinto (19%) labora parcialmente nestas condições”. Ninguém tenha dúvidas, foram medidas que a burguesia achou por necessárias, aliás, não tem outras, para tentar tirar a sua economia do estado de crise crónica e prestes a implodir, o coronavírus foi uma justificação quer para a origem da crise quer para a inevitabilidade de mais austeridade.

Quanto à austeridade, na prática, todos os partidos com assento em S. Bento estão de acordo, diferem somente no modo e no tempo de a aplicar, como e quando? Marcelo, Rui Rio e Costa, apesar deste disfarçar com alguma ambiguidade oratória, jogam abertamente no “Bloco Central”, Marcelo não deixou dúvidas e a imprensa de referência enfatizou. Os restantes partidos ou contradizem-se ou fazem contorcionismo para iludir o que sempre defenderam: a estabilidade, a continuação da paz social e o crescimento da dita economia nacional, melhor dizendo, o aumento dos lucros das empresas e enriquecimento dos seus acionistas que, agora, se desunham a pedir, ou a exigir, apoios de todo o género desde que seja a fundo perdido, entrar com os seus capitais pessoais ou familiares é questão liminarmente posta de lado, e sejam eles nacionais ou estrangeiros. Enquanto tal, os accionistas da Galp, que continua a vender os combustíveis quase ao preço do “Barca Velha” e compra o crude ao preço da uva mijona, decidiram distribuir entre si os cerca de 320 milhões de euros de dividendos, a duas semanas de suspender a actividade na refinaria de Sines e com o propósito claro, como outras tantas empresas, de a descapitalizar e posteriormente vir pedir apoio ao estado.

Tem sido quase comovente ouvir algumas propostas apresentadas pelos gurus da economia do regime, aliás, sempre os mesmos, para fazer face à “crise provocada pelo coronavírus”, uma crise que estava já presente muito antes do irromper do surto pandémico, o que é bom salientar a todo o momento para clareamento de algumas mentes, do género: “pagamento de metade dos subsídios de férias e de Natal de todos os trabalhadores em funções públicas em ‘Certificados de Aforro Solidários Covid-19’”; ora, quem é a iluminária? Não, não é o César das Neves o conselheiro excelso do Cavaco, mas um ex-deputado do dito “Partido Socialista”, um neo-liberal convicto Paulo Trigo Pereira, com o argumento de “basicamente, adiar consumo”, e que se poderia estender a todos os trabalhadores, caso estes quisessem. Esta até seria uma proposta interessante se fosse aplicada exclusivamente aos membros do governo ou aos deputados da Assembleia da República ou até ao PR monárquico Marcelo. Perante propostas deste género e provenientes de gente que de certeza não sentiu na carne e na algibeira a austeridade imposta pelo governo PSD/CDS anterior, é natural que haja trabalhadores e pessoas, cuja vida sempre foi uma vida de sacrifício e de crise permanente, que se irritem facilmente e de forma inclusivamente violenta. Razão esta para a preocupação do PR Marcelo de, no seu discurso, tentar “dar bom-senso” e acalmar as pessoas que “estão mais irritadas”, nas palavras de um pressuroso deputado socialista em rede social. Entretanto, houve alguém que foi para a janela de cravo na mão e a cantar a "Grândola Vila Morena". É bem possível, pelo andar da carroça e mesmo sem continuação da pandemia em hipotético segundo ou terceiro surto, que a canção que mais simboliza o 25 de Abril seja cantada, para o ano, nem dentro de casa.

O nosso primeiro Costa, acolitado pelo expertos do costume, tem repetido, quase até à náusea, que depois do estado de emergência, que ele até quer substituir pelo estado de calamidade pública, nada ficará ou será o mesmo até que haja uma vacina. O homenzinho quer continuar a jogar com o medo incutido em muitos cidadãos portugueses, que parecem preocupar-se mais com o vírus do que propriamente com o descalabro da economia, segundo sondagem divulgada por um jornal de negócios da classe dos patrões, opinião logo elogiada por se encontrar alinhada com a opinião única dominante “não há alternativa”, com o objectivo de impor formas de exploração ainda mais violentas que as actuais e com salários nominais ou reais ainda mais miseráveis. E o teletrabalho é apresentado como uma das sete maravilhas do “novo mundo”, fruto do desenvolvimento tecnológico, que já foi imposto a mais de 64 mil trabalhadores do estado, na sua maioria professores, que assim ficarão mais baratos ao estado, sem horário fixo, sem tempo para a família e para o lazer; isto é, cada vez mais escravos. O mesmo terá sucedido a grande percentagem dos trabalhadores no global, estado e privado; dos trabalhadores que estão a trabalhar, 30% estão em teletrabalho em casa, segundo dados do inquérito realizado pela DECO atrás referido. Será o paraíso na terra para os patrões que sempre almejaram, especialmente os patrões nacionais, ter trabalhadores baratos, de preferência a custo zero, fechados em casa, sem poderem protestar dentro da empresa, com dificuldades acrescidas para se organizar entre si, em estado de confinamento que mais não é que prisão domiciliária, embora o único crime que tenham cometido é o de serem trabalhadores por conta de outrém e possuírem como única fonte de rendimento a venda da sua força de trabalho.

O governo, o Costa, a histriónica ministra da Saúde, a moça de recados Directora Geral de Saúde e o mono Secretário de Estado da Saúde, até parecem gostar muito dos portugueses e dizem fazer muito por eles: querem estado de calamidade pública em vez estado de emergência, e se este foi imposto foi para fazer a vontade ao Marcelo, é o que dizem, e agora esperam receber ainda esta semana sete milhões e novecentas mil máscaras cirúrgicas e quatro milhões de máscaras com filtro, depois de terem andado semanas a fio a dizer aos estúpidos dos portugueses que o uso da máscara era contraproducente porque dava uma falsa sensação de segurança. Claro que esta será compra feita pelo governo no estrangeiro e por ajuste directo através de empresas privadas, que agora poderão embolsar muitos milhões de euros de lucro, em vez de se incentivar a indústria nacional ou aproveitar, reconvertendo-as caso necessário, as Oficinas Gerais de Fardamento e Equipamento (OGFE/Casão Militar) das Forças Armadas. Será para perguntar de quanto será ou já foi a comissão ou a propina de tão chorudo negócio que poderá ultrapassar os 300 milhões de euros? A par das negociatas não houve dinheiro, ou terá um sido “erro informático” bastante oportuno, é a ironia das aplicações se enganarem em certas ocasiões e sempre para os mesmos, para pagar os fracos, para não dizer miseráveis, aumentos e respectivos retroactivos a partir de Janeiro, para os trabalhadores da Saúde; que serão pagos, vamos lá ver, para o mês que vem. O que bem atesta da consideração que o Governo, e em particular as figuras atrás descritas, tem por estes trabalhadores que se encontram na linha da frente no combate à Covid-19. Muitas vezes, um acto vale por mil palavras. Tudo leva a crer que para o ano, como já disséramos anteriormente, não haverá aumentos para os trabalhadores da Função Pública.

A crise económica e capitalista agravada e posta a nu pela pandemia, mas não provocada por ela, demonstra-nos que um povo, um país, só podem fazer face de forma cabal, e sem prejuízo para o povo que luta e sofre, se tiver soberania económica, monetária e financeira, com controlo de capitais, com um sistema de crédito público ao serviço do progresso social do povo e não da especulação financeira e da fraude. Não será possível no quadro de uma capitalismo nacional e proteccionista, como muitos social-democratas da nossa praça defendem, alguns dos quais acoutados no BE e no PCP, mas num quadro de economia socialista, a única via sem alternativa para acabar de uma vez por todas com a escravatura assalariada. O pavor das elites e dos seus agentes na governação é mais que notório, estão assustados, não sabem o que fazer ao certo para conter a revolta do povo, que está latente mas pronta a irromper a qualquer momento. Estados de emergência ou de estados de calamidade pública são artimanhas temporárias, condenadas ao fracasso, pela simples razão de que a primeira metade deste século será o tempo do Comunismo. Enquanto a burguesia vai esgotando os meios para iludir a crise e enganar o povo, a velha toupeira é incessante no seu trabalho.

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