segunda-feira, 11 de abril de 2022

O 25 de Abril de 2022 e a musculação do regime

 

Abel Manta

Discutiu-se (ou falou-se) na Assembleia da República o programa do governo PS, que venceu as legislativas com 42,50% e 2.302.601 votos, que mais não é do que a evolução na continuidade da política seguida pelo governo PS/Costa 2.0 sem os floreados que ainda existiam do acordo do governo da geringonça. Será a política que deverá enformar todo o Orçamento de Estado que, por ter sido chumbado, deu origem às eleições legislativas antecipadas. Não haverá problemas quanto à aprovação do dito Orçamento já atrasado uns meses mas que não deslustrará se tivesse aprovado no tempo devido. Governo de maioria absoluta continuará, como já acontecia, a secundarizar uma Assembleia que mais não será, por que já o era, um mero e inútil moinho de vento.

O convite feito pelas autoridades portuguesas ao chefe de estado da Ucrânia para discursar, tendo obtido o apoio da maioria dos partidos, na dita “Casa da Democracia”, e comunicado pela pessoa do PR, produto híbrido da antiga oligarquia fascista portuguesa, vem reforçar e esclarecer a natureza deste órgão de soberania nacional. Existe um velho ditado popular que diz: “diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és!”; ora, este adágio tanto se aplica ao ucraniano como ao português. Só faltará, como aconteceu no parlamento grego, que o dito “democrata”, peão de brega do imperialismo americano e europeu ocidental, se faça acompanhar por dois capangas neo-nazis. Não teremos dúvidas que serão fervorosamente aplaudidos quer pelos partidos seniores do regime quer pelos neófitos e onde se inclui o da extrema-direita oficial. Nada poderá espantar já que um dos novos deputados, que não foi eleito para a Presidência da Assembleia da República apenas por uma questão de decoro, é um ex-bombista do tempo do PREC. Não será por acaso que o convite ao neo-nazi ucraniano tenha sido feito pelo partido PAN, pelos vistos, partido muito amigo dos animais e não só.

Ficamos igualmente elucidados sobre a composição e o que faz mover uma Assembleia da República que possui um Presidente que, logo na primeira entrevista que deu aos media corporativos, não hesitou em afirmar que "a maior ameaça à democracia é a dos regimes autoritários", que é exactamente o caminho que desde há algum tempo, mais precisamente desde o primeiro estado de emergência, e pela mão do PS e de políticos deste jaez que o país está a ser lançado. Devemos relembrar que a figura, quando ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, foi correr à pressa, mais papista que o Papa, reconhecer o agente da CIA Guaidó como presidente legítimo da Venezuela, quando os EUA preparavam um golpe de estado para depor o presidente democrática e legalmente eleito. Parece que é este o papel político desempenhado pelos ex-trotsquistas, moldados pela tese teórica da hipotética “revolução permanente”. Alguma diferença entre a personagem e a de um Guaidó será mera coincidência.

É neste quadro de maioria e poder absoluto do partido que foi fundado na Alemanha, em 1973 e pela Fundação Friedrich Ebert do partido social-democrata alemão de Willy Brandt, informador comprovado e remunerado pela CIA, e agora de novo no poder, que o PR Marcelo anuncia que vai medalhar todos os envolvidos no golpe/revolução do 25 de Abril. Serão todos, desde o Spínola que conspirou contra o novo regime, tendo sido obrigado a fugir para junto dos amigos franquistas pelo fracasso da tentativa do golpe de estado, sendo um dos operacionais o candidato a vice-presidente da AR já referido, aos que integrando a dita Junta de Salvação Nacional não participaram na revolução abrilista, por exemplo, Jaime Silvério Marques, que chegou a ser detido no dia 25 de Abril por contra-revolucionário, ou Galvão de Melo, oficial com ligações notórias aos fascistas recém-derrubados do poder. Será a forma marcelista de comemorar os 50 Anos do 25 de Abril, cujo comissário político é um homem de mão socialista e, ao que parece, versátil para toda a obra.

Por detrás desta União Nacional de Todos os Portugueses Honrados, encontra-se uma economia em rápida deterioração, com a elite nacional e esgadanhar-se por mais apoios e subsídios e com o povo a ser atirado para uma situação de miséria jamais vista. Atrás da política encontra-se a economia, e quando os trabalhadores mostram que poderão não continuar a aceitar a política da cenoura, então, logo se prepara a política do cacete, daí a musculação do regime, com o esvaziamento dos poderes da Assembleia da República e a concentração dos mesmos no executivo de maioria absoluta. O PR será um ajudante e apoiante do governo, assim ordena Bruxelas, e as quezílias presidenciais, para enfraquecimento do governo e eventual substituição por um outro mais de agrado pessoal, serão mais difíceis de urdir e levar a bom porto. Afirmar que o governo está refém do presidente, ou o contrário, ou que está refém do povo, porque foi uma parte do eleitorado que o escolheu, não passam de sofismas e de ilusões porque a realidade é que ele esta refém de Bruxelas, quem lhe dita as ordens é a Alemanha.

A situação económica do país (dos capitalistas) é deveras preocupante para o governo e para a nossa burguesia: a dívida, pública e privada, não pára de crescer, como já aqui salientamos, e o défice da balança comercial também não tem maneira de parar ou decrescer: 2.154 milhões de euros em Fevereiro, um aumento de 1.412 milhões de euros face ao mesmo mês de 2021 e mais 569 milhões de euros em relação a Fevereiro de 2020. Se as exportações aumentaram 20,3% em Fevereiro, as importações cresceram 42,3%; ou seja, a dependência ao exterior aumentou. E as causas são fáceis de encontrar, os principais parceiros económicos são os países da União Europeia, com a vizinha Espanha à cabeça, cada vez mais somos um prolongamento do mercado espanhol, e estamos obrigados a usar uma moeda forte, o euro, que é o marco alemão com outro nome, o que nos obriga a vender caro e comprar barato; razão que, por sua vez, nos impede de substituir as importações, ou pelo menos grande parte delas, pela produção nacional.

O país está cada vez mais refém de Bruxelas e da Alemanha, reduzido a um simples protetorado, como aconteceu em todo o século XIX e parte do século XX em relação à Grã-Bretanha. Teremos apenas passado de dono. As nossas elites pouco se importam desde que as comissões não deixem de correr para os bolsos (delas), o seu patriotismo é a sua conta bancária e ainda há gente chegada ao regime a querer falar de patriotismo ao diabolizar a Rússia na invasão à Ucrânia. Esquecem-se da História quando o país foi invadido sucessivas vezes, em que as elites fugiram e ficou o povo a lutar praticamente sozinho contra o invasor: séculos XIV, invasões leonesa e castelhana; XVI, perda da independência; XIX, invasões francesas. Agora e de repente, temos uma burguesia belicista que deseja uma III Guerra Mundial ao enviar material de guerra e tropas mercenárias para a Ucrânia ou para lá perto com o argumento de que o país (governo PS) tem de cumprir com as suas obrigações internacionais (Nato), pensando talvez que a guerra é lá longe e não nos atingirá. Puro engano: primeiro, porque as sanções económicas (guerra económica que sempre antecede e acompanha o confronto militar) vão-nos atingir mais a nós do que à Rússia, não deixando de ser caricato a notícia da necessidade premente de investimento chinês em Portugal (basta olhar para a EDP!); e numa guerra mundial, que será forçosamente nuclear, rapidamente a destruição será generalizada sem necessidade de colocação de tropas no terreno por parte do outro lado. A burguesia e o seu sistema de exploração encontram-se em fase terminal de existência e, ao que parece, não querem perecer sozinhos.

Na Europa Ocidental, de raízes judaico-cristãs, ao que dizem, mas com uma prática diametralmente oposta, relembremo-nos das cruzadas na Idade Média ou dos genocídios em África, Américas, Ásia e Oceânia, nos últimos 500 anos que leva a globalização, sobre os povos indígenas, alguns desses massacres ainda bem recentes, que terão assassinado algumas dezenas de milhões de seres humanos, assiste-se a uma fascização dos regimes auto-denominados de “democráticos” e da própria sociedade. É a propaganda desencabrestada contra os cidadãos que desalinham do discurso único oficial, primeiro contra os ditos “negacionistas” da pandemia, agora contra os “putanistas” da guerra da Ucrânia. É o reforço do aparelho legislativo a fim de facilitar a imposição dos estados de emergência e da limitação dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. É o aumento do poder e da impunidades das polícias, com alguns dos seus agentes a serem medalhados como heróis apesar de terem tido a infelicidade de morrer em rixas de rua com grupos rivais da mesma natureza – é quase diário as notícias de teor: “Dois militares da GNR estão entre os cinco detidos no âmbito de um inquérito, que investiga crimes de corrupção...” É o maior investimento na putativa Defesa, com as Forças Armadas a serem dotadas com mais de mil milhões de euros para a compra de material obsoleto aos principais produtores da morte no Ocidente.

E será um dia destes – ninguém se admire! – a ilegalização dos partidos, independentemente do ideário político, desde que sejam do contra, que será decretada e em nome da “liberdade” e da “democracia”. Em programas televisivos político-recreativos, há já alguém (arauto da guerra) a reivindicar a ilegalização do PCP que, a acontecer, só pode queixar-se de si próprio porque há muito que renegou o comunismo para aderir às delícias da democracia parlamentar burguesia e do capitalismo-com-direitos. A seguir irão o PCTP/MRPP e o BE e tudo que cheire a comunismo mesmo que formal, será apenas uma questão de tempo; poderão nomeadamente incluir um Chega mais radical para disfarçar, na lenga-lenga velha e relha de que os “radicais” ou as “extremas” são todos iguais sejam eles de esquerda ou de direita. É a guerra ao comunista que, aliás, nunca esteve parada.

E há ainda gente “arrependida”, flores de lapela da burguesia, que vem para as primeiras páginas dos principais jornais mainstream falar de “jornalismo independente” ou de “estado democrático e de direito”, como a liberdade ou a democracia não fossem de classe numa sociedade dividida em classes social e politicamente antagónicas. A pequena-burguesia já pressente o fim do maravilhoso mundo capitalista. Os campos políticos demarcam-se à medida que a luta de classes se intensifica e a velha toupeira vai fazendo o seu trabalho silencioso de sapa.

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