domingo, 26 de julho de 2020

O Costa, o “acordo histórico” e o “modelo novo”

"Subservient men" - Namio Harukawa (1947-2020)

Antes de ser selado o “acordo” entre os 27 estados da União, Costa veio perante os câmaras das televisões manifestar o seu optimismo quanto um acordo de um plano para a recuperação económica da União Europeia e, em particular, de Portugal, acordo que teria de ser um “modelo novo” quanto à estrutura e aplicação. Em suma, a lenga-lenga da concretização na prática da putativa “solidariedade”, tão badalada pelos países mais periféricos e dependentes, porque os outros, nomeadamente, os auto-denominados “frugais” (que ladram no lugar da Alemanha), já há muito que abandonaram essa linguagem hipócrita e enganadora. Como seria de esperar, os países ricos ouviram a pedinchice dos de chapéu na mão e acordaram no pacto para a pilhagem, logo considerado um "histórico resultado" pelo nosso PR Marcelo enquanto genuflectia no beija-mão ao corrupto monarca espanhol e à sua mais que desacreditada monarquia. Os subservientes agradecem reverentemente, salivando antecipadamente com a parca ração, porque até sabem que quem irá pagar serão sempre os do costume, o povo que labuta e se sacrifica.

Dizem que foi uma árdua maratona, de cinco dias, do Conselho Europeu, com o resultado final de 1,8 biliões de euros para “responder à crise deixada pela pandemia de covid-19”, como se a crise já não existisse e não fosse provocada pelas contradições próprias da natureza da economia capitalista, denominada por vezes e seraficamente de “economia de mercado”. Crise esta que mais não é que a continuação da crise de 2008, ou seja, uma crise dentro de uma crise mais profunda e arrastada e que agora se agravou pela sua própria natureza e pelas medidas que foram usadas há 10 anos e que só resultaram numa crise ainda mais violenta. É das leis da natureza que todas medidas usadas para fazer frente às crises do capitalismo se esgotam e provocam uma crise ainda maior. Em 2008 tratou-se de salvar os bancos, em primeira linha os grandes grupos financeiros que eram demasiadamente grandes para falir, agora, passados cerca de 10 anos, trata-se de salvar todas as grandes empresas económicas capitalistas e não somente as financeiras. É todo o sistema económico que se encontra à beira do precipício, com a falência antecipadas das pequenas empresas, como se está a verificar em Portugal, país com uma economia periférica a inteiramente dependente. Costa, Rio, Marcelo, Saraiva e restante burguesia parasitária e rentista, mais todo o séquito de comentadores e paineleiros arregimentados, aplaudem com ambas as mãos o maná dos 45 mil e 85 milhões de euros e o envelope de 15,3 mil milhões de euros (a usar até 2026), falsamente, a fundo perdido, salivam pelo enriquecimento fácil e pelas comissões respectivas.

Estes muitos milhões de euros jamais serão a fundo perdido e serão os trabalhadores e o povo, mais uma vez a, pagar a factura e desta feita com sacrifícios acrescidos, e inúteis porque é impossível endireitar a sombra de uma vara torta, para mais em benefício daqueles que vivem à custa da sua exploração. Da mesma forma que a acumulação de riqueza dentro do país leva ao aumento das desigualdades sociais e económicas, a riqueza flui sempre em sistema de vasos comunicantes, os ricos ficam mais ricos e os pobres mais pobres, na UE o processo é semelhante entre os diferentes países. Os estados mais ricos ficarão mais ricos e os pobres mais pobres e não é por acaso que os tais países” frugais”, Áustria, Dinamarca, Holanda, Suécia, juntando-se mais tarde a Finlândia, com a Alemanha à cabeça, deve-se dizê-lo, são os países que mais têm lucrado com a UE e os que têm menos contribuído para a despesa. A estes somam-se outros países que também têm ganhos, embora em menor escala, a Bélgica, França, Luxemburgo, Irlanda, cujos PIB's per capita são superiores à média europeia (840 euros), enquanto Portugal resta no fim da escala, nuns míseros 497 euros. Este acordo que é um verdadeiro pacto para a pilhagem dos países mais pobres, ou pior ainda, para intensificação dessa pilhagem, e daqui a 6 anos, Portugal ainda estará mais pobre e mais dependente, numa situação de colónia e, reforçando o elo da dependência, de região do estado espanhol.

Os 45 mil e 85 milhões de euros, do fundo total de 750 mil milhões de euros para a recuperação económica capitalista, serão devolvidos e com pesados juros e por diversos meios já anunciados, seja através do corte nas verbas do Quadro Financeiro Plurianual 2021-2027, seja pelo aumento da contribuição nacional para o orçamento da UE, ou pelo aumento da componente de empréstimos, ou, o mais grave ainda, pela maior ingerência de Bruxelas em Portugal definindo a sua estrutura produtiva, estando o governo PS/Costa obrigado a entregar até Outubro o famigerado Plano de Recuperação Económica de Portugal para a próxima década. Será na aplicação deste plano que serão gastas as verbas prometidas, mas não garantidas, e cujo esboço preliminar foi entregue ao tecnocrata Costa e Silva, onde a perspectiva para o futuro do país, não exactamente do povo que trabalha, mas do país da burguesia e do capitalismo doméstico, é bastante confrangedor, Portugal será um mero fornecedor de matérias-primas, no caso será o lítio, e de mão-de-obra barata para as grandes empresas estrangeiras que estejam na disposição de vir explorar os nossos trabalhadores. Mas mesmo para a exploração e empobrecimento do país, haverá um controlo apertado por parte da Comissão Europeia, ficando a utilização das verbas sujeitas à avaliação do Ecofin, conselho que é constituído pelos ministros da Economia e das Finanças de todos os Estados-Membros; ou seja, serão os tais ditos países “frugais” a controlar o empobrecimento dos estados periféricos ao mesmo tempo que salvaguardam o seu enriquecimento.

No final, todos batem palmas. O presidente do Conselho Europeu, um dos lacaios da Merkel, considera que as negociações "foram sobre dinheiro, mas, mais do que isso, trata-se de trabalhadores e famílias, seus empregos, sua saúde e seu bem-estar”, numa desfaçatez e hipocrisia sem limites. O anúncio de mais uma enxurrada de dinheiro foi aplaudido pelo chefe da CIP e pelos lideres do PSD e CDS que alertaram para a rápida disponibilização e boa aplicação do dito, como se eles e os seus partidos nunca tivessem metido a mão no pote e não sejam igualmente responsáveis pelo desperdício e má aplicação dos imensos fundos que vieram da UE durante este tempo todo, desde a entrada de Portugal na então CEE até agora; uma corja de farsantes e de rapinantes! O PCP lamenta, enxugando a lágrima ao canto do olho de saber a pouco a eventual comissão, a falta de solidariedade por parte da União e da perda de soberania do país, como entre países capitalistas e no mundo dos negócios houvesse solidariedade e não interesses ou luta entre os lobos da matilha. O BE, fazendo-se de trouxa e a salivar para uma possível ida para a área da governação, fica-se pela lamechice “do dinheiro que não vem”. Os falidos principais órgãos de informação, opiparamente untados pelos 15 milhões de euros pelo governo PS/Costa, aplaudem o acordo e enaltecem o trabalho do governo, enquanto vão fazendo negócios de milhões e lançando os trabalhadores para o lay-off, ganhando nos dois carinhos, como aconteceu com o grupo Media Capital/TVI.

Enquanto isso, PS e PSD, na sua autêntica e indisfarçável versão Bloco Central, aprovam o fim dos debates quinzenais no Parlamento, aonde o primeiro-ministro ia todos os quinze dias dar conta da governação, a partir de Setembro irá somente de dois em dois meses, passando o resto do tempo a governar por decreto, fazendo da dita “Casa da Democracia” um verbo de encher, num claro processo de musculação do regime. Iremos assistir daqui para a frente ao aberto e acelerado apodrecimento da democracia parlamentar burguesa em Portugal. O passo seguinte, e com toda a lógica, será o encerramento da Casa, não será necessário mandar incendiá-la, como aconteceu há mais de oitenta anos numa Alemanha declaradamente ditatorial como agora; se se tem de pedir autorização a Bruxelas para a mínima reforma ou medida a tomar no país, não há razão para manter em funcionamento uma tão grande inutilidade, a não ser para justificar a propina mensal dos deputados. Acentuadamente, Berlim manda e os subservientes políticos dos estado-colónias cumprem. Esta Europa do capitalismo e do imperialismo não se reforma, destrói-se. E a classe operária de cada país deve assumir a linha da frente do combate. Ao contrário do que possa parecer, o internacionalismo e a revolução socialista encontram-se cada vez mais na ordem do dia.

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