Robert Doisneau (1912-1994)
Não será bem por uma questão de fonética, de soar bem ao ouvido, dizer que corrupção combina bem com repressão, mas pela razão mais que comprovada na prática de que um regime corrupto reprime sempre quem quer lutar contra a corrupção que ele próprio fomenta e personifica. Por mais democrático que seja o regime político que o capitalismo se possa revestir, haverá sempre corrupção, ou legalizada, através da lei que institucionaliza o compadrio, a cunha e o nepotismo, snobemente conhecidos por lobbying, o pagamento de comissões ou outras vantagens é o normal e o legal; ou de forma ilegal, na teoria, mas coisa corriqueira no dia a dia, como acontece em Portugal em que a cunha há muito que é instituição nacional e o saber desenrascar, enriquecer de forma fácil e rápida e à custa do que for é digna de apreço por muitos cidadãos alienados nesta sociedade de consumismo e sucesso fácil. A corrupção é o sangue que dá vida ao capitalismo, está-lhe no ADN.
Os casos de corrupção, que a imprensa vem disfarçando de forma capciosa, são já mais que frequentes e de elevada dimensão, razão pela qual se já coloca em cima da mesa a remodelação do governo do Costa/PS, por em estado avançado de descredibilização. O governo está a prazo, irá durar o tempo que o PS conseguir aguentar o controlo dos trabalhadores e do povo, que, e apesar da ajuda da pandemia (ou por causa dela, o efeito poderá perverso), não será por muito tempo. Quando os instrumentos de repressão, reforçados e afinados pelo PS, fazendo jus ao seu papel de bombeiro da luta de classes, e quando a direita formal e sem disfarces tiver resolvido os seus problemas internos ou já reestruturada, o governo e o seu chefete serão descartados, como aconteceu na Grécia, e a burguesia, sem intermediários, irromperá na ribalta do poder para obrigar os trabalhadores a uma situação de sobre-exploração que eles, por vontade própria, não resolveram tomar. A reinicilaização capitalista também se irá fazer em Portugal, mas com mais desemprego, fome e miséria do povo português e, o que não deixará de ser irónico, de maior subjugação e dependência do capitalismo nacional, com uma burguesia mais rentista e subsidiária do capital europeu e internacional. O Costa ficará na História não só como o coveiro da democracia saída do golpe militar do 25 de Abril, bem acompanhado pelo monárquico Marcelo, como igualmente o cangalheiro do partido que foi criado na Alemanha com os marcos da social-democracia europeia.
O governo PS é indubitavelmente o governo que contem o maior número de ministros inúteis por metro quadrado, como alguém já referiu. E os ministros que são apontados vão de uma ministra da Cultura, que deu prova de vida com a história da camisola poveira, a um ministro da Administração Interna, que só se mexeu no caso do assassínio do trabalhador emigrante ucraniano quando o facto era incontornável pela exposição mediática, e em vez de aplicar uma política de prevenção dos incêndios, que são intencionalmente sazonais, faz o contrário, promovendo-os como actividade económica que vai enriquecendo os chicos espertos que pululam pelo país; passando por um ministro da Educação que está farto de demonstrar que não é ele que manda e que percebe tanto do assunto como nós percebemos de lagares de azeite. Mas há mais: seria interessante fazer um inquérito na rua, perguntado ao cidadão comum se sabe o nome do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, por exemplo! Ninguém ou muitíssimo pouca gente saberá dizer o nome ou saiba até que existe um ministro para aquela área. Dentro do número de ministros considerados inúteis há um que será mais do que isso, ao cabo e ao resto tal como os anteriores citados e todos os outros ainda não mencionados e, diga-se de passagem, com o Costa à cabeça: o ministro do Ambiente e Ação Climática, precisamente do sector que irá ser mais mexido e que mais bulirá com a vida dos portugueses. É este que irá abençoar (para sermos simpáticos) as maiores operações de corrupção que estão em preparação ou já em curso em Portugal.
O ministro do Ambiente e Ação Climática (no governo anterior era Ambiente e “Transição Energética”, denominação demasiada óbvia e suspeita) já se celebrizou pela boçalidade e ignorância, desde sugerir a deslocalização das populações rebeirinhas do rio Mondego, aquando das últimas cheias que rebentaram com os diques, até ao aumento do preço da água para... “reflectir a sua escassez”. Pelo meio, já autorizara a alteração à Rede Ecológica Nacional e ao ordenamento da orla costeira a fim de permitir a construção de um campo de golfe, que implicou o abate de sobreiros em Vila Nova da Cacela, no Algarve; e agora faz vista grossa à construção de um outro campo de golfe, desta feita na base naval do Allfeite, alegando o Chefe de Estado-Maior da Armada que é uma forma de aproveitar um terreno que serviria para depósito de lixo (coisa que nunca terá também incomodado o nosso ministro) para responder a “necessidade de edificar uma capacidade de treino”.
Para aconchegar o ramalhete o Ministério (e o ministro) do Ambiente é acusado de, durante dois anos, ter andado a fazer de conta que nada se passava no considerado “reino” das culturas tropicais algarvias, quando agora uma cultura de peras abacates no Algarve teve um parecer desfavorável na avaliação ambiental, tendo o assunto sido levado para discussão na Assembleia da República. Claro que estes esquemas de empreendimentos, na maioria de empresas estrangeiras, não só no Algarve, como no Alentejo, que dentro de 20 anos não terá um naco de terra fértil, e um pouco por todo o país, têm contado com a complacência de todas as autoridades, desde governo a Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, estas presididas pelos boys partidários, e a Câmaras Municipais, pela razão de que muitos milhões vão fluindo por entre as pernas das secretárias.
Para completar o ramalhete das suspeitas de corrupção, o nosso monocórdico e bronco ministro quando confrontado com o negócio de 2,2 mil milhões de euros da venda das seis barragens no rio Douro da EDP aos franceses da Engie, atirou para canto em relação ao não pagamento do Imposto de Selo de mais de 100 milhões de euros na medida em que “cabe à Autoridade tributária decidir se deve ou não pagar Imposto de Selo”. Ao mesmo tempo que se levantou esta questão da fuga aos impostos por parte da EDP, já este ministro (parece que o gosto pelo mediatismo está na razão inversa da simetria da fronha) também está a ser apontado como ter entrado na mediação do negócio do hidrogénio verde, tendo presumivelmente facilitado a entrada do consórcio EDP/Galp/REN, o que ele considera uma denúncia “caluniosa e completamente infundada"; contudo, parece que o homem já está a ser investigado desde 2019. A verdade, no entanto, é que foi apanhado em amena conversa, denunciada por escutas telefónicas, com o primeiro-ministro Costa sobre as vantagens “para o país” dos negócios do lítio e do dito hidrogénio verde. Mas não será apenas este ministro a estar envolvido no escândalo, o ministro da Economia-advogado de negócios Pedro Siza Viera e o secretário de Estado Adjunto e da Energia João Galamba estão a ser investigados num processo que averigua "indícios de tráfico de influências e de corrupção, entre outros crimes económico-financeiros", já desde 2019, embora a história tenha sido conhecida em meados do ano passado. Tudo boa gente... ao serviço dos negócios dos capitalistas.
Os negócios do capital, ou seja, a concentração do grande capital para se poder efectuar tem que sujeitar os trabalhadores a uma cada vez maior exploração; e para quem recalcitre, o aparelho repressivo tem de estar pronto e operacional. E haverá mão firme e, a título de exemplo, deve começar pelos que ousarem desafiar as regras do sistema, seja qual for o pretexto: “O Conselho Superior da Magistratura (CSM) suspendeu preventivamente o juiz Rui Pedro Castro, do Tribunal de Odemira, que ficou conhecido por declarações negacionistas sobre o uso de máscaras e o confinamento no âmbito da pandemia de covid-19”. Esta atitude do CSM, a mando do governo PS/Costa, vale pelo significado e mostra que todas as armas de repressão serão usadas, mesmo contra aqueles que dentro do sistema, pelo mau exemplo que darão, coloquem em causa as medidas do governo, deixando completamente a nu a falácia da independência dos poderes, no caso, o poder judicial em relação ao poder executivo, e denunciando que o pretenso “estado democrático e de direito” só o é para a classe, a burguesia, que se encontra no poder. O estado, tal como a justiça, é um estado de classe, um instrumento de repressão da classe dominante contra as outras classes que deverão estar subjugadas. Não faltará muito que se replique em breve entre nós o que está a acontecer presentemente no Reino Unido, em cujo Parlamento se discute uma lei que irá dar poderes reforçados às polícias para controlar as manifestações de rua, aumentando ainda mais a repressão que já se faz sentir através do confinamento e do estado de emergência.
Por cá, enquanto se facilita o acesso aos dados do cidadão com o pretexto da vacinação vão funcionando o estado de emergência e os confinamentos, para cujos prolongamentos se procuram os mais diversos e disparatados pretextos, desde um pretenso índice de transmissibilidade (RT) aos testes rápidos, este mais um grande negócio, com o fim do controlo e do apaziguamento social. Mas, à semelhança das dietas e dos tratamentos médicos, quando se ultrapassa um determinado limiar, os efeitos serão sempre perversos, isto é, o pretenso tratamento irá apenas agravar a doença. A mentira terá sempre a perna curta, pode-se mentir muitas vezes mas nunca indefinidamente, e a repressão irá despoletar uma reacção em maior intensidade. A contra-revolução terá o condão de provocar uma revolução maior e mais violenta. A burguesia, com o seu sistema de exploração económica, e à medida que renova os estados de excepção (décimo quarto)e afia a repressão, está apenas a apressar o seu fim.
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