Abel Manta
O
Parlamento reuniu-se com 149 deputados e aprovou a renovação do
estado de emergência, por aconselhamento do executivo e com o
regozijo do Presidente Marcelo e da direita nacional, e precisamente
no dia em que se assinala o 44º aniversário da aprovação da
Constituição da República Portuguesa, o que não deixa de ser
tremendamente simbólico. Os partidos que se abstiveram, PCP, PEV,
Chega e deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, acabaram por
dar aval à situação de anormalidade para os trabalhadores e
regularizadora para os interesses dos grandes capitalistas e da União
Europeia - uma abstenção que vale por um sim - e o que é mau para
a maioria, é sempre bom para a minoria (1%) possidente e dominante.
Com o prolongamento do estado de emergência, a partir de agora em
versão hard, a democracia burguesa saída do golpe de estado do 25
de Abril finou-se, e os seus representantes máximos assinaram a
certidão de óbito. A partir de agora, não só em termos económicos
e sociais, mas essencialmente políticos, nada será igual. O
problema é que será pior para os trabalhadores e o povo, mas
igualmente para um grande número de pequeno-burgueses que serão
proletarizados de forma rápida, violenta e inesperada, pelo menos no
tempo. A pandemia pelo coronavirus teve somente o condão de acelerar
o processo de concentração capitalista e deu azo à burguesia, com
o pretexto de salvaguarda da Saúde Pública, para utilizar os meios,
já há algum tempo preparados, de controlo e de repressão do povo
É
fácil desmontar a argumentação apresentada pelos diversos
intervenientes na Assembleia da República, a começar pelo
primeiro-ministro Costa que em vez de se lamentar de que haverá
patrões a aproveitar-se da situação, para "abusar nas
relações laborais" e da "tentativa de aproveitamento
económico", deveria proibir liminarmente qualquer despedimento
independentemente do pretexto, com a pena da propriedade dessas
empresas passar ou para os trabalhadores ou para o Estado e
responsabilização criminal e cível dos patrões e com a
expropriação do património pessoal, ou até mesmo familiar. Só
assim se impedirá o desemprego em massa e se avaliaria se as
falências e os lay-offs são verdadeiros ou fraudulentos. Mas estas
medidas seriam possíveis se o PS fosse exactamente um partido
socialista, na verdadeira acepção da palavra, contudo, na prática,
não haverá outra solução que não traga mais miséria aos
trabalhadores e mesmo a alguns pequenos patrões que trabalham por
conta própria. Em situações de falência irrefutável, o Governo
deverá pagar os salários a esses trabalhadores e exigir a Bruxelas
uma compensação a fundo perdido, como indemnização pela
destruição da nossa economia por força de entrada do euro, já
para não falar na então CEE. As palavras do Governo e do PS, por
muito “duras” que pareçam, mais não serão que demagogia para
encobrir a real e verdadeira intenção de beneficiar as grandes
empresas e os bancos, que não final serão sempre eles a ganhar.
Passando
do Costa para os partidos que se abstiveram, PCP, por exemplo, que
chora, lambendo as lágrimas de eventualmente vir a perder o acesso
ao pote, perora que é preciso travar "a lei da selva contra os
trabalhadores" e "os despedimentos abusivos com recurso a
coação e ameaças"; lamento semelhante "o Governo tem é
que proteger o emprego e os salários" (BE, que aprovou pela
segunda vez o estado de emergência), sem querer beliscar a
estabilidade governativa ou a paz social. Ambos os partidos se sentem
unidos numa “frente nacional” contra a crise, não lhes
repugnando a entrada do PSD ou do CDS, ou qualquer outro partido, num
bloco central alargado. Na preocupação de salvar a democracia, só
temporária e parcialmente suspensa, no seu entender, estes partidos
ajudaram a cavar a sua sepultura, colaborando activamente na
implementação das “restrições injustificadas de direitos,
liberdades e garantias" que dizem temer e evitar. Aqui, o
deputado da Iniciativa Liberal foi mais inteligente, não deixando de
ser igualmente demagógico, ao votar contra a renovação do estado
de emergência.
O
dito “principal partido da oposição", PSD, esquecendo-de dos
muitos milhões que enfiou na banca e da trafulhice que foi a
falência do grupo Espírito Santo, veio defender, armado em
social-democrata e a salivar pelo pote, não só a declaração do
estado de emergência, que "evitou uma tragédia", mas
criticar, com aparente severidade, que "a Banca não pode ganhar
dinheiro com a crise... lucro zero em 2020”, porque “se a Banca
apresentar, em 2020 e 2021, lucros avultados, esses lucros serão uma
vergonha" (Rui Rio). A lata deste sujeito não fica atrás da do
Costa, estão bem um para o outro. Em relação ao par do PSD, o CDS,
o descaramento e a filho-da-putice não é menor, esquecendo-se que é
corresponsável pela descapitalização do SNS, tendo mandado emigrar
enfermeiros e médicos, durante quase cinco anos, "a prioridade
é a saúde pública" (Telmo Correia, o ministro dos 300
despachos em último ano de mandato). Quanto ao idiota útil do
deputado do Chega, ao serviço do grupo Cofina e da extrema-direita,
incluindo a que se encontra infiltrada nas polícias, mostrou a sua
verdadeira natureza de moleque para todo o serviço e de ausência de
programa político coerente. Por fim, o PAN, que passou de 1 deputado
para 1 grupo parlamentar nas eleições de Outubro, não consegue
esconder o objectivo para que foi engendrado, misturando ideias de
direita e de extrema-direita à pála da defesa dos animais e da
ecologia (agenda esta agora tão ao gosto do grande capital
internacional), o de apoio de emergência ao Governo, não se
coibindo de afirmar que estádisposto, caso seja necessário, a “ir
mais longe em alguns aspetos". “Proteger a economia é
proteger acima de tudo as pessoas", afirmou a chefe de bancada
do PS, e que quererá dizer as "pessoas dos capitalistas"
de quem é serventuária. E assim se finou a excelsa democracia da
dita “Revolução dos Cravos”.
A
grave crise económica por detrás da pandemia
Por
detrás da crise parlamentar e da sanitária pela pandemia, uma crise
de natureza económica há muito se avolumava e que agora se limitou
a mostrar-se, como a erupção de um vulcão que nunca deixou de
estar activo. E os números da situação catastrófica para a vida
dos trabalhadores estão aí bem visíveis e não enganam:
O
Governo já terá recebido mais de 3600 pedidos de empresas para
aderirem ao regime "lay off"; a TAP vai avançar com um
processo de "lay-off" para 90% dos trabalhadores; milhares
de queixas de trabalhadores já chegaram aos sindicatos e aos
partidos de “esquerda” com assento parlamentar sobre
despedimentos, não renovação de contratos, férias forçadas,
lay-off com perda de rendimentos, mudança de local de trabalho, ou
de denúncias sobre especulação de preços ou sobre insuficiências
nos serviços públicos; músicos da Orquestra do Norte não recebem
salário desde Janeiro; 350 mil trabalhadores a recibo verde correm o
risco de ficaram no desemprego em termos imediatos; 76 mil
trabalhadores estavam em lay-off há dois dias e o Governo calcula
que o número passará em breve para 1 milhão de trabalhadores,
muitos deles passarão para o desemprego (a taxa de desemprego de 6%
de Fevereiro passará ainda antes do final do ano para mais do dobro,
senão o triplo!); o ministro da Economia advogado dos negócios foi
claro: “Governo não sabe se poderá manter a promessa de aumentos
salariais de 1% na Função Pública”; as concessionárias das
auto-estradas já vieram reivindicar compensação por parte do
Estado devido à queda do tráfego (-80%); mais recentemente, a
Groundforce vai colocar em lay-off mais de 2400 trabalhadores e a
Transdev cerca de 2000; A CIP, pela voz do ex-militante do PS António
Saraiva não fez esperar a chantagem: “salvar as empresas neste
período, mais ou menos longo...”; e a verborreica Directora Geral
da Saúde veio alertar que a situação pandémica vai prolongar-se
por muitos meses... até que surja uma vacina para a população, ou
seja, até quando calhar.
E,
para completar, a Presidente da Comissão Europeia, a alemã Ursula
von der Leyen, não engoliu as palavras ao afirmar que todas as
alternativas estão em aberto, mas dentro da legalidade imposta pelo
Tratado; ou seja, haverá mais do mesmo de 2008: os países que se
endividem e logo se verá! Portugal com uma dívida pública e
privada já quase insuportável terá que se endividar ainda mais, o
que inevitavelmente irá provocar o descontentamento e a revolta do
povo, razão pela qual o Governo PS/Costa, depois de ter nomeado um
oficial de extrema-direita para o comando da PSP, pensa controlar os
portugueses através dos telemóveis e de câmaras portáteis de
vigilância, à semelhança do governo sionista de Israel que terá
sido pioneiro no assunto e aproveitando-se da pandemia, e
intensificar as operações de controlo pela PSP e GNR que, neste
momento, já detiveram 90 cidadãos que ousaram desrespeitar o
recolher obrigatório, numa manobra de intimidação sobre os
trabalhadores, com medo que este saiam à rua em manifestação ou
greves, revoltados pela suspensão dos salários e pelos
despedimentos. O combate ao coronavírus e a salvaguarda da Saúde
Pública vão ter costas bem largas, tal como está a fazer, mas sem
disfarces, o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán que passou a
governar por decreto, numa aberta deriva autoritária, afinal com a
complacência de Bruxelas, e perante as críticas vem acusando a
oposição de esta querer defender o vírus. Mais perigoso que o
coronavírus, é o vírus do fascismo, e ele já está aí; aliás,
sempre aqui esteve. Este sim é que é o principal inimigo que deve
ser combatido por todos nós e sem complacência, mas para o
exterminar teremos de acabar com o capitalismo, que é o terreno
fértil onde ele nasce e se desenvolve.
Se
no ano passado as comemorações do 25 de Abril foram umas
comemorações rançosas, este ano não se farão, ou a serem feitas,
serão dentro do Palácio de São Bento com os deputados com fumos na
lapela em vez de cravos, porque estes há muito já murcharam.
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