Abel Manta
Passados 48 anos após o derrube do regime fascista português, que alguns revisionistas da história defendem que não é fascismo por diferenças formais com a ditadura italiana, como as diferenças entre o actual regime português e o espanhol onde há uma monarquia, por exemplo, fossem de fundo e não o mesmo domínio e das mesmas elites capitalistas enfeudadas ao grande capital internacional (União Europeia), pouco haverá a comemorar relacionado com liberdades, direitos e garantias do cidadão.
Há dois anos, depois do governo Costa/PS versão
2.0 ter decretado o primeiro estado de emergência a pretexto do putativo combate
à pandemia covid-19, já tínhamos denunciado o fim, de facto, da democracia
parlamentar burguesa, embora esta se mantenha de jure; ou, em outra forma de
descrever, a musculação deste regime democrático parlamentar burguês, cujo
propósito é, como sempre foi historicamente, reprimir os trabalhadores e o povo
em caso de ousarem lutar contra as medidas económicas de cada vez maior
austeridade no sentido de fazer face à crise do sistema económico capitalista. Por
detrás de tudo está a economia, ou melhor dizendo, os lucros dos capitalistas.
Neste quadro de fascização, cada vez menos
disfarçado, agora com o governo PS/Costa versão 3.0, de maioria absoluta, coisa
que na prática jamais precisou para governar por decreto, nestes dois anos de dita
“pandemia”, como uma Assembleia da República inútil e ineficaz, dando esta sempre
o aval cego a tudo o que o governo decidiu apesar de este ainda não ter maioria
absoluta formal, veio agora cereja no topo do bolo. Já não será simplesmente um
órgão inútil, mas apologista do fascismo, por enquanto em soft mode, fazendo-nos
lembrar a antiga Assembleia Nacional de Salazar e de Caetano.
Na putativa “Casa da Democracia”, com um
presidente, e segunda figura do estado, reaccionário e trauliteiro que sempre
alinhou pelos interesses e ditames de Bruxelas e de Washington (lembremo-nos do
apoio que deu ao Guaidó, agente da CIA na Venezuela, quando era ministro dos
Negócios Estrangeiros!), com a presença de uma dúzia de arruaceiros da
extrema-direita, um deles ex-bombista do tempo do PREC, assistiu-se ao aplaudir
por parte de todos os elementos presentes, de pé e em pleno êxtase quase
orgástico, de um chefe neonazi estrangeiro que, em nome do Ocidente e do
Império, vai perseguindo os seus cidadãos que sejam do contra, ilegaliza
partidos de oposição de esquerda, incluindo o partido comunista local com a
prisão e o desaparecimento (assassinato) dos seus dirigentes, e, sem prurido e
remorso, lançou o seu país numa guerra, cujo resultado será inevitavelmente
catastrófico para todos os povos ucranianos. Um peão de brega do imperialismo e
do capitalismo ocidental foi elevado a herói.
Para além dos encómios que a figura sinistra e
tragicamente ridícula tem recebido de toda a imprensa mainstream nacional, bem
como o nazi “batalhão” Azov que, pela mesma imprensa, foi elevado ao maior
defensor das liberdades e democracia do mundo ocidental (de “todos nós”),
apesar da ideologia francamente nazi e de se escudar atrás de crianças e de
mulheres e assim evitar o seu rápido aniquilamento, mas que, pela mesmíssima e
abjecta manobra de manipulação da opinião pública, estará a defender os civis. Exactamente
o mesmo processo de inverter a realidade em relação a toda a guerra e à função
e natureza do actual regime de Kiev, apresentado como soberano e independente e
não como lacaio dos EUA e da UE. Os presentes apoiantes, na sessão referida da
Assembleia da República, parecem ser uma cópia, embora mais esbatida, da camarilha
actualmente reinante na Ucrânia, na justa medida em que defendem os interesses
imperiais e a guerra.
O PR monárquico Marcelo não se cansa de assegurar
ao neonazi trasvestido de democrata que Portugal apoiará a “luta do povo
ucraniano” e Costa ainda vai mais longe: “cada dia de guerra é mais um dia de
dor insuportável”. Imagine-se o homem a contorcer-se com dores pela infelicidade
do povo ucraniano e tanto um como o outro, na prática, a defenderem a guerra;
apesar de Marcelo ter fugido à tropa e nem ter ido sequer, como era sua
obrigação como filhos família do fascismo, para a dita “Guerra do Ultramar”. O
belicismo esteve bem evidente em todos os deputados e membros do governo
presentes na audição do agente da guerra e alguns deles, que se dizem democratas,
ainda foram mais longe que os jagunços do Chega.
A paz para esta gente é defender o alargamento
da União Europeia a regimes corruptos, dar armamento pesado e mais dinheiro para
continuar e intensificar a guerra, e no tempo em que o povo português está a
entrar numa espiral de inflação de miséria dificilmente de prever: dívida das
famílias, empresas e Estado subiu para os 777,4 mil milhões de euros em Fevereiro;
preço das casas subiu 14% até Dezembro; FMI prevê retoma mais fraca e défice
maior em Portugal; salários da função pública podem subir abaixo da inflação em
2023; Estado autorizado a endividar-se até 16,2 mil milhões de euros (OE2022). E
o mais que ainda está para vir.
O deputado do Livre, mais papista que o papa,
chega ao ponto de defender um "mecanismo de retenção dos pagamentos"
à Rússia pelos combustíveis fósseis. Todos defendem mais armas e mais dinheiro para
a guerra, o chefe do IL manifestou-se como o mais entusiasta na ideia, mas
tanto os dirigentes do PSD com do BE, do Chega ou do PAN não ficaram atrás; e
até o CDS quis dar prova de vida demonstrando o mesmo zelo belicista. Pode-se
constatar que estes democratas da treta são unânimes em aplaudir o nazismo,
agora disfarçado de defensor das liberdades, numa situação semelhante à de
Portugal antes do 25 de Abril, talvez uma espécie de “Primavera” marcelista.
O deputado do Livre, já referido, sintetizou o
sentimento de todos os presentes: “os valores que a Ucrânia defende na Europa
são os valores de Abril”. Seria também interessante saber quem é que soprou aos
ouvidos da sonsa deputada do PAN a ideia de convidar um retinto neonazi, promovido
a democrata, aliás, como foram todos os fascista e pides nacionais, e, com a
sua voz esganiçada e enganosa, não se cansa de defender o perdão da dívida do
estado ucraniano, não se percebendo, então, porque não defende o mesmo em
relação à dívida portuguesa. Seres mais lacaios do imperialismo e defensores da
guerra será difícil de encontrar. Em resumo, o discursante foi ouvido como muito
“prazer” e “honra” por todos os presentes. Foi um estranho “momento de se lutar
pela paz”!
A par dos elogios ao agente ianque, um Guaidó escandinavo
“democraticamente eleito”, todo o tempo foi para estigmatizar o PCP (partido pelo
qual não nutrimos particular simpatia por há muito ter abandonado a bandeira do
comunismo e da ditadura do proletariado, isto se alguma vez a empunhou), com a
imprensa a ajudar à festa, considerado um quase fóssil ou moribundo em fase
terminal, mas que, na questão em causa, ainda foi o que teve uma posição digna
por anti-imperialista, embora muitas das vezes pouco consequente, como se constata
pela posição em relação à União Europeia, a vassala por excelência dos EUA, e
ao euro. Estes ataques poderão preparar outros mais bem graves, que poderão passar
pela ideia que foi pensada no 25 de Novembro de 1975.
As posições de todos os partidos com assento no
Parlamento, uns mais abertamente e outros mais disfarçadamente, é de quererem
ilegalizar o PCP ou, no mínimo e para já, relegá-lo para uma posição de marginalidade
ou de semi-clandestinidade. A seguir irão todos os partidos que possuam a sigla
da aliança entre o proletariado e o campesinato ou que se oponham ao actual
regime pelo lado do povo, assim como todas as opiniões que perfilharem as
mesmas ideias da revolução proletária ou anti-imperialistas e
anti-capitalistas; em suma, quem seja contra as guerras impostas pelo Império
decadente. Estamos a assistir a um histerismo a favor da guerra que nos faz
lembrar o período que antecedeu a I Guerra Mundial. Parece que esta gente quer
a guerra, só que a guerra será agora nuclear.
Não o dizem abertamente, mas insinuam
insistentemente: o que era bom era o antes do 25 de Abril, sem comunistas nem
esquerdistas; à semelhança do que o corrupto (Pandora Papers) agente americano
fez na Ucrânia. Como a república de Weimar, na Alemanha, ou a I República, em
Portugal, nos ensinaram: a democracia parlamentar burguesa conduz sempre ao
fascismo. Bertolt Brecht lembra-nos que: “Não há nada mais parecido a um
fascista do que um burguês assustado”. E a nossa burguesia, em particular, está
mesmo assustada. No próximo dia 25, com mais tempo de democracia do que
fascismo (ao que dizem), não haverá nada a comemorar, a não ser o regresso subreptício
do fascismo.
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